A segunda-feira de Carnaval é o prenúncio do fim da folia. Claro que os foliões ainda têm tempo, mas sabem que ele está perto de se esgotar. É nesse dia, muitas vezes de calmaria, que uma das festas mais tradicionais do carnaval catarinense toma o Centro e quase dobra a população de Navegantes. O Navegay, um dos principais blocos de sujos do Sul do país, chega à sua 40ª edição com uma expectativa ousada: arrastar 150 mil foliões pelas ruas na tarde de segunda-feira.

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Conduzir a multidão não é um problema para o bloco. Na última edição, 120 mil pessoas reservaram a segunda-feira de Carnaval para o Navegay. Como todo bom bloco de sujos, o ponto alto é a falta de regras para participar do desfile, segundo conta o secretário de Turismo de Navegantes, Sérgio “Schultz” de Souza:

– Foi isso que fez cair no gosto do povo. Não tem que cumprir um monte de exigências, é só chegar e brincar. Não é um lugar para competir, é uma festa muito alegre. Pode vir com a família, é tudo bem dividido: as alegrias, as responsabilidades e as irresponsabilidades também.

O sucesso do Navegay se dá justamente pela fórmula com que o Carnaval se desenrola no bloco. De acordo com o historiador e coordenador do curso de História da Univali, Francisco Alfredo Braun Neto, a base da festa funciona há séculos no quesito diversão:

– Ele (o Navegay) se adequa a um princípio que remete ao Carnaval medieval europeu: a inversão de papéis. Na época você não mudava de classe social. No “bloco de sujo”, o Carnaval era o momento de se fantasiar de nobre, ou outra classe. E o Navegay segue o mesmo esquema, transformando o carnaval de Navegantes em referência.

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O começo

Schultz explica que o Navegay nasceu como um bloco formado por familiares e parentes que queriam festejar a folia de Momo fazendo bagunça pela cidade. Em 1978 o “Banho da Doroteia” saiu às ruas pela primeira vez. O nome foi inspirado em um bloco chamado “Doroteia” que pulava o Carnaval nas ruas de Santos, no litoral paulista. Como a daqui saía do bairro São Domingos para tomar banho na Praia Central, o nome estava decidido.

– A ideia era a mesma de hoje: os homens se vestirem de mulher e as mulheres se vestirem de homem, mas tinha muito menos mulheres naquela época. De lá para cá o bloco só foi crescendo, as pessoas foram gostando e se transformou no que é hoje.

O “Banho da Doroteia”, ou apenas “Bloco da Doroteia” se transformou em “Naveguei” no começo dos anos 1990, pois os participantes usavam o ferryboat para navegar pelo rio Itajaí-Açu e festejar na cidade vizinha. O nome acabou mudando para a grafia atual na metade dos anos 1990, quando a mídia – de acordo com o secretário – passou a se referir ao bloco como Navegay por conta das fantasias de gênero oposto utilizadas por homens e mulheres. Ali, a festa já era frequentada por 20 mil pessoas.

Referência no Carnaval catarinense

Com o passar dos anos, o Navegay cresceu e se tornou uma das principais festas do Carnaval de rua de Santa Catarina. Em uma busca rápida pela internet é possível localizar grupos que organizam excursões rumo à festa ou que procuram hospedagem na região especificamente para participar do bloco. O secretário de Turismo afirma que o crescimento do bloco se deu na base da propaganda boca a boca, já que nunca foi feita uma campanha publicitária específica para impulsionar o evento.

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– Nós fizemos algumas pesquisas para verificar o alcance dessa propaganda que as pessoas fazem e encontramos mais de cem publicações em Roraima sobre o Navegay 2016. Só um site teve mais de 8 mil visualizações. E isso é o que as pessoas falam da festa.

Hoje é difícil pensar no Carnaval catarinense sem a festa de Navegantes. Além de impulsionar a folia, o bloco também ajuda a aquecer os negócios da cidade. Segundo Schultz, a ocupação dos hotéis da cidade chegou a 97% no Carnaval; 92% das casas de aluguel foram negociadas e o movimento nos supermercados cresceu 28%. Além de movimentar a economia da cidade, o Navegay se tornou referência turística para a região, afirma o historiador Francisco Alfredo Braun Neto:

– A festa nasceu de maneira espontânea, as pessoas começaram a ir para Navegantes e o Carnaval, também com escola de samba, começou a se destacar na década de 90 e transformou esse carnaval de rua. Na época a cidade parava. Hoje a movimentação é restrita ao dia da festa porque é algo bastante pontual, mas é uma referência que projeta a cidade na questão do turismo, algo que Navegantes tem aperfeiçoado nas últimas décadas, e acaba trazendo benefício para o ano inteiro.