Um mistério está por trás do naufrágio de um iate comprado há dois anos por R$ 3,2 milhões próximo à Ilha dos Moleques, na sexta-feira, dia 1º de novembro, com 14 pessoas a bordo – 13 passageiros e um tripulante.

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DOCUMENTOS: relatórios confirmam que a embarcação não era segura

Segundo laudo de empresa especializada contratada pelo dono do barco, o Gladiador 8 não tinha condições de navegar por problemas estruturais, havia alerta para naufrágio e estaria em meio a uma disputa judicial por reparos.

O barco saiu debaixo da ponte Hercílio Luz por volta das 16h e afundou no Sul de Florianópolis. Nenhum dos passageiros, que pagaram R$ 800 cada um para voltar da pescaria na noite do dia seguinte, ficou ferido. No momento do acidente um barco de pesca os resgatou.

O que ainda deve ser respondido com a investigação que começa hoje e tem 60 dias para ser concluída pela Marinha é como o barco com 23 metros de comprimento que estava atracado em um píer no Bairro Coqueiros, em Florianópolis saiu para o mar com todas as evidências de que poderia naufragar.

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O dono do Gladiador 8, Fernando Cruz, mora em São Paulo. Informou que comprou o barco há dois anos de uma empresa chamada Excel Náutica por R$ 3,2 milhões, e que gastou mais R$ 1 milhão para reformas que ele já sabia que teriam de ser feitas. Usou o barco durante um ano em viagens com a família, mas começou a perceber problemas. Foi Cruz quem contratou o laudo que identificou os problemas no iate.

– O laudo apontava problemas e eu entrei em contato com o fabricante que disse que não tinha condições financeiras para arrumar. Aí entrei na Justiça – diz o dono.

Em abril, Cruz navegou com o iate até Florianópolis. Atracou o barco no Iate Clube de Florianópolis porque, segundo ele, o barco não tinha mais condições de navegação. Cruz afirma que na época entrou em contato com a Marinha em Florianópolis para alertar sobre os perigos da embarcação e pediu o bloqueio do iate na Justiça. Há dois meses, o juiz Guilherme Silveira Teixeira, da 33ª Vara Cível do Foro Central da Capital de São Paulo, responsável pelo caso, determinou que o iate ficasse sob a responsabilidade do construtor, o engenheiro naval Ronald Miro Barton, dono da Excel Náutica.

O último laudo feito na embarcação foi no dia 24 de outubro. A empresa New Boat, também contratada por Cruz, afirma no documento que havia possibilidade de quebra dos motores e que a estrutura do casco estava comprometida. De acordo com os advogados de Cruz, eles entraram com duas liminares pedindo ordem judicial para que o barco não navegasse sob risco de naufrágio. O juiz Guilherme Silveira Teixeira, 33ª Vara Cível do Foro Central da Capital de São Paulo, não as acolheu.

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Marinha tem 60 dias para concluir inquérito

Responsável pela guarda do barco, Ronald Miro Barton confirmou ontem que o iate não poderia navegar nas condições em que foi ao mar na última sexta-feira, mas tinha autorização da Capitania dos Portos para navegação em curtas distâncias e sem passageiros.

Ele disse que contratou um marinheiro, de quem não soube informar o nome completo, para cuidar das manutenções e segurança do barco. Segundo Barton, este marinheiro morava no iate e teria saído por conta própria, porque tinha a ordem de não movimentá-lo.

A Marinha vai instaurar hoje inquérito para apurar as causas e responsabilidades do naufrágio do iate Gladiador 8, em Palhoça. Segundo informou ontem a tenente Andressa Braun, da Capitania dos Portos, em Florianópolis, o prazo para a conclusão do procedimento – comum neste tipo de caso – é de 60 dias.

A tenente não tinha informações sobre o passado da embarcação nem se havia comunicação à Capitania pelo dono do barco apontando o risco em que ela se apresentava, conforme relatou ao DC o empresário Fernando Cruz.

