O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Henrique Nelson Calandra, esteve em Florianópolis para o 5º Encontro Nacional de Juízes Estaduais. Em entrevista ao DC, o desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo falou sobre as decisões recentes do Supremo Tribunal Federal sobre precatórios. Estado e municípios tinham 10 anos para pagarem o estoque de dívidas que vieram de derrotas na Justiça, os chamados precatórios. Mas o STF decidiu que o prazo era muito extenso, seria inconstitucional, e agora discute o tema. Pode encurtá-lo para até 2018.

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DC – A discussão para encurtar o prazo dos precatórios não pode inviabilizar as prefeituras, criando problemas para Estados e municípios endividados e com as contas comprometidas?

Henrique Nelson Calandra – A AMB é uma das autoras da Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) proposta contra essa PEC (proposta de emenda à Constituição) que nós chamámos da PEC do calote. Há coisas que o governo tem que fazer para dar uma solução para a sua dívida. Para que esses Estados sobrevivam e para que os municípios sobrevivam, é necessário que o Brasil mostre que o que é decidido por um juiz tem que ser cumprido.

DC- Mas não pode ser um choque muito grande?

Calandra – É para romper a barreira da crise de autoridade da coisa julgada. Tem coisa que eu decidi quando era juiz do primeiro grau, há quase 30 anos, que até hoje o governo brasileiro não cumpriu. Que sentimento tem a pessoa que envelhece sem ver a sua angústia resolvida mesmo depois de ser julgada.

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DC – A ideia é acabar mais rápido com a fila?

Calandra – Quem ganhava o direito de receber algo na Justiça entrava em uma fila de 10 anos. E, dados os anos, era prolongado por mais 10. Essa tem sido a realidade. Então trabalhos com a hipótese de que haja um efetivo investimento para o pagamento. A dívida que é de um, é de todos, o Brasil deve para alguns brasileiros. Independente de ser no maior ou no menor município do país.

DC – Mas aí não deve faltar dinheiro para fazer obras, investimentos …

Calandra – Se não vier verba federal, se não houver investimento do governo na credibilidade do Judiciário? Falar precatório é um nome que pouco brasileiro sabe o que é. Mas vamos falar em direito violado. Será que é lícito dizermos que o pagamento de uma indenização para uma pessoa vitimada pelo governo demorar 10 anos para ser liberado e não será imediato?

DC – Há algum lugar que não funciona assim?

Calandra – Eu me lembro que quando tive a visita do ministro Anthony Kennedy, da Suprema Corte Americana, falei de precatórios. Tentando explicar para ele isso. Ele me disse que isso nos Estados Unidos não existe. O juiz dá uma ordem e ela tem que ser cumprida imediatamente. Porque a ordem que o juiz dá é no fim de um processo que um direito foi violado e alguém tem que receber uma indenização.

DC – Quais outras mudanças seriam necessárias para dar efetividade à Justiça?

Calandra – Os tribunais hoje carecem de gestão, que implica em democratização da gestão. E ela só será possível quando todos os juízes puderem escolher seus presidentes no Tribunal. Hoje apenas 17% dos magistrados votam no processo de escolha. E isso faz com que alguns sejam “emcimesmados”, acharem que estão cobertos de razão. Isso não é bom para a democracia e menos ainda para o poder judiciário.

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