Sentimentos potencializados pela Copa não podem chegar a ponto de hipnotizar os brasileiros e camuflar nossa realidade.

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No dia em que a Seleção Brasileira decide sua passagem às semifinais da Copa do Mundo, é importante que todos reflitam sobre a participação do país na competição e sobre a realidade a ser enfrentada após os jogos, independentemente do sucesso ou do fracasso no futebol. Esta é a nossa vigésima participação em mundiais: ganhamos cinco e tivemos boas colocações em outros, mas também já perdemos muitos, alguns com traumas duradouros.

Embora seja a segunda Copa em nosso território, não há motivo para desespero nem para euforia demasiada. Precisamos, isto sim, exercitar o equilíbrio entre a paixão futebolística e a compreensão da realidade, para que a conexão entre a Seleção e a identidade nacional não seja marcada por exageros.

A relação do Brasil com o futebol, e em especial com a Seleção, tem as particularidades da importância cultural do esporte, do fato de sermos o país com maior número de títulos e de exportarmos talentos para todo o mundo. Mas há muito a Copa deixou de ser um evento dos povos que construíram a história do futebol. Outras nações e regiões incorporam-se ao acontecimento, como é o caso dos Estados Unidos. Tanto que o presidente americano Barack Obama suspendeu a agenda por pelo menos duas horas, nesta semana, para uma cena há até bem pouco inimaginável: assistiu ao espetacular confronto do selecionado de seu país com a Bélgica.

Os números também comprovam que a Copa vem alcançando audiência recorde nas transmissões da TV, com a mobilização de torcidas em nações que podem ou não estar representadas na competição. Esse envolvimento comprova que nenhum outro esporte tem a capacidade do futebol de expressar sentimentos de nacionalidade, em quaisquer regiões. É um poder universal, que se manifesta mais intensamente a cada quatro anos, quando da Copa, também para aproximar diferentes, atenuar discordâncias e, como ficou provado mais uma vez no Brasil, promover a integração. Mas no dia seguinte à grande final de 13 de julho, o país terá de voltar a conviver com uma realidade que, mesmo sutilmente, terá sido alterada pela Copa, em decorrência principalmente das vitórias obtidas fora do campo. O Brasil fortaleceu sua autoestima, com o reconhecimento internacional das respostas oferecidas aos que duvidavam do sucesso da Copa, e poderá desfrutar de outras conquistas objetivas, representadas pelos chamados legados da Copa, como as obras de mobilidade urbana, e pelos impactos positivos do evento na economia.

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O país pode e deve usufruir da festa, mas sem que a euforia seja hipnotizante, no caso de mais uma conquista, e sem manifestações de depressão, se for derrotado. Temos desafios persistentes a transpor, expressos principalmente no baixo crescimento da economia e na inflação acima dos níveis considerados ideais. A Copa que amplifica nossas emoções e nossas virtudes não pode nos afastar deste Brasil real.