Número de eleitores sobe e desce entre eleições em 20 cidades de SC

A comparação entre o número de eleitores e a quantidade de habitantes em todos os municípios catarinenses revela uma contradição. Um levantamento da RBS TV mostra que 20 das 29 cidades com mais gente votando do que morando tiveram um sobe e desce no número de votantes a cada dois anos: a quantidade de títulos registrados cresce nas eleições municipais e cai nas estaduais e federais.

Santa Catarina tem 29 municípios com mais eleitores do que moradores

Um dos casos ocorre em Brunópolis, no Oeste. Em 2010, a cidade tinha 2.850 habitantes e 2.435 eleitores e em 2012, o IBGE estimou queda de 2,5% na população, mas o número de eleitores subiu 16,3%. Em 2014, houve nova estimativa de queda populacional, de 3,1%, e o número de eleitores para as eleições gerais acompanhou (redução de 1,6%). A estimativa mais recente continua apontando queda na população (-1,8%), só que nas eleições municipais deste ano o número de eleitores cresceu mais uma vez (acréscimo de 9,3%). São 408 eleitores a mais do que moradores — é quase 20% mais gente votando do que morando no local. Vinte e um pedidos de transferências pata Brunópolis em 2016, barrados pela Justiça, serão investigados pela Polícia Federal de Lages.

— Essa sazonalidade, a “coincidência” da ampliação do eleitorado exatamente nas eleições municipais e a queda nas eleições gerais, isso é um elemento preocupante e traz suspeitas de que há graves irregularidades por trás dessa circunstância, com aliciamento eleitoral. É preciso irmos verificar causa, efeito e tomar providências para que isso não prossiga — diz o doutor em Direito pela USP e cientista político Cesar Pasold.

Pirâmide etária também contraria a lógica eleitoral

O desenho da pirâmide etária catarinense reforça os indícios de ilegalidades. Conforme projeção oficial do IBGE, neste ano 20,19% da população é formada por crianças e adolescentes de zero a 14 anos, sem idade para votar. Mesmo assim, o cruzamento feito pela RBS TV aponta que em mais da metade das cidades do Estado, o número de eleitores passa de 80% da população. Há também 26 municípios em que essa relação passa dos 100%.

A reportagem fez ainda novos flagrantes que endossam as suspeitas. Em uma das situações, três transferências em Ipira, no Oeste, foram feitas para o mesmo endereço, mas os proprietários da casa admitiram que assinaram a declaração de residência sem que as pessoas efetivamente morassem no local.

Margem para irregularidades

As regras para transferência eleitoral são definidas por portarias, publicadas pelo juiz eleitoral de cada município. Em muitas cidades, uma simples declaração assinada pelo titular do comprovante de residência é suficiente para validar o domicílio de um eleitor sem comprovação no próprio nome. Essas possibilidades abrangentes acabam abrindo margem para irregularidades.

— Nós tivemos um eleitor que nós começamos a fazer a entrevista para a transferência, perguntamos a quanto tempo ele morava aqui e em um determinado momento ele ficou tão nervoso, que pediu para ir ao banheiro e simplesmente não voltou. Outro disse que a testemunha que assinou a declaração conhecia ele. Liguei e pedi as características do eleitor, que era negro e tinha estatura baixa a média. A testemunha disse que era uma pessoa alta, loira e de olhos azuis — conta o chefe do cartório eleitoral de Sangão, Ricardo Leonetti.

Para o cientista político Cesar Pasold, é preciso que essas exigências para as transferências sejam revistas, para tornar o processo mais claro e rígido

— Essa prática de transferência irregular lesa a eleição, é um crime abominável. Devemos começar a pressionar nossos representantes no Poder Legislativo federal para uma reforma, e não precisamos esperar a grande reforma política. Isso é uma coisa menor que tem que ser feita imediatamente, para regularizar a situação, disciplinar melhor a comprovação básica para transferência. O levantamento mostra que as normas atuais são fracas, não são suficientes — argumenta.