Catarinenses vão pescar no Pantanal e sul-mato-grossenses vêm passar férias no litoral catarinense. A troca entre Santa Catarina e Mato Grosso do Sul vai além da atividade do turismo. Em 1990, quando a Polícia Militar Ambiental de Santa Catarina foi criada – comemorou 30 anos em 23 de julho – um grupo de policiais militares do Estado viajou até o Pantanal para conhecer como a Polícia Militar da região cuidava do meio ambiente.
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Os PMs barriga-verde foram acolhidos pelo coronel PM Ângelo Rabelo, atual diretor do Instituto Homem Pantaneiro (IHP), organização da sociedade civil sem fins lucrativos que atua na preservação do bioma e da cultura local. Com sede em Corumbá, o IHP experimenta o que o tenente-coronel da reserva Ângelo Rabelo chama de um momento triste da história do Pantanal e de Mato Grosso do Sul.
— Em mais de 30 anos de trabalho por aqui não vi nada parecido, em proporções e condições climáticas – conta o Rabelo
Incêndios no pantanal são comuns, especialmente entre os meses de julho e outubro. Mas não de uma forma tão intensa como agora, reconhece o também ativista. O governo federal proibiu as queimadas em meados de julho, mas a área é muito grande e dificulta a fiscalização. Em estado de emergência ambiental por 180 dias e localizado no Centro-Oeste, o estado do Mato Grosso do Sul também pode sofrer consequências do desmatamento na Floresta Amazônica.
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Ocorre que, conforme pesquisadores, vem do Norte a maior parte da umidade que alimenta o bioma. A floresta lança no ar a umidade que é levada pelas correntes de vento até esbarrar na Cordilheira dos Andes. Na volta, a chuva vai sendo distribuída pelas regiões. Mas como a mata vai desaparecendo na Amazônia, não tem tanta chuva e não há formação de nuvens no Centro-Oeste. Logo, os rios não enchem e o solo fica mais suscetível ao fogo.
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Animais fogem do fogo e da falta de alimentos
O pantanal é o menor entre os seis biomas do país. Mas com uma beleza e riqueza exuberantes. A área aproximada é 150.355 km², ocupa 1,76% do total do território brasileiro e sofre influência direta de três importantes biomas brasileiros: Amazônia, Cerrado e Mata Atlântica. Mas também do Chaco (nome dado ao pantanal localizado no norte do Paraguai e leste da Bolívia). Uma característica desse ecossistema é que muitas espécies ameaçadas em outras regiões do Brasil são encontradas em grande número ali, como é o caso do tuiuiú – ave símbolo do Pantanal, e araras. Mas pelo fogo e falta de alimentos, animais morrem ou fogem.
Estudos indicam que o bioma abriga inúmeras espécies, sendo já catalogadas: 263 de peixes, 41 de anfíbios, 113 de répteis, 463 de aves e 132 de mamíferos sendo 2 endêmicas. De acordo com a Embrapa Pantanal, quase duas mil espécies de plantas já foram identificadas e classificadas de acordo com seu potencial, inclusive, medicinal. Além de uma fauna e flora admiráveis, na região destaca-se a rica presença das comunidades tradicionais. São famílias indígenas, quilombolas, coletoras de iscas que influenciaram diretamente na formação cultural da população pantaneira.
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Entrevista com o tenente-coronel Ângelo Rabelo, presidente do Instituto Homem Pantaneiro
Dá para dizer que alguém tocou fogo no Pantanal?
As condições adversas, como falta de chuva e seca prolongada, incomparáveis a anos anteriores fazem com que qualquer fagulha se propague de forma incontrolável. Mas assumimos com segurança: este fogo não é combustão natural, e sim consequência da mão humana para fazer roças, tráfico ilegal de madeira e extração de mel.
Apesar dos esforços, inclusive ajuda de um helicóptero da Marinha, os focos se mostram difíceis de serem vencidos. Quanto de área já foi consumida pelo fogo?
Temos 400 mil hectares queimados. São áreas de pastagem, algumas com a árvore cambará. Em grande maioria são propriedades rurais inativas. Estas áreas estão no entorno do conjunto de reservas, como a Serra do Amolar e o Parque Nacional do Pantanal. Nosso esforço é para proteger as reservas que estão servindo de refúgio para os animais.
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O que o IHP considera como maiores prejuízos para a região?
Algumas espécies de animais, inclusive ainda não identificados, não conseguiram fugir. Estamos presenciando uma movimentação muita intensa da fauna em direção as reservas. Não apenas o fogo assusta os animais, mas também a falta de alimentos. Também a vegetação é destruída.
Acredito que a comunidade catarinense deva estar empenhada na proteção dos golfinhos, das baleias, da vegetação da Mata Atlântica. Sem essa afinidade, sem esse reconhecimento por parte da sociedade cada vez mais teremos dificuldades, como a que estamos enfrentando no nosso lindo Pantanal” Ângelo Rabelo, presidente do Instituto Homem Pantaneiro
Qual o impacto para a saúde das pessoas?
Estamos há um mês com fumaça e sem ar limpo. As pessoas estão com dificuldade para respirar. As escolas da região pantaneira estão desmobilizadas por causa da pandemia, mas muitos funcionários vivem lá. Durante a semana, muitos ficaram sem condições de dormir pela qualidade do ar.

Com funciona o Instituto Homem Pantaneiro?
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Trabalhamos com gestão de áreas protegidas, desenvolvimento de pesquisas e promoção de diálogo entre os atores com interesse na área. A sede do IHP fica na Casa Vasquez & Filhos, um casarão construído em 1800, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Temos parcerias importantes, como Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Marinha do Brasil, Policia Militar Ambiental do Mato Grosso do Sul.
O senhor conhece Santa Catarina e já visitou áreas protegidas. Gostaria de deixar algum recado para os catarinenses sobre a importância da preservação?
Eu tenho uma admiração muito grande pelo estado de Santa Catarina, em especial pela Polícia Militar Ambiental, a qual conheço desde o dia em que foi criada, 30 anos atrás. Também conheço o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro e a Ilha de Santa Catarina, onde já estive fazendo palestras. Muitos catarinenses veem ao Pantanal para desfrutar de um outro tipo ambiente, que não é o litorâneo, o qual estão acostumados.
Considero importante para todos nós o fato de estarmos num momento de repensar nossas relações e acredito que a comunidade catarinense deva estar empenhada na proteção dos golfinhos, das baleias, da vegetação da Mata Atlântica, que é remanescente. Sem essa afinidade, sem esse reconhecimento por parte da sociedade cada vez mais teremos dificuldades como a que estamos enfrentando no nosso lindo Pantanal.
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