Jornalista argentino e diretor da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Ricardo Trotti representa uma das importantes organizações que repudiaram nesta quinta-feira a decisão da Justiça equatoriana de manter a condenação dos diretores do jornal El Universo, processados por injúria pelo presidente Rafael Correa. Trotti considera que o Poder Judiciário no país não atua de maneira independente. Confira a entrevista concedida de Miami a Zero Hora por telefone:

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Zero Hora – Como a SIP interpreta essa condenação?

Ricardo Trotti – A SIP rechaça a ratificação da condenação. Considera um grave atentado à liberdade de imprensa. O que realmente se busca com essa decisão é criar represálias a quem opine de forma diferente da versão oficial para neutralizar a capacidade fiscalizadora dos meios de comunicação.

ZH – O senhor entende que o problema está no processo movido pelo presidente Rafael Correa ou pela decisão do Judiciário?

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Trotti – Há muitos anos, a SIP vem reclamando que o governo equatoriano tem buscado formas de manipular o Poder Judiciário. Neste processo (dos diretores do jornal El Universo), irregular e viciado, percebe-se uma manipulação da Justiça. A SIP reitera sua posição de que existe um aparato, uma estratégia oficial, do governo, tanto no Executivo quanto na esfera jurídica para terminar com a liberdade de imprensa.

ZH – De que outras formas se dá a perseguição aos jornalistas no Equador?

Trotti – Há um discurso político e de propaganda próprio do presidente do Equador que, de forma periódica, sistemática e contínua insulta jornalistas e meios de comunicação, inclusive por meio de emissoras nacionais. A SIP vem afirmando que o governo também se utiliza de uma quantidade de meios que expropriou e criou como meios de comunicação governamentais, não como meios públicos. Também denunciamos uma campanha de perseguição a muitos jornalistas, com ameaças e um discurso violento que muitos seguidores de Correa tratam de reproduzir. O presidente incentiva com seu discurso violento a violência contra jornalistas. E a SIP tem denunciado continuamente uma lei de comunicação que, se for aprovada, atentará violentamente contra a liberdade de imprensa.

ZH – Em outros países, como a Argentina, esta também é uma discussão polêmica. Qual é a particularidade da lei de meios de Equador?

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Trotti – Obriga os meios de comunicação a um código de ética e cria um conselho de comunicação que está integrado por uma maioria do Executivo para vigiar o conteúdo dos meios e poderá censurá-los de acordo com pautas governamentais.

ZH – Há uma tendência na América Latina de maior cerco à liberdade de imprensa?

Trotti – A SIP sempre se manifestou que não é pelo fato de que se restaurou a democracia que a liberdade de imprensa tenha sido restaurada. Cada país tem tendências diferentes. Há países em que os governos respeitam mais a liberdade de imprensa, mas há maior ineficácia para controlar, por exemplo, os ataques do crime organizado. O tema da corrupção no Brasil é um dos mais problemáticos para o jornalismo, e o fato de que em 2012 três jornalistas tenham sido assassinados no Brasil é muito preocupante. Cada país tem uma tendência diferente. Todas são preocupantes, mas o fato de que os próprios governos violem a própria Constituição sobre o direito de liberdade de expressão é gravemente preocupante, como no caso do Equador.

ZH – O que o senhor acredita que irá acontecer agora com os diretores do El Universal?

Trotti – Eles devem estar solicitando medidas de proteção à Corte Internacional de Direitos Humanos. As medidas da Corte são obrigatórias. Entretanto, durante esse processo, ficam suspensas ordens de captura ou de indenização. Hoje, o presidente Correa anunciou que cogita de perdoar a todos. Isso já era um pouco previsível porque o presidente vinha dizendo que o que queria mesmo era ter a razão da Justiça a seu lado e sentir-se o magnânimo.

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