A cidade nicaraguense de Masaya viveu pela segunda vez uma noite de terror protagonizada por grupos de choque e antidistúrbios, que atacaram manifestantes opositores até a madrugada desta segunda-feira (4), deixando cinco mortos, segundo organismos de direitos humanos e a Igreja católica.

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“O ataque foi generalizado, praticamente foi uma invasão da cidade com armamento pesado porque se ouvia rajadas… Não conheço coisas de guerra, mas em vários momentos disparavam seguidamente: tá,tá,tá, em rajada”, contou à AFP o sacerdote Augusto Gutiérrez, do bairro Monimbo.

“Preliminarmente, pegamos cinco cidadãos (de Masaya) mortos, ou seja, assassinados” entre a noite de domingo e a madrugada desta segunda-feira, disse o presidente da Associação Nicaraguense de Proteção a Direitos Humanos (ANPDH), Álvaro Leiva.

Os agressores “eram da antidistúrbios e de grupos civis que entraram em caminhonetes (na cidade)… com armas de fogo, fazendo os rapazes (que estavam nas barricadas) retrocederem e se defenderem com pedras, atiradeiras e morteiros”, contou o religioso.

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Em meio a disparos de morteiros e de tiros de fuzil, moradores de Masaya contaram nas redes sociais que drones e um pequeno avião sobrevoaram a cidade.

Leiva também demonstrou preocupação com as denúncias de “um objeto não identificado sobrevoando” a cidade, que poderia ser um drone ou um pequeno avião. Disse que “os cidadãos começaram a sentir um odor fétido, presumindo nesse momento que era produto dos gases lacrimogêneos”.

Paramédicos disseram que atenderam a pessoas “com vômito, ardência na pele e nos olhos e diarreia”, comentou Gutiérrez.

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O vice-chefe da polícia, Ramón Avellán, em declarações a veículos oficiais, declarou que “esses elementos (manifestantes) estão equipados com armas de fogo” e que a instituição “se viu obrigada” a sair de seus quartéis para restabelecer a ordem.

“Atacam a polícia e se dedicam por outro lado a roubar”, disse Avellán, que relatou a morte de um agente, embora inicialmente não se possa estabelecer se ele está entre os cinco mortos informados pela ANPDH.

Masaya, a 30 quilômetros de Manágua, com cerca de 100.000 habitantes, é uma cidade de artesãos e pequenos agricultores e tem sofrido com saques e com incêndios a estabelecimentos comerciais, o tem obrigado a população a bloquear suas entradas para evitar o deslocamento de forças antidistúrbios e grupos de choque simpáticos ao governo.

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“Parece uma cidade em guerra. Há uma dor muito grande contra o governo e a polícia por tudo o que estão fazendo contra nós”, apontou o sacerdote.

– A sangue frio –

Pelo menos dois dos mortos no sábado foram executados por agentes do Estado, segundo testemunhos que moradores deram ao padre Gutiérrez e ao ativista Leiva.

Um dos mortos identificado com o apelido de ‘El Mono’ teria sido morto “por uma mulher policial”, “em frente à igreja San Miguel. O rapaz estava sem armas, sem nada. Estava de joelhos e gritou (para a policial): se vai me matar, me mate”, e ela disparou, contou o sacerdote, baseado no relato de testemunhas da cena.

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O outro era era menor de idade, de 15 anos, “ele suplicou por sua vida, disse que não tinha nada (armas) e não respeitaram”, acrescentou o religioso.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), no relato de sua visita à Nicarágua entre 17 e 21 de maio, alertou para possíveis execuções extrajudiciais com franco-atiradores em algumas áreas do país.

A crise política da Nicarágua entrou na pauta da Assembleia Anual da OEA com um projeto de declaração de “apoio ao povo da Nicarágua”.

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No começo da semana de protestos, foram registrados 48 bloqueios de rodovias em todo o país, que o governo tentou retirar sem sucesso, porque de manhã removem os obstáculos e à tarde e à noite os manifestantes voltam a colocá-los.

Os opositores ao governo, mediante redes sociais, pedem à população que estoquem alimentos, água, produtos de primeiros socorros e adotem medidas de segurança nos seus bairros. Também incentivam o boicote ao pagamento de impostos e de serviços de água e energia.

Na capital, ao cair da noite, prevalece um virtual estado de sítio imposto por grupos de motorizados que percorrem as ruas e aterrorizam a população, denunciou o Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh).

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Os protestos antigovernamentais começaram em 18 de abril, liderados por estudantes contra uma fracassada reforma da previdência social, e se generalizaram a outros setores e ao país como reação às mortes de manifestantes.

* AFP