A cozinha de André Vasconcelos é um livro de história aberto sobre um mapa mundi. Os ingredientes de cada criação se combinam em um caldo cultural engrossado por uma curiosidade incessante do profissional.
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Segundo convidado da Confraria Itapema, o cozinheiro estará no evento online do dia 15 de outubro, a partir das 20h, para bater um papo com quem recebeu em casa o box com sua receita exclusiva de Parpadelle ao molho de cogumelos paris com tuiles de parmesão e presunto cru.
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— Procurei preparar um prato simples, acessível, e que guarda em si a revelação de como é fácil transformar ovo e farinha em macarrão — comentou.
Conhecido pelas delícias oferecidas por mais de duas décadas no Bistro Muito Além do Jardim, André tem na simplicidade seu tempero ideal.
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Cozinhar como diversão
Na infância, a vontade repentina de comer gemada fez com que André batesse ovos de galinhas caipiras com açúcar. Uma diversão do menino paulistano que nunca mais abandonou esses primeiros passos. Formou-se em Matemática, mas nunca ficou muito longe do laboratório de delícias de sua família.
— Eu era muito guloso na infância, comia de tudo e adorava experimentar coisa nova. A ligação com a comida era tão forte que uma das poucas vezes que lembro de chorar foi quando um bolo virou no chão — conta.
A mudança para Florianópolis aconteceu no início dos anos 1990, quando Vasconcelos atuava como cenógrafo e foi trazido por empresas da região. Fixou residência em meio às dunas da Joaquina, onde recebia amigos para saborear momentos entorno da mesa, em diálogos que invariavelmente o empurrava para a busca de novos sabores. Envaidecia-se com as reações dos convidados, cada vez mais numerosos e frequentes, que logo transformaram em tradição o famoso nhoque da fortuna, feito religiosamente em todo 29 de julho.
— É uma data tatuada em minha alma gastronômica, tanto que até na véspera do meu casamento servi o prato aos padrinhos e parentes — relembra.
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O desafio de comandar uma cozinha
Foi num 29 de fevereiro de 1996, ano bissexto, a abertura do seu bistrô na garagem da casa de um amigo. Seus pratos já atraíam a atenção de amigos dos amigos. Porém, liderar uma cozinha foi uma de suas aventuras de maior risco. André sabia cozinhar, mas aprendeu o ofício por observar mestres e anônimos do fogão, além de muita leitura. Há em sua casa coleção de edições da Paladar, caderno de gastronomia do Estadão, misturada entre recortes das mais variadas publicações do ramo.
— Não frequentei escola de gastronomia e larguei tudo para começar. Era tudo muito na intuição, mas apoiado por muita pesquisa de materiais referendados por grandes nomes. Eu tinha lá uma certa cara de pau também. Não respeitava muito as hierarquias sociais. Tirava a dúvida mais idiota que parecesse com quem quer que fosse e conversava sem melindre com autoridades e membros de famílias com experiências no exterior, que vinham conhecer o tal bistrô da Joaquina — conta.
André fez do Bistrô o ganha pão e sua escola. Era comum algum cliente mais assíduo chamá-lo no canto para sugerir mudanças em algum preparo ou até convidá-lo para ensiná-lo a preparar alguma receita.
— Meu cardápio variava conforme a estação e por novas descobertas, mas aos poucos foram aparecendo falhas no meu repertório diante de uma clientela cada vez mais exigente. Por exemplo, eu não era muito fã de carne vermelha, então não tinha prática. Certo dia, um empresário me chamou pra que eu aparecesse em sua residência. "Para cozinhar o que, sr.?", quis saber. "Você precisa aprender a fazer filé. Vou te ensinar", respondeu o freguês.
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Reconhecimento
Dono de um dos primeiros bistrôs de Florianópolis, não demorou e André levou sua cozinha intuitiva para a excelência, com participação em programas de TV e respaldado por chefs Beto Barreiros, do Box 32, como Zeca D'Acampora e José Hugo Celidônio. Este último é considerado como um padrinho na culinária e responsável por estimular ainda mais a obsessão que Vasconcelos sempre teve em conhecer a origem dos ingredientes e preparos tradicionais.
— Lá nos meus primórdios, quando mostrei uma técnica que desenvolvi para reduzir o leite, ele só respondeu assim: isso é leite maltado, rapaz. Existe há séculos — contou o cozinheiro, entre risos.

