O mercado Pet em Santa Catarina registrou um crescimento de 120% no número de estabelecimentos como hospitais veterinários, clínicas (com ou sem cirurgia) e consultórios, saltando de 1.232 para 2.719 entre os anos de 2022 a 2024. Os dados são do Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado (CRMVsc). O segmento deve movimentar o equivalente a R$ 64,3 bilhões em 2024 no Brasil, com uma taxa anual de crescimento de 15%, segundo levantamento da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet).
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Nesse cenário, o Brasil ocupa o terceiro lugar no ranking de países com maior faturamento no setor dos animais de estimação, representando 4,95% do mercado global, atrás somente dos Estados Unidos (43,7%) e China (8,7%). Uma das possíveis causas para tal crescimento é o fato de muitos tutores atualmente considerarem seus bichos de estimação como parte da família, aumentando os gastos com cuidados e bem-estar dos animais.
Média de gastos dos tutores brasileiros
Uma pesquisa da Opinion Box de agosto 2023 mostrou quais são os maiores gastos que os tutores brasileiros tem com os seus PETs. A alimentação ficou em primeiro lugar no pódio, com 90% dos entrevistados, por estar entre os produtos mais comprados nos últimos 3 meses. Em segundo lugar, estão os produtos de higiene, que são adquiridos por 54% dos entrevistados. Os brinquedos somam 43%.
A média de gastos com a alimentação dos animais de 47% dessas pessoas é de até R$ 100. A quantidade de pessoas que gastam, em média, R$ 100 sobe para 57% quando o assunto é higiene e estética. A pesquisa entrevistou duas mil pessoas que têm bichos de estimação no país.
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Maria Clara Meireles, 23, estudante de jornalismo na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), conta que seu maior gasto é com a alimentação de sua cachorra, a Amy. Ela a adotou no ano passado, quando tinha três meses de idade. A alimentação de Amy é composta por ração e comida natural, que Maria Clara compra congelada de uma empresa. As “marmitas” duram 90 dias e podem ser esquentadas e servidas aos pets. A tutora faz a compra de 15 quilos de ração e sete quilos destas marmitas, de dois em dois meses. Ela estima que seu gasto com a alimentação da Amy seja de R$ 750.
Mas a alimentação não é um gasto fixo, segundo Maria Clara. O único gasto fixo seria a creche, que Amy frequenta uma vez por semana, geralmente nas quartas-feiras, há três meses.
A creche para cachorros tem várias dinâmicas e atividades em que os cães colocam em prática os seus instintos naturais: farejar, caçar, cavar e brincar.
— Hoje em dia, eu acho que a gente não tem mais aquela visão de que cachorro fica no quintal e não precisa de brinquedos. Eu acho que os cães precisam muito de desafios, eles precisam interagir com outros cachorros e precisam treinar faro, os instintos deles — diz Maria Clara.
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Maria Clara optou por colocar a Amy na creche principalmente porque a pet sofria com a chamada ansiedade por separação, que é o sentimento de sofrimento que alguns bichos de estimação experienciam quando os tutores estão fora de casa.
A tutora relata que, quando Amy fica sozinha por muito tempo, ela chora e uiva, o que já gerou alerta dos vizinhos de Maria Clara. É por isso que, principalmente nas quartas-feiras — quando Maria tem aula em período integral — Amy frequenta a creche.
Quadros de ansiedade como estes são muito comuns nos pets, segundo Ricardo Fontão de Pauli, médico veterinário comportamentalista em Florianópolis.
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— A ansiedade por separação é um problema muito comum nos casos de famílias que têm animal de estimação e saem para trabalhar, ficando longos períodos fora de casa. Os cachorros ficam sofrendo ansiosamente pelo retorno do tutor e latem, uivam e choramingam, e eventualmente até apresentam comportamentos destrutivos, como quadros de fobia — explica o médico veterinário.
Medicina veterinária comportamental em alta
A medicina veterinária comportamental é área da medicina veterinária que busca prevenir e tratar ou manejar problemas ou transtornos de comportamento de cães e gatos. O acompanhamento pode ser feito desde a infância do pet, trabalhando com a socialização, a educação sanitária e a adaptação a certos ambientes.
Nos cachorros idosos, — os chamados cães sênior — o acompanhamento é feito quando os animais desenvolvem distúrbios do neurodesenvolvimento, que seria o “alzheimer canino”, segundo Ricardo Fontão. A área também trata problemas de agressividade e ansiedade nos pets.
Essa área da medicina veterinária, no entanto, não é reconhecida pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV) do país. Segundo a presidente da Associação Brasileira de Medicina Veterinária Comportamental, Simone Moreira, a organização trabalha para que o reconhecimento seja obtido desde dezembro do ano passado, mas não há previsão de quando ele acontecerá no país. A associação completou cinco anos neste ano, que é um dos pré-requisitos para a emissão do título.
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— Com o reconhecimento da especialidade pelo CFMV, a Associação poderá certificar a excelência técnica dos profissionais que atuam no mercado. É um diferencial e uma referência fundamental para o público — destaca Simone.
Em nota, o CFMV explica que aguarda o requerimento da entidade para analisar o reconhecimento.
