A Câmara dos Deputados votou nesta quarta-feira (12) a urgência do projeto de lei 1904, que altera o Código Penal e estabelece a aplicação de pena de homicídio simples para casos de aborto acima de 22 semanas de gestação. A proposta também vale para casos de estupro, em que a prática será criminalizada se for realizada após a 22ª semana. Atualmente, a lei brasileira não prevê um limite máximo para interromper a gravidez de forma legal. As informações são do g1.
Continua depois da publicidade
Entre na comunidade exclusiva de colunistas do NSC Total
Caso aprovado, o PL determina a pena nos seguintes casos:
- quando a gestante provoque o aborto em si mesma ou consinta que outra pessoa faça o aborto: a pena passa de prisão de 1 a 3 anos para 6 a 20 anos;
- quando o aborto for provocado por terceiro com ou sem o consentimento da gestante: pena para quem realizar o procedimento passa de 1 a 4 anos para 6 a 20 anos, enquanto hoje a penalidade fixada é de 3 a 10 anos.
Veja quem são os deputados que assinam projeto que equipara aborto a homicídio
Continua depois da publicidade
Debate sobre o aborto
Em abril, o Conselho Federal de Medicina (CFM) emitiu norma proibindo médicos de realizarem assistolia fetal (injeção de produtos que induz à parada do batimento do coração do feto antes de ser retirado do útero da mulher) em casos de aborto oriundos de estupro, após 22 semanas. O procedimento é recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para casos de aborto legal acima de 22 semanas.
Famosos se manifestam conta PL que equipara aborto a homicídio: “Cruel, bárbaro e inaceitável”
A resolução do CFM vai contra o que diz a lei brasileira, que não prevê um prazo máximo para interromper a gravidez de forma legal, e chegou a ser suspensa pela Justiça Federal em Porto Alegre. Mas, voltou a valer no final de abril, quando o Tribunal Regional Federal da 4ª Região derrubou a liminar anterior.
Em maio, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes suspendeu a resolução, por considerar que havia indícios de que a edição da resolução foi além dos limites da legislação.
Presidente do Senado comenta texto polêmico
Nesta quinta (13), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que o projeto de lei que equipara o aborto ao crime de homicídio, caso chegue ao Senado, será tratado sem pressa.
Continua depois da publicidade
Segundo Pacheco, o tema é complexo e sensível, e demanda uma análise cuidadosa e ampla discussão entre os senadores. Ele ressaltou a importância de considerar todas as implicações jurídicas, sociais e de saúde pública antes de qualquer deliberação.
“Evitarmos legislar sobre matéria penal pautada pela emoção. Vamos receber o projeto e teremos toda a cautela em relação a esse tema. Preciso ler o projeto. Uma matéria dessa natureza jamais iria direto ao plenário do Senado”, afirmou.
Quando o aborto é permitido no Brasil
O aborto é crime no Brasil, mas existem três situações em que ele é permitido:
- anencefalia fetal, ou seja, má formação do cérebro do feto;
- gravidez que coloca em risco a vida da gestante;
- gravidez que resulta de estupro.
Continua depois da publicidade
Para os casos de gravidez de risco e anencefalia, é necessário apresentar um laudo médico que comprove a situação. Além disso, um exame de ultrassonografia com diagnóstico da anencefalia também pode ser pedido.
Já para os casos de gravidez decorrente de violência sexual – e estupro engloba qualquer situação em que um ato sexual não foi consentido, mesmo que não ocorra agressão -, a mulher não precisa apresentar Boletim de Ocorrência ou algum exame que ateste o crime. Basta o relato da vítima à equipe médica.
Entretanto, mesmo que não seja necessário “comprovar” a violência sexual, muitas mulheres (e meninas) sofrem discriminação nos serviços de saúde na hora de buscar o aborto legal.
“Há muitos questionamentos quando a mulher relata que foi vítima de violência sexual. A legislação não exige que se faça o registro de ocorrência, só é preciso seguir um protocolo no serviço de saúde. Mas muitas mulheres sofrem discriminação por exercer esse direito, têm a palavra invalidada, tanto no serviço de saúde quanto em delegacias”, afirma a coordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, Flávia Nascimento.
Continua depois da publicidade
Quando decidem impor uma “data limite” para que as vítimas de violência sexual procurem o aborto previsto em lei, estão invalidando todas as questões que envolvem a tomada de decisão.
“Quem atende essas pessoas que procuram o aborto legal sabe que meninas e jovens adolescentes demoram mais para acessar o serviço. Muitas delas nem tiveram a primeira menstruação, não compreendem que sofreram uma violência, não tem acesso à informação. Além de passar pela violência, elas ainda correm risco de vida ao levar a gestação para frente”, diz Flávia Nascimento.
Quanto mais a gestação se desenvolve no corpo de uma menina, maior o risco dessa gestação à saúde da mãe (e aí já são duas situações previstas em lei: o estupro e o risco à vida da gestante).
O presidente da Comissão Especial de Bioética e Biodireito da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil), Henderson Fürst, lembra que as vítimas de estupro não esperam passar as 22 semanas de gestação por “capricho”. Existem diversos motivos que podem levar a essa procura tardia.
Continua depois da publicidade
“70% dos casos de estupro de meninas no Brasil acontecem dentro de casa, com pessoas conhecidas ou mesmo familiares sendo os agressores. A família demora para descobrir e quando descobre, fica no dilema de denunciar ou não. Aí o tempo passa, não existe um serviço próximo, é necessário viajar, mas não tem dinheiro para arcar. São incontáveis barreiras”, relata.
Descriminalização do aborto no Brasil
Em setembro de 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) começou a julgar a ação para descriminalizar o aborto feito por mulheres com até 12 semanas de gestação. A ministra Rosa Weber era relatora do processo e registrou seu voto a favor da descriminalização. Porém, o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, pediu destaque no julgamento e a votação foi suspensa.
Em fevereiro, Barroso disse em entrevista que o STF não julgará a ação neste momento. Para ele, não cabe neste momento ao Supremo decidir sobre uma prática que a maioria da população é contra e o Congresso também expressa esse sentimento.
Leia também
Meninas violentadas são as primeiras vítimas do Congresso em ofensiva contra as mulheres
Câmara aprova projeto que torna ataque a escola crime hediondo
Projeto que equipara aborto a homicídio tem urgência aprovada na Câmara dos Deputados