Se a natureza castiga os nordestinos com a pior seca dos últimos 50 anos, a população tem bons motivos para comemorar quando o assunto é economia. A região vive o seu melhor momento, e as transformações que acontecem por lá já refletem na economia daqui.

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Várias empresas catarinenses realizam investimentos no Nordeste, algumas pela primeira vez, como a Krona Tubos e Conexões, de Joinville; Oxford Porcelanas, de São Bento do Sul; e Portobello, de Tijucas. A Tigre está lá há muito tempo, mas reforça a presença.

Não se trata de transferência de linhas produtivas. O Nordeste foi incluído no plano de expansão dos negócios.

As transformações começaram há cerca de uma década, explica o diretor de desenvolvimento sustentável do Banco do Nordeste, Stelio Gama, e têm como ponto de partida as políticas sociais do governo, como o reajuste do salário mínimo e o Bolsa-Família.

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Com maior poder aquisitivo, a população foi às compras e, segundo Gama, transformou um mercado potencial em um mercado real, desencadeando a necessidade de investimentos. Além de receber novas empresas, existem muitas obras ligadas à infraestrutura na região.

Os números mostram o resultado. Dados do Banco do Nordeste mostram que, em 2012, o conjunto de riquezas da região cresceu 1,4%, índice superior ao crescimento do PIB do Brasil, que foi de 0,9%. O PIB per capita do Nordeste também merece destaque. Ele correspondia a 44% do PIB brasileiro na virada do século e, em 2010, alcançou 48,4%.

Gama reconhece que os desafios ainda são enormes, mas não tem dúvidas de que o Nordeste não vai parar. Analistas indicam que o consumo no Brasil vai dobrar até 2020 e o Nordeste será a região de maior crescimento: sua participação no consumo brasileiro passará de 18%, em 2010, para 21% em 2020.

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O Nordeste poderia se tornar, no futuro, a base industrial de fornecimento para todo o Brasil? O professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Eaesp), Gustavo Andrey Fernandes, diz que não.

Segundo ele, quando o tipo de atividade exige mão de obra intensiva e de baixo custo, o Nordeste pode ser escolhido como base fabril. Já um fluxo expressivo de indústrias para região não ocorrerá, diz ele, pela ausência de mão de obra especializada e pela distância dos grandes centros do País, o que eleva os custos logísticos.

Sol mar e indústrias

Nos últimos anos, várias empresas catarinenses de diferentes setores da economia reforçaram a presença produtiva em Estados do Nordeste. Estas companhias querem garantir um lugar ao sol no boom de consumo e alcançar o mercado externo a partir da região. Entre as empresas, há indústrias de ponta da região Norte catarinense.

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Os nordestinos preparam-se para isto. Além da presença de quatro portos, os governos estão dispostos a atrair investimentos e existem muitas obras em andamento. As destinadas a receber a Copa do Mundo, por exemplo, vão trazer melhorias que permanecerão após o evento.

Ao comparar os atrativos do Nordeste com os de SC, o diretor do núcleo catarinense da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimentos do Mercado de Capitais (Apimec), Roulien Vieira, chama a atenção para o fato de que, no Nordeste, a infraestrutura está em desenvolvimento, o que gera uma perspectiva promissora para os empresários. No Sul, ela atinge a maturidade, e a eficiência não é mais a mesma. Por outro lado, o Sul destaca-se pela formação dos profissionais, segundo ele.

Cerâmicas de olho no gás do Nordeste

Especialmente para as indústrias cerâmicas, o Nordeste hoje é mais atrativo do que o Sul por causa do fornecimento de gás natural. Lá não há escassez, enquanto em Santa Catarina a SCGás contabiliza 60 indústrias na fila de espera para a ampliação do fornecimento.

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Os três Estados do Sul discutem medidas tanto de curto prazo quanto investimentos que vão garantir o abastecimento no longo prazo. Enquanto a solução não chega, a restrição do gás inibe a ampliação industrial nos setores mais dependentes.

– Para o nosso processo, o gás natural é imprescindível, por oferecer maior qualidade de queima nos fornos. A unidade que vamos construir no Nordeste deve consumir 23 mil metros cúbicos diários de gás. Seria difícil conseguirmos ampliar dessa forma o nosso consumo em Santa Catarina – explica o diretor-superintendente da Oxford Porcelanas, Irineu Weihermann.

O diretor industrial da Eliane Revestimentos Cerâmicos e presidente da Câmara de Energia da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc), Otmar Müller, diz que a unidade da Eliane em Camaçari (BA) representa um terço da capacidade produtiva da empresa. Os motivos para isso, segundo ele, são a oferta de gás e a proximidade com o mercado nordestino, que apresenta grande potencial de consumo.

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As lições de um “expatriado”

A experiência de Manoel Vicente Vieira na Krona Nordeste tem sido um grande aprendizado para ele. Quando a empresa instalou sua primeira fábrica fora de Joinville, em 2012, convidou Manoel, da expedição, e os demais coordenadores para se engajarem no novo desafio. Hoje, seis famílias do Sul trabalham na filial. A fábrica fica no polo multifabril industrial José Aprígio Vilela, em Marechal Deodoro, cidade com aproximadamente 46 mil habitantes na região metropolitana de Maceió (AL).

O Estado de Alagoas é um dos principais produtores de PVC da América Latina, matéria-prima utilizada pela indústria de transformação do plástico. Mas a mão de obra ainda não é qualificada nesse setor, diz Manoel, ao explicar a necessidade de levar profissionais da região Sul para posições-chave.

Ao assumir o cargo de coordenador de logística em Marechal Deodoro, Manoel tornou-se responsável por um grupo de 40 funcionários, muitos vivendo a experiência na indústria pela primeira vez e com vontade de continuar. A rotatividade é baixa.

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Na nova função, Manoel logo percebeu que entender a cultura e o ritmo de trabalho seria essencial para obter os melhores resultados.

– Eu me tornei mais paciente – diz ele.