“O Conselho Federal de Medicina Veterinária esclarece que a atuação profissional em Medicina Veterinária Comportamental atualmente está inserida no contexto da clínica veterinária de pequenos ou grandes animais domésticos e de animais selvagens. O reconhecimento dos profissionais que atuam nesta área como especialistas deve seguir os critérios estabelecidos pela Resolução CFMV 1572/2023, que dispõe sobre a Habilitação de Entidades para Concessão de Títulos de Especialista em áreas da Medicina Veterinária e, dentre outros critérios, exige que a entidade esteja constituída há pelo menos cinco anos. Até o presente momento, nenhuma entidade apresentou o requerimento com as condições para emissão deste título. Por isso, o CFMV ainda não analisou o seu reconhecimento”, diz o comunicado.
Transtornos compulsivos podem ser tratados
Há diversos transtornos compulsivos em que os animais de estimação podem manifestar a ansiedade, sendo alguns a lambedura de patas, a automutilação ou comportamentos desadaptados, como cavar o chão, lamber a parede e lamber o tutor excessivamente, segundo o médico veterinário Ricardo Fontão.
É o que a Jaqueline de Val Pereira, 52, passou com o seu cão recentemente, o Roque. O animal tem 14 anos e, segundo a tutora, conforme ele foi ficando mais velho, passou a apresentar alguns sinais de ansiedade.
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— Quando ele ficava animado ao pedir comida, por exemplo, começava a apresentar tremedeiras e babar — relata a filha da tutora, Endy Christine de Val, de 22 anos.
Isso acontecia também durante as brincadeiras da família com o Roque. Elas resolveram levar ele ao veterinário quando estavam planejando uma viagem para São Paulo, já que é exigido que, para embarcar o cão no avião, ele esteja com a vacinação em dia e tenha um atestado de saúde emitido por um médico veterinário.
Na consulta, as duas relataram os comportamentos do Roque para a médica veterinária, que explicou que poderia ser ansiedade. Para uma viagem tranquila, ela receitou um remédio natural para estresse e ansiedade, que deve ser utilizado seis vezes ao longo do dia. Mãe e filha revelam que o cão teve uma melhora no comportamento.

Membros da família
Segundo a pesquisa da Opinion Box, realizada no final de 2023, 70% dos tutores brasileiros consideram seus pets membros da família. É aí que surgem os termos “mãe de pet” ou “pai de pet”, o que não é um problema, segundo o médico veterinário Ricardo Fontão.
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— Chamar seu animal de estimação de “filho” ou “filha” não tem problema nenhum, desde que a pessoa entenda que aquele animal é de fato um animal — afirma o profissional.
Ele cita os exemplos das pessoas que usam carrinhos de bebê para transportar os bichos, o que priva eles do exercício físico e do contato com a terra, o que é super importante para o animal. Os hábitos naturais dos cães de farejar ou de chegar próximo às fezes da espécie, por exemplo, são privados, e eles são uma forma de identificação social e territorial para os bichos, segundo Ricardo.
Os encontros de socialização de cachorros são importantes para reafirmar os hábitos naturais da espécie. Um exemplo é o “Gramadão da UFSC”, um grupo no WhatsApp que conta com 70 pessoas que se encontram todos os dias, presencialmente, a partir das 17h30 com seus pets na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Nos fins de semana, os encontros também ocorrem pela manhã.
Marthius Carneiro da Cunha, 60, é micro empresário e leva dois de seus seis cachorros para os encontros na UFSC, a Nina Simone e o Belchior. Os outros quatro, já idosos, não têm condição de ir.
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— Quando chega o horário das 18h, eles pedem [para ir] aos encontros. O Belchior já começa a latir e a Nina Simone começa a caminhar a minha volta, como quem diz: “E aí? vamos?”. Este relato é comum entre os tutores do grupo — conta Marthius.
Alguns encontros chegam a ter 25 cães, segundo ele. O grupo é uma comunidade que realiza piqueniques, aniversários e até amigo secreto entre os cães. No grupo do WhatsApp, eles determinam as divisões de tarefas, como quem deve comparecer e quem vai levar o quê. No início de dezembro do ano passado, eles realizaram um “aumigo secreto”. Participaram mais ou menos 40 cães, e os presentes foram petiscos caninos. Em junho, eles planejam fazer um “São Joau”, inspirado no Dia de São João.
Os encontros de socialização são responsáveis pela moda dos “espaços pet friendly“, na opinião de Marthius. Os locais pet friendly são parques, praças, cafeterias, restaurantes ou hotéis que são receptivos aos bichos de estimação. Um dado da pesquisa da Opinion Box de 2023 revelou que 46% das pessoas que têm pets já deixaram de frequentar algum lugar que não que não recebia seus animais.
A Maria Clara relata que, sempre que vai sair, confirma com os amigos e família se pode levar a Amy.
— Eu sempre mando mensagem para os estabelecimentos, sei de todos os lugares que pode levar cachorro em Florianópolis — brinca.
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Para o médico veterinário Ricardo Fontão, os espaços pet friendly são uma iniciativa interessante, já que os animais de estimação estão cada vez mais presentes nas casas brasileiras. Mas, segundo ele, os espaços têm que contar com a responsabilidade dos tutores, que devem levar animais socializados a estes locais, para que não hajam problemas de reatividade, como latidos ou confrontos entre os bichos.
*Sob supervisão de Andréa da Luz
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