É com delicadeza que Léia Farias abre a maleta de mão de onde retira dois objetos que tinham um valor inestimável para o marido, Armando Farias, falecido na madrugada de 2 de setembro: o quepe da Polícia Militar de Santa Catarina e a medalha cunhada com o nome da escola Os Protegidos da Princesa.
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– É sempre uma honra falar do Armando, seja entre amigos, seja para a comunidade do samba. Eu espero não decepcionar – conta ela, sob o olhar atento da filha do casal, a fisioterapeuta Amanda, 24 anos, que acompanha a entrevista sentada numa das poltronas do teatro.
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A vida de Armando, subtenente da PM, tinha a família, os amigos e o samba como prioridades. A relação com a música existia de longe, pois Léia é cantora desde os tempos de namoro. Mas foi depois de assistir a um desfile na passarela que a leveza do samba conquistou o coração do militar.
Armando ficou maravilhado com a grandeza da apresentação, com o capricho dos carros alegóricos, com o canto e a dança dos componentes. Tempos depois, acompanhando a um ensaio pensou: “Se assim já é bom, imagino o quanto poderia melhorar com certa organização?”.
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– Armando se colocou à disposição para ajudar. Fazia de tudo: abastecia o barracão, carregava coisas no carro, levava na costureira. Sem nunca imaginar que um dia seria diretor de Harmonia (quesito responsável pelo canto e dança), e que em 2018, por ocasião dos 70 anos da escola Os Protegidos da Princesa, receberia uma medalha da Harmonia – conta a viúva.
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Houve uma época que cada um cuidava do seu quadrado: Léia como diretora de eventos, Amanda era princesa e Armando na Harmonia. Para Léia, a relação de Armando com a escola foi muito feliz. O que a princípio parecia não combinar deu certo, agregando o aprendizado da vida militar ao desenvolvimento de uma escola de samba.
– Todo mundo sabia que Armando era militar. Para não perder o ensaio, ele chegava fardado. Isso ajudou a fazer com que a comunidade do samba fosse vista de outra forma. Em família, Armando acordava cedo, era barulhento, abria as cortinas da casa, gostava de movimentar-se. Envolvia-se também com os cuidados com a mãe, que tem Alzheimer, e para quem antes de ser intubado deixou um recado: “Diz a ela que a amo muito, e que estou viajando. Não quero que sofra com minha ausência”.
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Assim está sendo com dona Lourdes. Como também está sendo o silêncio em casa. Armando morreu no dia do aniversário, data em que completava 58 anos.
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– Isso é coisa para os grandes – diz Léia.
Peço à cantora, afinadíssima que é, que cante uma música que tenha marcado a vida dela e do marido:
– Pula esta parte.
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Dias depois, Léia enviou uma mensagem pelo celular.
– As Rosas Não Falam, de Cartola, esta seria a música que não consegui cantar no dia da reportagem. Desculpa, Ângela.
A resposta que encaminhei para ela foi um meio verso de Cartola:
– “Mas que bobagem…”.
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