O ataque dos Estados Unidos que resultou na morte do general iraniano Qasem Soleimani e do líder paramilitar iraquiano Abu Mehdi al-Muhandis tem um forte impacto na política internacional e já causou respostas duras e ameaçadoras entre os países. Enquanto a embaixada americana em Bagdá pediu que os norte-americanos que moram no Iraque deixem o país imediatamente, o primeiro ministro iraquiano Adel Abdel Mahdi afirmou que o ataque vai “desencadear uma guerra devastadora no Iraque”. Guia supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei falou em “vingança implacável”.
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O tom das respostas e a relevância do ataque dos EUA, que fizeram um bombardeio usando drones, causam apreensão e medo de uma nova guerra no Oriente Médio. Os impactos são políticos nas relações internacionais e também econômicos no mundo inteiro, visto que conflitos na região refletem diretamente no mercado de petróleo. Para a professora de política internacional da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Danielle Ayres, o governo norte-americano “cruzou uma linha muito perigosa” com o ataque desta quinta-feira (2).
— Esse conflito não é uma coisa nova, mas se acirra com o Trump e sua maneira de fazer política internacional. O que me parece nessa escalada que está tendo é que hoje ele cruzou uma linha muito perigosa, dentro de uma série de regramentos do que é uma guerra. Ele comete um ato de guerra. Ele mata um membro do governo que estava em missão oficial pelo governo do Irã, sem efetivamente ter algum conflito em vias de acontecer. Isso seria um motivo efetivo para você declarar uma guerra — explica a doutora em política internacional.
Para Danielle, no entanto, a guerra que está no imaginário das pessoas — com combates armados no campo de batalha, com militares — não deve acontecer. Ela aponta que uma guerra possível na região envolve ataques terroristas, fortalecimento de grupos como o Hezbollah (que atua no Líbano) e a convulsão de conflitos em países vizinhos que já estão em situação delicada como o Iêmen e a Síria.
— Nós sabemos que os EUA são a maior potência militar mundial. Não é fácil declarar uma guerra contra eles, especialmente sendo o Irã. Todavia a guerra atual não é mais a do passado. O mundo ocidental tem medo, mas a guerra talvez não seja a que a gente está imaginando na nossa consciência. Se realmente chegar ao ponto de uma guerra, será de atentados terroristas, embaixadas como alvos e ataques cibernéticos, que são baratos e podem causar um problema na vida cotidiana das pessoas. O Irã já passou por isso quando foi atacado por um vírus de computador nas suas usinas nucleares.
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Em relação ao presidente Donald Trump, Danielle aponta que a decisão de atacar o Irã vem em um momento para formar uma "cortina de fumaça" sobre a situação política dos Estados Unidos:
— O Trump vive uma situação política instável, de risco de impeachment, e de uma necessidade de criar empatia com o povo americano em busca de uma reeleição. Matar o líder militar do Irã pode ser algo que todo presidente dos EUA já teve em mente, mas não era algo que efetivamente se colocava em questão.
Brasil pode ter reação diferente da tradicional
A professora Danielle Ayres aponta que o posicionamento do Brasil no conflito pode ser um pouco diferente que o usual para o país — que tem histórico de pacifista. No entanto, ela acredita que no ponto de vista das relações internacionais o impacto seja pequeno para o país, visto que as relações do Brasil no Oriente Médio atualmente são mais ligadas aos países próximos dos Estados Unidos.
— O Brasil tradicionalmente é pacifista, sempre contra declarações de atos de guerra. Todavia desde a eleição do presidente Jair Bolsonaro nós vemos uma modificação. Não da forma como a gente como país entende a paz, mas da nossa maneira de interagir com os EUA. E essa maneira pode fazer com que a gente não apoie efetivamente o ataque, mas busque produzir apoio aos EUA e a sua ideia, de que foi um ato de defesa.
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Em entrevista na frente do Palácio da Alvorada nesta sexta-feira (3) de manhã, o presidente Jair Bolsonaro disse que havia recebido algumas informações sobre o ataque, mas que iria se encontrar com o general Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional, e se "inteirar sobre o que aconteceu para, depois, emitir juízo de valor".
Na mesma entrevista, no entanto, Bolsonaro adiantou que o ataque deve ter impacto econômico no preço dos combustíveis, mas descartou a possibilidade de o governo tabelar os valores no Brasil para controlar as variações.