Neste Brasil enfermiço se pretende salvar a indústria de automóveis – o que é economicamente palatável – em detrimento da mobilidade das cidades, o que é uma incoerência. A verdade estaria no meio. Capricha-se em devolver às 23 montadoras existentes no país um desempenho de tempos normais, quando se vive uma crise. Estamos contratando um labirinto urbano irreversível, posto que a administração pública, afogada numa burocracia paralisante, não acompanha o ritmo da multiplicação do universo sobre rodas.
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Fôssemos uma cidade com planejamento contínuo e uma pitada mínima de vontade política, já teríamos – nestes 15 anos do novo século – um rodoanel para contornar o coração da cidade, corredores urbanos para o BRT, o ônibus-metrô, e pelo menos mais uma ponte e uns três túneis. Um ligando o centro à Universidade, “tatuzando” o Morro do Antão. Outro furando o Morro do Padre Doutor, ligando o Itacorubi à Lagoa da Conceição. E um terceiro, submarino, ao lado das atuais pontes, à semelhança dos túneis que ligam Kowloon a Hong-Kong e Nova York a Nova Jersey.
Se ainda precisamos conviver com tantos automóveis no miolo da Ilha, é sinal claro da ineficiência do transporte público.
Os sucessivos planos diretores falharam em equilibrar a ocupação do solo com um adequado zoneamento. Ao contrário, o que aconteceu foi um grande desequilíbrio urbano, que estimulou os conflitos de uso e a desordem ampliando o atrito urbano e a deterioração do sistema viário. Não há exemplo maior do que a “bagunça” em vigor no aterro da Baía Sul.
Ao invés da regulação e aplicação de um Plano Diretor exequível, o que vemos nos últimos anos é uma “força-tarefa” agindo na Câmara Municipal para modificar zoneamentos e ampliar gabaritos de edifícios. Ou seja: um caos cuidadosamente cultivado e devidamente “contratado” para o futuro.
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Em duas gerações, de 1960 a 1990, a cidade cresceu num ritmo chinês. Em 1960 a Ilha-Capital contava com uma população de presépio, ainda na casa dos dois dígitos de milhar: 98.590 habitantes. Hoje, só na Ilha temos meio milhão. Se contarmos a “GranFloripa”, um milhão.
Era bom, mas passou. É preciso pensar grande. Nos anos 1960 todas as casas tinham quintais, mesmo no Centro. Todo mundo se conhecia, e o carteiro entregava a correspondência sem olhar o endereço, só pelo formato do envelope. As casas eram identificadas pelo seu jardim e pela fragrância das flores.
O que emana hoje é o cheiro do óleo e o ruído dos motores.