Os olhos começam a arder por causa do gás lacrimogêneo. Bombas de efeito moral explodem a sua volta provocando zunido nos ouvidos e certa tontura. Pedras enormes cruzam aleatoriamente por todos os lados e balas de borracha atingem pessoas a poucos metros de distância. Barricadas com fogo bloqueiam caminhos e vândalos colocam fogo em prédios do comércio. O caos se instala.
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Esse foi o cenário do confronto no entorno do Mineirão, na última quarta-feira. Enquanto a Seleção vencia o Uruguai por 2 a 1 no perímetro Fifa – seguro e Europeu – perto dali o Brasil tinha outra cara: feia, dura, forjada na revolta popular, de um lado; e na ação oportunista de bandidos, de outro. Ali, para documentar os fatos, estavam eu e o fotógrafo Lauro Alves, já separados um do outro numa guerra que envolvia centenas de mascarados infiltrados em meio a 50 mil manifestantes e cerca de 6 mil policiais entre Polícia Militar, Força Nacional de Segurança e Exército.
A passeata corria pacífica por 10 quilômetros, percorridos pela reportagem junto com os manifestantes desde o Centro de Belo Horizonte até o Mineirão. A dois quilômetros do estádio, bloqueado pela Fifa, um imenso conflito emerge.
Cobertura de guerra
É aí que fica cristalino o fato de o exercício do jornalismo depender do DNA dos envolvidos. Assim como qualquer outra profissão, é preciso ter vocação. Então, e só depois, entra o preparo intelectual, técnico e a prática para lapidar o profissional.
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Por este motivo é que, em situações extremas, o êxito só vem com o uso na dose certa de ação inata, conhecimento adquirido e duas pitadas de coragem para não recuar e de medo comedido para não perder a cautela no fogo cruzado. Acontece que, na teoria, tudo se encaixa. O problema é você realmente estar preparado na prática. Porque seu objetivo não é ser mártir, mas contar uma história fidedigna para seu público.
Em ação com inovação
A equipe de Reportagem foi pronta para informar em quaisquer condições. E para fazer ao vivo, via internet, o que nenhum outro site fez. Uma câmera Go Pro adaptada à mochila do repórter fotográfico mostrou ao vivo os fatos no momento que ocorreram. Quando eclodiu a guerra, máscaras de gás de alta tecnologia foram colocadas. Técnicas de cobertura jornalística militar foram postas em ação. O posicionamento da equipe era sempre em ângulo de observação, nunca no epicentro do conflito.
Áreas de segurança, seja em meio aos manifestantes, seja em meio aos policiais, foram mapeadas no dia anterior e identificadas antecipadamente durante a marcha. Por este motivo, onde outros sentiam medo, caíam de viadutos (um jovem morreu assim), alguns guerreavam, outros tentavam restabelecer a ordem, nós mantínhamos a adrenalina controlada para observar e registrar.
Nessas condições, a chance de não ser ferido no conflito é imensamente maior. Claro que o risco há, mas a mente estava treinada para não pensar nos meus dois filhos, nem o Lauro pensar no dele. Naquela hora, só o profissionalismo cabe na cabeça. Missão cumprida, relato nos jornais, registros no site, imagens publicadas, fim do trabalho profissional, hora do cidadão voltar para casa e beijar com orgulho seus filhos.
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