O empirismo de suas experiências e a sede por conhecer a história e a geografia dos seus preparos colocou André Vasconcelos na prateleira dos melhores profissionais de gastronomia de Santa Catarina, com reconhecimento nacional.
Entretanto, o caipirismo de suas origens próximas aos fogões à lenha faz com que ele refute o título de "chef". André também recusa a adotar no seu dia-a-dia com as panelas o glossário rebuscado dos anais franceses, muito embora seja rotulado como um especialista na doutrina.
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— Como não conseguiam explicar muito bem o que eu fazia, classificaram assim. Claro que colecionei muitos ídolos franceses ao longo dos anos e isso influenciou meus preparos, mas não me vejo diante de uma brigada orquestrada, com chapéu enorme e pedindo cenouras a julienne para quem trabalha comigo — explica ele.
Cozinha raiz
A fuga dos rótulos acabou por posicionar o nome André Vasconcelos como especialista da cozinha raiz, com colunas na imprensa e assinatura em livros. Seus artigos buscam desconstruir o elitismo da gastronomia, que foi impulsionada por filmes, programas de TV e seriados do streamming ao longo dos anos. São textos que tiram o véu glamouroso da cozinha para mostrar que muito do que é chique hoje já existia há milênios, nas comunidades mais rudimentares que viveram na Terra.
Na visão do cozinheiro, a gastronomia deve percorrer a distância da cozinha e do prato na mesa da copa de casa e ir no máximo até a horta do produtor mais distante.
— Os restaurantes estão se tornando caros, onde a clientela tem por princípio usar o primeiro conhecimento que adquirem para desqualificar, ao invés de buscar uma aproximação. Isso tira um pouco do prazer que me fez entrar nesse negócio — confessa.
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Eis um dos motivos principais que resultou no fechamento do Bistrô Muito Além do Jardim, em 2018. Vasconcelos se manteve no ofício, entretanto, convidado para eventos aqui e ali. Não deixou de frequentar feiras e sacolões, de plantar do nativo ao exótico no seu quintal e de hospedar-se com a família em casas de família ou lugares pequenos nas viagens que fazia pelo mundo — até o início da pandemia.
Ao preservar sua essência, curioso por descobrir o mundo, o cozinheiro encontrou um caminho que agora começa a tomar forma sob o nome de Um Vilarejo. Também na Joaquina, o estabelecimento oferece cama, comida e muitas histórias de uma vida dedicada aos sabores, aromas e a cultura da mesa simples.
— Tenho o prazer em descobrir, acreditando na máxima de Jean Anthelme Brillat-Savarin (1755-1826), "a descoberta de um novo sabor é tão mais importante que uma nova estrela" — diz André, que segue com vontade de aprender, lendo e conversando com quem se ilumina com seus pratos.
André Vasconcelos na Confraria Itapema
Encerram no dia 8 de outubro as vendas dos ingressos para ter a oportunidade de conversar com André Vasconcelos na 2ª noite da Confraria Itapema 2020.
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Assim como no primeiro evento, que teve a participação especial do chef Jaime Barcelos, Pedro Leite irá mediar o bate-papo com o cozinheiro. A transmissão online, exclusiva para quem adquiriu no box com receita e ingredientes para a preparação do prato, vai contar ainda com a participação de Leo Coelho, colunista da NSC e referência no segmento social, e o som de Paulinho Moska.
O prato assinado por Vasconcelos irá harmonizar com um vinho pinot noir da vinícola Quinta da Neve (safra 2014), de São Joaquim, na Serra Catarinense, uma indicação da sommelier Regina Essenburg, da Enoteca Decanter.
— Sempre fui de empório e tenho grande admiração pelo trabalho desenvolvido pela Regina Essenburg, e acabei acompanhando as iniciativas que foram dando corpo dessa rota pujante das partes mais altas do Estado. Posso dizer que vi nascer essa vinícola, o que pra mim é uma honra poder dividir espaço na mesa do público nessa noite especial — disse Vasconcelos.
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Esse projeto é uma realização da Itapema e conta com o oferecimento dos parceiros Bellacatarina, Grupo Geração, Formacco Cezarium, Unicred, Decanter, Casas da Água e Midea.
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