Noite de sábado e Hugo Chávez decide falar ao mundo. É véspera de eleições, seu cargo está em jogo e nada melhor que uma coletiva de imprensa para garantir espaço nos meios nacionais e internacionais – a TV estatal VTV inclusive transmitiu ao vivo a entrevista, fato muito criticado pelos oposicionistas, que não tiveram a mesma presença de espírito (ou seria oportunidade?).

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Mais de 60 jornalistas estrangeiros e uns 20 venezuelanos correram para o Palácio Miraflores, assim que receberam aviso de que El Presidente falaria. Após esperar uma hora e meia na calçada ao lado do prédio, passaram por um brete metálico, sofreram duas revistas de corpo inteiro, foram submetidos a detetor de metal, apresentaram credenciais e passaportes. E foram brindados com sucos e croissants, que Chávez também não é bobo…

A coletiva começou com duas horas de atraso, noite avançada. A mestre de cerimônias, Isabel Rui (diretora dei Comunicação Internacional do Ministério do Poder Popular para a Comunicação e a Informação) avisou que o presidente faria um pequeno pronunciamento e talvez respondesse “uma ou duas perguntas”, em decorrência da exaustão de final de campanha.

Rodeado por um séquito de militares fardados e policiais à paisana, Chávez apareceu sorridente. Rosto muito inchado, pela quimioterapia que faz para combater um câncer pélvico, mas com voz firme,ele começou com um breve discurso de homenagem a Carlos Chacho Álvarez, representante da Unasul para fiscalizar o pleito, e depois se dispôs a falar com os jornalistas. Mas, ao ver a multidão de jornalistas – que chamou de “enxame” – Chávez esqueceu o cansaço e as recomendações de sua assessora de imprensa. Falou por quase duas horas. Para cada pergunta, o presidente venezuelano deu um pequeno discurso como resposta. Só os estrangeiros puderam fazer questionamentos, o que provocou um murmúrio de desaprovação por parte da mídia venezuelana, majoritariamente de oposição. A TV estatal, porém, transmitiu tudo.

Teatral, Chávez posou com uma belíssima espada, ganha numa visita ao Peru. O presidente venezuelano esbanjou otimismo com relação ao pleito, mandou recados a adversários e deu voz a teorias conspiracionistas sobre as ameaças contra o projeto bolivariano e esquerdista em toda a América. Confira os principais trechos abordados na entrevista, da qual Zero Hora participou:

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A VITÓRIA DO PROJETO BOLIVARIANO

Chávez se disse convicto de que a Revolução Bolivariana e a Constituição serão as grandes vitoriosas no pleito. Ele diz que essa é um caminhada de 20 anos, que começou quando liderou uma tentativa de golpe militar, em 1992.

– Eu peguei num fuzil, estive a ponto de fazer uma guerrilha. É que esta casa (o palácio presidencial) era um balcão de negócios. Quando nos rebelamos, a Venezuela esteve à beira da guerra civil. Mas esperei, larguei a arma e fui eleito. De forma pacífica e democrática. Nesses quase 14 anos fizemos muito, reduzimos o analfabetismo e a pobreza. Tenho convicção na vitória.

O VENCEDOR ASSUME

O presidente-candidato venezuelano sorriu ao ser questionado se o vencedor do pleito assume. “Claro, desde que aja dentro da lei”, respondeu. Chávez disse que não acredita em distúrbios pós-eleitorais, por ter a Venezuela um “sistema eleitoral maduro e seguro, com auditorias antes e depois do pleito”. Seja qual for o resultado, o povo venezuelano garantirá quem vencer, resumiu.

CONSPIRAÇÃO CONTRA A ESQUERDA

O presidente venezuelano afirmou acreditar que o golpe que o derrubou (por três dias apenas) em 2002 foi parte de uma conspiração maior, contra o crescimento da esquerda latino-americana.

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– Queriam, além de me tirar, evitar a ascensão do Lula no Brasil. Era uma tentativa do Império de bloquear a esquerda. E isso continua. No Paraguai e Honduras, derrubaram os presidentes, meus amigos Lugo e Zelaya.

OLIGARQUIAS AGRÁRIAS E URBANAS

Chávez aproveitou para fazer um balanço de feitos e alfinetar seus adversários, reunidos em torno do jovial oponente político Henrique Capriles.

– Os poderes concentrados, as oligarquias agrárias e urbanas, todos tentaram me cooptar. Mas fiz um juramento, mudar esse país, nem que fosse à custa da minha vida. Em 2002 me retiraram do palácio, me sequestraram, queriam me matar, mas houve como um milagre. O povo me resgatou. Naquela época, tentaram com um golpe. Hoje, esses mesmos setores se reincorporaram ao jogo democrático.

O presidente venezuelano fez uma advertência clara aos adversários: “Oxalá não se prestem ao jogo da desestabilização. Temos como neutralizá-los”.

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20 ANOS NO PODER?

Questionado se esta será sua última eleição presidencial, Chávez deu uma resposta dúbia.

– 20 anos não é nada, como diz aquele tango argentino, Cambalache. Não se trata de Hugo Chávez ficar duas décadas no poder. É que represento um novo tipo de projeto, popular. Um sistema, que vai continuar, amparado em eleições.