“No dia consagrado aos namorados, sairemos abraçados por aí a passear. Um dia, no futuro, então casados, mas eternos namorados, flores lindas eu ainda vou lhe dar”. A música do cantor da época da Jovem Guarda, Nilton César, “A Namorada que Sonhei”, dá o tom à vida do casal manezinho Maria da Glória Viana Soares, 66 anos — a famosa Glorinha — e Valdir Bernardino Soares, 68. Cantarolando juntos a melodia que embalou o amor que nasceu e que ainda vive no Sambaqui, o casal dá muita inveja aos novinhos: casados há 44 anos, eles mantêm um relacionamento pautado no respeito e confiança. Dica valiosa aos apaixonados que vão curtir esse 12 de junho.
Continua depois da publicidade
Se entreolhando e rindo com as lembranças do passado, Glorinha e Valdir podem se considerar o legítimo casal mané. Ele era pescador, ela rendeira até hoje — e faz o maior sucesso com seus produtos no Mercado Público de Floripa. Juntos também trabalharam na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) para manter a família que criaram: duas filhas e um filho. E pensar que tudo isso começou com uma ida à venda para comprar açúcar.
— Nós íamos na venda comprar as coisas para casa, para mãe. E foi num dia desses, voltando para casa, que a gente se encontrou na rua e começou a conversar — conta Glorinha.
Amor à primeira vista? Também não é assim. Glorinha e Valdir eram vizinhos no Sambaqui. Se conheciam desde criancinhas e frequentavam a casa um do outro. A mãe de Glorinha tinha muito medo de trovoadas. E quando o pai estava em alto mar pescando, a mãe de Valdir chamava a vizinha e suas crianças para ficar na casa dela até a chuva passar. Glorinha, ainda pequena, não fazia ideia que essa seria sua futura sogra.
Continua depois da publicidade
Leia mais notícias da Grande Florianópolis
Quando moços, mesmo morando a poucos metros, a vida os distanciou. Valdir saía quase todos os dias para o mar para trazer o sustento da família. Desde os 12 estava na luta. Mas foi num dia quando estava em terra firme que resolveu fazer o pedido à vizinha.
— Nós íamos a novenas e começamos a trocar uns olhares diferentes. Estávamos caminhando e aí resolvi pedir: O que você acha de ser minha namorada? E ela disse sim. É minha gata até hoje — fala um faceiro Valdir.
Os pais de Glorinha não permitiram o namoro no início. Até porque não dava para namorar tão cedo — e ela já tinha 20 anos. O casal do Sambaqui começou a se encontrar escondido. Conversa daqui, risadinha dali, até que o pai de Glória flagrou uma dessas conversinhas na rua. Aí não teve jeito. Ele aceitou o namoro de bom grado. Era uma família boa, explicou a rendeira. Na época, salienta ela, não se tinham roupas bonitas e nem coisas caras para se oferecer. As famílias e os namorados avaliavam o caráter da pessoa. Coisa que poderia ser mais enfatizada hoje em dia, não é?
Continua depois da publicidade
Um ano depois, o casamento
Antes do namoro, Glorinha até podia sair para a praia com as amigas, ir à alguma festinha. Mas depois de acertado o compromisso, nada de passeios. Mesmo num cenário maravilhoso como o do Sambaqui, namoro só dentro de casa, onde os pais podiam ficar de olho no casalzinho.
E como Valdir ainda era pescador, os encontros muitas vezes eram até difíceis. Mesmo no domingo, dependendo das condições, ele precisava ir para o mar.
— Aí eu explicava para ela: mesmo que seja domingo, eu preciso pescar. Hoje não vai ter beijinho — brinca o aposentado.
Continua depois da publicidade
Mas a distância não permitiu que aquela sensação boa de início de namoro se apagasse. Fã das músicas da Jovem Guarda, antes de subir no barco, Valdir deixava um recado aos locutores das rádios da região. Enquanto ele pescava e ela trabalhava com as rendas, uma música lembrava o amor.
— Eu tinha um radinho bem pequeno. E de repente, estava eu lá fazendo as rendas e escutava uma música que ele dedicava para mim. Nós gostávamos muito de Roberto Carlos, Erasmo, Wanderley Cardoso — fala Glorinha, emocionada.
Não demorou muito para uma aliança ser colocada no dedo dessa rendeira. Naquela época, o pedido não era feito à moça, e sim aos pais dela. Ainda bem que todos falaram sim. Valdir, inclusive, tem as datas na ponta da língua.
Continua depois da publicidade
— Em 8 de dezembro de 1970 (Dia de Nossa Senhora da Imaculada Conceição, como lembra Glorinha) nós começamos a namorar, em 24 de dezembro de 1971 nós noivamos e em 16 de setembro de 1972 nós casamos.
E você aí, reclamando de seu namorado que não lembra data nenhuma!
O casamento ocorreu na igreja Nossa Senhora das Necessidades, em Santo Antônio de Lisboa. Aliás, o casamento, as bodas de prata, o batizado dos filhos e o casamento das duas filhas do casal também aconteceram lá. A igreja está na memória da família.
O casal então construiu sua casinha, também no Sambaqui. Naquela época, para casar, o ideal era já ter um local para morar.
Continua depois da publicidade
— Tinha que ter casa, né? Se não, não tinha como namorar — complementa Valdir, esse brincalhão.
Dona Glorinha e Seu Valdir, o amor da rendeira e do pescador
Como Glorinha disse lá no início da reportagem, o segredo de tudo é o respeito e também a fidelidade. E claro, entender um ao outro e não deixar os serviços sobrecarregarem a um só. Valdir coloca a roupa para lavar enquanto ela cozinha, e assim eles vão se ajudando e mantendo o relacionamento feliz.
— Mas o segredo também é dar aquele tempinho. Quando briga, mesmo sabendo que o outro está errado, não falar nada e deixar para conversar melhor depois — indica a rendeira.
Apesar de os namoricos estarem cada vez mais diferentes hoje em dia, como os netos do casal que podem ficar até tarde na casa dos namorados, Glorinha e Valdir não veem problema com tanta modernidade. Beijos estão liberados. Mas o respeito, este não pode ser esquecido nunca.
Continua depois da publicidade
“Que seja assim por toda a vida, e a Deus mais nada pedirei. Querida, mil vezes querida, deusa na terra nascida, a namorada que sonhei”, dizia então o cantor Nilton José, com a canção que embalou esse amor mané e tão quiridu.