A especialista em gestão de talentos Wilma Dal Col, diretora do ManpowerGroup, aponta como e o que esperar das futuras relações de trabalho entre empresas e profissionais com relação às habilidades que serão cobradas na era digital. Confira a entrevista:

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De acordo com pesquisas de mercado, o mundo vivencia uma revolução das competências e do entendimento de como as pessoas podem aproveitar as novas tecnologias na vida, nos negócios e na carreira. O que isso pode nos dizer?

Wilma – Na verdade, com todo esse avanço tecnológico, essa capacitação e tanto a inteligência artificial, digitalização e análise de dados vem trazendo, muitas tarefas que eram atribuídas tão somente aos profissionais, possivelmente serão realizadas por inteligência artificial, por robôs ou por computadores. Então, nós percebemos que de fato isso vai nos trazer uma característica de que mais do que nunca nós estamos vivendo a "era humana". Por quê? Por que tudo o que se refere a capacidade de relacionamento; capacidade de análise de entender cenários; de entender as necessidades das pessoas e do ambiente; todo esse aspecto que é ligado ao que a gente chama de ‘inteligência emocional’ e capacidade de se relacionar serão competências de destaque dentro dessa transição. Por isso enfrentamos hoje uma revolução das competências.

O que é mais tarefa e operacional, toda essa tecnologia vai trazer recursos tecnológicos muito importantes, mas que provavelmente vão carecer dessa questão mais relacional, humana e de olhar não para a solução do processo, mas para o indivíduo. Então por isso há atualmente uma demanda muito grande e uma escassez de talentos, entre aspas, porque talvez sejam talentos que vão estar sendo descobertos, mas que ainda falta. Não obstante o nosso mercado de trabalho recessivo, como por exemplo nas áreas de atendimento ao cliente e posições que você implica num relacionamento e numa troca com pessoas, você vê que existe uma dificuldade de conseguir profissionais com qualidades interpessoais. A gente acredita que a área de TI ela está trazendo uma contribuição do ponto de vista tecnológico muito importante, mas que exige desses novos profissionais que eles se preparem para essa revolução de competências que já está em curso.

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Como os profissionais que construíram carreira no modelo tradicional de trabalho podem trabalhar suas competências e adequá-las ao que o mercado contemporâneo busca?

Wilma – Não existe uma receita pronta, mas alguns indicadores poderiam ajudar esses profissionais, talvez um deles seria ele, sem abrir mão da especialização técnica que é importante, ele também buscar especialização e vivências por meio da participação em fóruns de discussão, inclusive de outras áreas e que ele possa estar sensível também para se especializar e desenvolver o aspecto mais relacional. Ele precisa estimular competências que estão mais ligadas a atitude e a todo o aspecto da capacidade de análise de cenário, tendo uma atuação não apenas técnica, mas também consultiva de acordo com o conhecimento que ele tem. Esse pode ser o caminho inicial para que ele desenvolva as competências necessárias.

Quais as expectativas e demandas que os profissionais de hoje e do futuro têm com relação ao que eles esperam encontrar em uma organização para formar carreira?

Wilma – Hoje os profissionais estão buscando empresas diferenciadas, principalmente as gerações mais novas, Milênio e Geração Z, que está chegando no mercado de trabalho. Uma das coisas que os mobilizam é uma identificação de propósito entre o que é propósito e interesse dele com o propósito e o interesse da própria organização; então esse casamento não só de uma carreira, de crescimento ou de um cargo na empresa, mas muito mais um consiliar e um desafio conjunto que possa trazer para ambos uma realização. Porque o profissional ele se sente muito mais responsável pela carreira, elas são autogerenciáveis e diferentes de um tempo atrás em que a empresa oferecia um plano de carreira. Hoje esses profissionais querem eles próprios traçarem as suas trilhas e as suas jornadas. E isso está atrelado ao propósito de vida e de realização que eles têm, então a empresa também precisa estar sensível de que ela precisa fazer esse espaço para discussão; precisa ter uma conversa de carreira e não de desempenho simplesmente com os profissionais; precisa chegar até os profissionais e ouvir as expectativas deles com relação ao propósito mais amplo e não simplesmente ao que se pretende como um crescimento ou mesmo dentro daquela função. É mais do que isso, é olhar a carreira e os desafios de forma mais abrangente.

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Novas competências estão sendo exigidas, mas quem está no mercado hoje já tem como saber quais são essas carreiras do futuro?

Wilma – Não, é muito difícil. O que nossas pesquisas mostram é que principalmente para a Geração Z, cerca de 65% das profissões que possivelmente terão a partir da próxima década, a partir de 2020, ainda não existem. São atribuições, desafios que hoje a gente ainda nem percebe. Provavelmente a revolução e a evolução tecnológica deve trazer muito do tom disso, mas isso é intangível. De qualquer forma o que a gente percebe é que sejam quais forem essas profissões ou essas oportunidades do futuro, novamente o elemento chave é o conciliar do conhecimento e da especialização técnica seja de que área for mas com toda uma capacidade, uma prontidão relacional, colaborativa, voltada para pessoas, à troca com outras áreas e com outros indivíduos. Acredito que essa questão de eles estarem também buscando uma flexibilidade no trabalho é importante e as empresas estão sensíveis a isso e fazendo algumas mudanças, mas efetivamente acho que isso vai trazer muito mais sucesso para que a empresa possa reter talentos, a ter conversas de carreira e ter esse olhar de propósito com os profissionais.

O que as empresas, em especial, de tecnologia estão fazendo hoje para conter essa escassez de talentos e o papel das universidades na formação desses profissionais?

Wilma – O que se percebe de uma maneira interessante é que as empresas, o que elas têm feito fortemente para suprir essa escassez de talentos é fornecer treinamento e desenvolvimento. Isso é algo muito forte, nossas pesquisas mostram que em torno de 64% das empresas dizem que estão atuando nesse sentido, principalmente no aspecto técnico que eles enfrentam mais dificuldades. A academia está se ajustando a este novo movimento e percebemos essa sensibilidade para uma mudança, mas talvez ainda tenha um “delay”.

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As mudanças que a tecnologia avançada vem provocando gera certa insegurança nos profissionais atuais para que se insiram nesses novos modelos de trabalho. Ao mesmo tempo empregadores estão otimistas e veem essa transformação como uma oportunidade para que novos talentos apareçam. Apesar das incertezas esse momento se mostra crucial para quem deseja despertar para novos negócios?

Wilma – Acredito que na verdade na questão do profissional sempre vai existir uma certa insegurança, o que não pode é deixar que essa insegurança se transforme num medo, porque quando você se vê diante de uma situação como essa você tem duas alternativas: você pode enxergar isso como um grande problema na sua vida ou como uma grande oportunidade de autossuperação. Acredito que os profissionais que adotarem essa segunda posição, de entenderem que isso é uma oportunidade ainda que, em alguns momentos, vá levá-lo a ter que fazer mudanças e a ter alguns temores, pode ser uma grande chance para inclusive trazer e revelar muito do seu talento diante desse desafio. Eu sei que parece uma visão bastante otimista, mas a experiência e o contato que nós temos com os profissionais mostra que, em geral, quem tem essa abordagem frente aos problemas tende a ter muito mais resposta de sucesso do que quem recua ou fica justificando numa crise ou numa mudança a não realização ou renovação da sua carreira.