Referência na área de infectologia em Joinville, o médico Luiz Henrique Melo assumiu o papel de coordenador do Centro de Triagem do Coronavírus montado na associação atlética da Tupy. Ele também integra o comitê de enfrentamento ao vírus Prefeitura de Joinville. Por isso, está acompanhando a evolução da doença na cidade desde que a pandemia chegou, no início de março.

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Em entrevista à Rádio Globo Joinville (95.3 FM) da manhã desta segunda-feira (11), um dia depois dos registros do Governo do Estado mostrarem que Joinville é a cidade com maior número de óbitos por coronavírus de Santa Catarina, Melo comentou a situação da cidade. Analisou como positiva a experiência até agora, com baixa mortalidade de pacientes na UTI em relação a outras cidades do Brasil e do mundo; e avisou: a intenção é que o "tão esperado" pico não aconteça, já que o ideal é que os casos ocorram ao poucos para não sobrecarregar o sistema de saúde.

Confira os principais momentos da entrevista:

Chegamos a 261 casos e sete mortes em Joinville. O senhor poderia fazer uma análise dos números atuais?

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Obviamente os números demonstram que estamos conseguindo ter um controle significativo dos casos comparando com outras cidades do Brasil e do mundo. Essa é a parte boa da história. A parte ruim é que muitas pessoas interpretam isso como exagero das ações tomadas, já que não temos tantos casos, e teoricamente poderíamos ser menos agressivos no controle — e uma outra noção é de que o pior já passou. Algo como "já que os casos não chegaram, as medidas estão adequadas".

Tecnicamente, podemos dizer que o pico é alcançado quando tivermos metade da população, pelo menos, contaminada com o vírus, já que não temos vacina e somos todos suscetíveis ao vírus. O número de casos vai cair naturalmente a partir do momento em que tivermos mais pessoas infectadas do que suscetíveis. O objetivo é não ter pico, mas casos que vão chegando e vamos tendo condições de tratá-los adequadamente, não tendo sufocamento do sistema de saúde.

A grande questão é: ninguém sabe como vamos atingir essa circunstância de forma estruturada. Inclusive, a Nova Zelândia agora foi o primeiro país sem nenhum novo caso. Mas isso não significa que o pior já passou. Como liberar do lockdown sem ter uma segunda, uma terceira ou quarta onda? Então, são muitos desafios. Estamos aprendendo a lidar com a doença, com uma nova situação epidemiológica. Isso faz com que a gente avance e retroceda de acordo com o resultado das ações que vão sendo tomadas.

Então não é possível dizer que, por exemplo, metade da população já foi contaminada?

Este número só vamos saber a partir do momento em que tivermos testes. Ninguém tem essa informação porque, devido à dificuldade de realização de testes, cada local, cada país, tem uma estratégia diferente. O resultados melhores são os resultados de "teste – rastreie – isole". É o que ocorre na Coréia. Eles fizeram um isolamento mais seletivo e agora já estão vendo o aumento do número de casos.

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Este não é um erro, mas uma tentativa de fazer as pessoas voltando à sua normalidade com segurança. Não se tem certeza de quantas pessoas estão contaminadas porque grande parte é assintomática. Esta estratégia dos testes está sendo pensada em Joinville, os testes serão feitos em maior número a partir do dia 20 como estratégia elaborada para termos uma ideia da proporção da população contaminada e, a partir daí, pode ter um pouco mais de segurança em relação ao momento epidemiológico no qual nos encontramos.

Em Joinville, temos 100 casos de pacientes recuperados. É um bom número, ou poderia ser melhor?

Gosto de pegar as manchetes e olhar de um jeito técnico. Quando você diz que tem um alto número de recuperados, isso não é surpresa porque a gente sabe que 2,5% da população hoje vai a óbito. O número adequado é: quantos recuperados da UTI temos? Isso mostraria a capacidade local de absorver os doentes graves e a capacidade técnica das UTIs em recuperar estes indivíduos. Quando a gente olha os números por este prisma vemos que a nossa mortalidade é muito baixa.

A média de mortalidade dos pacientes que vão para a UTI é de 50% e estamos longe disso. Isso mostra que nossa capacidade de absorver os doentes está muito boa; temos 160 leitos que podem ser usados em Joinville para estes pacientes. Eu olharia não aqueles que eu já esperava que fossem recuperados. É natural a pessoa recuperar-se da UTI, mas não morrer fora da UTI.

Isso leva a concluir que a qualidade do que estamos oferecendo é boa. Porém, isso não deve nos fazer sentar em berço esplêndido porque as coisas podem mudar rapidamente dependendo de como a população encara este desafio de equilibrar o "ficar em casa" com a pressão econômica que obviamente isso vem trazendo.

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