Quando engravidou do Davi, Laís de Oliveira, de 27 anos, trabalhava em uma empresa de tecnologia que exigia mais de oito horas de dedicação diária e viagens frequentes. Ao pensar na maternidade, sentenciou: “desse jeito, não cabe um filho no meu dia”. Foi aí que ela decidiu largar o emprego e tentar um negócio próprio. Deu mais do que certo. Hoje, sua empresa de fraldas ecológicas está consolidada e garante a renda mensal, além de permitir conciliar o trabalho com a vida de mãe.

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Situação semelhante à de Aline Almeida da Silva, de 39 anos, que, depois do nascimento da Alice, largou a profissão de engenheira civil e passou a se dedicar à sua fábrica de comida para crianças. A empresa ainda não tem o mesmo rendimento que seu trabalho anterior, mas nem por isso diminui a satisfação de Aline em tocar o seu próprio negócio.

Depois de 22 anos trabalhando na área da Engenheira Civil, ela percebeu que não era isso que queria quando a Alice nasceu, em outubro de 2013, e largou o emprego onde ganhava bem.

Em casa, todos os dias Aline preparava a comida da Alice, uma criança que nasceu com paralisia cerebral e tem o movimento dos quatro membros comprometido, além de dificuldades cognitivas. A partir daí, teve a ideia de preparar e vender comida para outras crianças.

— Feijão e arroz a mãe faz no dia a dia e, se não tem tempo, acaba dando qualquer porcaria pra criança. É importante variar o paladar das crianças, por isso a gente foca em alimentos não convencionais. Temos receitas que levam quiabo, batata salsa, paçoca de pinhão, escabeche de sardinha e canja com quinoa, por exemplo. São mais de 20 receitas ao todo — conta.

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As opções do cardápio variam entre R$ 6,50 e R$ 15. Além da alimentação das crianças, a Paplim também oferece refeições para as mães. Depois de um estudo sobre quais alimentos são bons para serem ingeridos no pós-parto e uma pesquisa com 500 mulheres para ver o que elas gostariam de comer, o cardápio ganhou opções como polenta com frango, peixe com leite de coco, macarrão à bolonhesa e creme de ervilha com alho poró. Tudo pode ser comprado pelo site (paplim.com.br).

Preocupação ecológica

Quando engravidou do Davi, há seis anos, Laís de Oliveira começou a refletir sobre a quantidade de lixo gerado com as fraldas descartáveis. Pesquisou sobre o assunto e descobriu que cada criança usa, em média, 5 mil fraldas ao longo da vida.

— São 5 mil fraldas que demoram, cada uma, 500 anos para se decompor. A primeira fralda descartável inventada no mundo, e todas as outras que vieram depois, ainda estão aí — conta Laís.

Depois de um ano comprando fraldas ecológicas para o filho, ela percebeu que usando seus conhecimentos de tecnologia poderia oferecer um serviço diferente do que havia no mercado. Surgia assim a Nós e o Davi, uma fábrica de fraldas reutilizáveis que segue preceitos ecologicamente corretos.

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Cinco anos depois, a empresa vende uma média mensal de 1.600 unidades, com preço aproximado de R$ 60 cada. As fraldas são feitas com um tecido e um absorvente que não deixam o bebê ficar em contato com o molhado. Com um sistema de botões, elas podem ser adaptáveis aos tamanhos P, M e G.

— Cada vez que a criança usa uma fralda dessa, troca por outra. É igual a fralda descartável, com a diferença de que você lava em vez de jogar no lixo. Não precisa deixar de molho nem nada, é prático, mas exige essa mudança de mentalidade — explica.

De acordo com Laís, 24 fraldas reutilizáveis são suficientes para a criança até o momento de desfraldar. Em cinco anos de serviço, a estimativa é de que a fábrica ajudou a evitar que mais de 280 toneladas de fraldas descartáveis fossem para o lixo. As informações da empresa estão no site (www.noseodavi.com).

Empresário priorizam contratar mães

A decisão dessas duas moradoras de Florianópolis é uma das saídas que mulheres mães criaram para enfrentar a dura realidade do mercado profissional brasileiro. De acordo com a pesquisa Licença maternidade e suas consequências no mercado de trabalho do Brasil, realizada pela Escola Brasileira de Economia e Finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV EPGE) no começo deste ano, metade das mulheres sai do emprego formal 12 meses após o início da licença maternidade.

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— Esse movimento de mães buscando o próprio negócio mostra uma deficiência do mercado de trabalho. As empresas não conseguem conciliar a demanda profissional com o desejo das pessoas de fazer outras coisas além do trabalho — comenta Laís.

Quem já fez entrevista de emprego depois de se tornar mãe provavelmente já viu aquela cara de desconfiança do entrevistador quando surge o assunto “filhos”. Não raras vezes, o currículo é descartado na hora.

Preconceito ou desinformação levam a crer que essas mulheres vão largar tudo a qualquer momento para dar atenção aos filhos, mas não é bem assim. Na visão dessas empreendedoras, a maternidade traz um senso de responsabilidade e um comprometimento maior com o emprego.

Tanto Laís quanto Aline dão prioridade de contratação para mulheres mães em suas empresas. E tem dado certo. Na fábrica de fraldas ecológicas, das 12 funcionárias, 10 são mães. Na empresa de alimentação infantil, as duas funcionárias também têm filhos.

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— É uma forma de acolher e reposicionar essas mulheres no mercado de trabalho, porque só quem tem filho sabe o empenho que é gerenciar todas essas coisas e ainda trabalhar. Eu vejo que essas mulheres, além de estarem capacitadas para o trabalho, têm um senso de responsabilidade muito grande — avalia Laís.

Rede de apoio

Tanto a maternidade quanto o emprego exigem muita dedicação, mas elas acreditam isso pode ser conciliado com uma divisão igualitária das responsabilidades com o pai e com uma jornada profissional flexível, na qual, eventualmente, uma ausência pode ser compensada com o trabalho em outro momento.

Para as duas empreendedoras, se houver uma rede de apoio para a criação dos filhos fica tudo mais fácil. Na visão de Aline, é importante que as mães possam contar com a parceria da família e amigos.

— Para criar uma criança é preciso de uma comunidade, não só de uma pessoa ou um casal. Com a Paplim, quero ajudar essas mulheres a terem mais tempo para elas, porque a sanidade mental é importantíssima. Nem sempre o pai vê se a meia está servindo ou se tem que marcar dentista. É a mãe que faz isso, porque é o “papel da mulher”. Então, eu quero tirar um pouco o peso dessa mãe — comenta.

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— Eu tenho uma boa relação com o pai do Davi, porque eu batalhei. A gente divide bastante as responsabilidades. Não chega a ser uma divisão 50-50, mas é o mais próximo disso que a gente consegue. Mesmo assim, sem essa rede de apoio não é possível trabalhar, seja no mercado profissional, seja tocar um negócio próprio — completa Laís.