– Peço ao presidente (Barack) Obama que faça o certo, os Estados Unidos devem renunciar a sua caça às bruxas contra o WikiLeaks.
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Do balcão do primeiro andar da embaixada do Equador em Londres, quase ao alcance da mãos da polícia britânica, o herói/criminoso/ativista/depravado (as opiniões estão divididas) Julian Assange finalmente falou.Sua mensagem evidencia propósitos: levantar o moral de seus apoiadores em frente ao prédio onde está e embaralhar sua atuação como símbolo da liberdade de expressão com uma acusação de crime sexual.
O australiano de 41 anos é responsável por divulgar documentos secretos do governo americano, expondo diálogos do serviço diplomático do país. Ele buscou refúgio depois que sua equipe de advogados (muito bem remunerados, diga-se) perdeu em todas as instâncias na Justiça britânica em um caso de outra natureza: agressão sexual na Suécia – o que nega.
Assange mistura as duas situações. Diz ser perseguido pela maior potência global, afirmando que, se for para a Suécia, corre o risco de ser extraditado para os EUA, onde uma condenação por traição poderia lhe render pena de morte. Não há, até agora, evidência de que Washington planeje seguir o roteiro sustentado por Assange. E, mesmo que seguisse, enfrentaria tamanha resistência da opinião pública que resultaria em dano político muito maior do que o causado pelo ex-hacker.
A declaração do porta-voz do ministério das Relações Exteriores sueco tampouco alimenta a teoria da conspiração. O país não extradita quem corre o risco de condenção à morte.
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Há também um terceiro fator para os 10 minutos de discurso pronunciados no uma vez tranquilo bairro de Knightsbridge: pressionar o governo britânico. Embora o Equador já tenha garantido o asilo, a única maneira segura de deixar a embaixada sem ser preso é recebendo um salvo-conduto – documento negado pelos britânicos.
Declarações quebram regra
Tamanho o impasse diplomático, que Assange desrespeitou uma das regras básicas dos asilados previstas na Convenção de Viena de 1961: a de não dar declarações políticas.
– Quando o Brasil permitiu que Manuel Zelaya desse declarações políticas na embaixada em Honduras, houve uma demanda internacional contra o Brasil na Corte Internacional de Justiça, retirada posteriormente – analisa a professora de Direito Internacional da UFRGS Martha Lúcia Olivar Jimenez.
Além do elementos de drama e conspiração, existem as nuances de comédia nesta novela da diplomacia internacional. O defensor da transparência busca ajuda do presidente do Equador, Rafael Correa, que tem atuação mais próxima à de censurador do que à de libertador. Correa é acusado por ONGs de perseguir a imprensa – o caso mais célebre foi uma campanha pessoal contra os donos do jornal El Universo. Neste ano, seis estações de rádio e duas TVs foram fechadas no país, de acordo com a Repórteres Sem Fronteiras. O casamento, contudo, convém: Assange quer sair da Grã-Bretanha e se diz perseguido pelos EUA. O presidente de retórica anti-imperialista tenta ganhar pontos internacionalmente e garantir a reeleição.
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O impasse, portanto, deve permanecer. Assange costurou um labirinto para as forças diplomáticas de quatro países. Mas agora corre o risco de encontrar apenas o confinamento.
Sem saída para Assange
Opções para Assange são consideradas restritas.
IMUNIDADE DIPLOMÁTICA
– O fundador da WikiLeaks pode receber a cidadania equatoriana e passar a membro do pessoal da embaixada do Equador em Londres. Mas o estatuto diplomático tem de ser reconhecido pelo país – o que a Grã-Bretanha não deverá fazer.
– Pode ser nomeado representante do Equador nas Nações Unidas, estando imune para viajar para as reuniões da ONU em todo o mundo. A nomeação pode ser anulada pela Assembleia Geral da ONU.
ESCAPAR DA EMBAIXADA
– Assange tem estatuto de asilado pelo Equador. Mas a polícia pode detê-lo por violação da fiança se sair da embaixada.
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– Caso evitasse a detenção fora da embaixada, já que o local não possui garagem, poderia entrar num carro diplomático, que também é inviolável.
– Na hipótese mais absurda poderia ser enviado em uma mala, ainda que só documentos oficiais possam ser enviados.
– Assange pode ficar morando na embaixada. O cardeal Jozsef Mindszenty passou 15 anos na embaixada dos EUA em Budapeste, Hungria, após a invasão soviética em 1956.