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– Se havia alguma restrição não autorizando o tráfego eu desconheço, mas quem o lançou ao mar no mínimo agiu de forma irresponsável e irregular – comentou a tenente.

“A água dava choque, diz ocupante do iate”

Com o copo de cerveja na mão, José Antônio Coelho, 61 anos, celebra a nova chance de viver. Diz que ainda não entendeu bem o que aconteceu e ri com os amigos como se nada tivesse acontecido. O domingo foi de alegria, apesar do susto e das lembranças.

– Não consigo esquecer do meu amigo falando: “José, não vou ver o meu filho nascer”. Vejo cenas de horror desse dia na cabeça – diz.

José conta que entrou de última hora na excursão. O irmão dele comprou o pacote de

R$ 800 para a pescaria. Um dos participantes adoeceu e José foi.

Ele conta que o barco era tão bonito que tirou os sapatos para entrar. Saíram às 13h30min e chegaram ao destino às 17h.

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– Sentimos cheiro de queimado e o comandante viu que tinha água na descarga de motores. A escotilha estava aberta e descemos no primeiro andar para fechar, mas a água dava choque – conta.

Nesse momento, ele diz que a vida passou diante dos olhos. Em alguns minutos todos se reuniram, decidiram que quando o barco afundasse ficariam todos juntos, de colete, agarrados em uma corda com boias. José avistou um barco pesqueiro longe. Todos gritaram e abanaram os braços.

– A saída do iate foi lenta. Quando estávamos todos lá, vimos o comandante tentando sair, mas a corrente o empurrava para dentro de novo. Achamos que ele tinha morrido, mas ele veio à tona – lembra José.

Da hora que sentiram o cheiro até o barco afundar foram 25 minutos.

“Avisei a todos e ninguém fez nada”

Diário Catarinense – Quais eram os principais problemas do barco?

Fernando Cruz – No último laudo, os geradores não funcionavam e havia problemas de evacuação da água. As escotilhas também estavam com problemas. Podem ter arrebentado porque o dono do píer nos disse na semana passada que o barco colidiu no píer em que estava atracado.

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DC – O que você acha de o fato do barco ter afundado?

Cruz – Faz cinco meses que alerto que isso poderia acontecer. Entrei na Justiça, falei com a Marinha e ninguém fez nada. Já que não bloquearam o iate para evitar uma tragédia, eles são responsáveis pelo que aconteceu. Poderia ter morrido gente.

DC – O que você vai fazer agora?

Cruz – O barco não tinha seguro. Alguém vai ter que responder pelo acidente e pagar. O comandante estava sob responsabilidade do construtor. O juiz colocou o barco sob guarda dele. Vou abrir processo contra todos os envolvidos, inclusive contra a Marinha. Eles foram corresponsáveis pelo o que aconteceu.

“O marinheiro saiu por conta própria”

Diário Catarinense – Você sabia que o barco sairia para pesca na Ilha dos Moleques?

Ronald Miro Barton – Não. O barco tinha autorização da Capitania para navegar, mas sem passageiros. O marinheiro saiu por conta, sem atender às instruções. A ordem era não retirar o barco do píer.

DC – Quem era o marinheiro?

Barton – Não tenho o nome completo dele. Contratei-o para que levasse o barco do Iate Clube até o píer, cuidasse e fizesse as manutenções. Ele morava no barco, por isso não tenho o endereço. Tentei ligar para o celular desse marinheiro, mas acho que ele perdeu no acidente. Espero que ele ligue para mim, porque não tenho como entrar em contato.

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DC – O que você pretende fazer agora?

Barton – O marinheiro será processado. Vou conversar com advogado para ser orientado.

DC – Qual é a razão do estado do barco?

Barton – O barco estava em más condições porque nos últimos anos não passou por manutenção. O barco havia sido usado por três anos e nunca havia tido problemas.