Nos últimos 30 anos conheci e entrevistei mulheres dos mais diferentes credos, etnias, condições financeiras, escolaridades, estados civis e idades. Muitas, mães amorosas. Outras, mães sem tempo e cheias de culpa, mães de filhos dos outros, mães de bichos, mães dos próprios pais, mães da criançada da comunidade, fazendo jus ao ditado de que nada no mundo é maior do que coração de mãe.
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E as avós? Ah, quantas histórias ouvi delas ao longo de todo este tempo. Tantas vezes chorei, com as histórias tristes de abandono, e quantos vezes voltei para o jornal leve e feliz, por saber que a velhice pode, sim, ser uma época plena de realizações. Quanta sabedoria, quantos ensinamentos recebidos, quantas lições de vida que carregarei para sempre comigo.
Entrevistei mulheres livres, aventureiras, mochileiras, que passam a vida conquistando novas terras, e também mulheres presas em cadeias e presídios, vivendo em condições subumanas, separadas de seus filhos e sem qualquer apoio dos ex- companheiros. Ex, sim, porque mulher espera o marido sair da cadeia, vai visitá- lo toda a semana. Mas o homem, se a mulher é presa, em seguida arruma outra para colocar em seu lugar.
Conheci mulheres cientistas e seus trabalhos revolucionários nas áreas da medicina, da economia, da política, da assistência social. E me emocionei, também, documentando a alegria de senhoras que conseguiam, pela primeira vez, escrever seu nome num papel ou ler uma pequena frase no quadro negro da escola de alfabetização de adultos.
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Várias vezes fui visitar centros de recuperação de jovens dependentes químicos e ouvi histórias tristes de meninas que se prostituíam para conseguir uma pedra de crack, porém, em muitas outras oportunidades, pude, em meus textos, enaltecer a coragem e o protagonismo de meninas que, desde muito cedo, lutam por um mundo melhor.
Conheci e entrevistei mulheres incríveis, como a doutora Zilda Arns, uma das criadoras da Pastoral da Criança e que ajudou a salvar milhares de vidas pelo Brasil inteiro e também em vários países do Terceiro Mundo, e que morreu dentro de uma igreja, ensinando um grupo de voluntárias a preparar as misturas salvadoras para crianças subnutridas, durante aquele terrível terremoto no Haiti, em 2010. Ainda no campo da medicina, relembro com carinho as entrevistas com a centenária doutora Wladislava Mussi, que foi uma das médicas pioneiras em Santa Catarina. Mesmo aos 100 anos de idade, mantinha a lucidez e um humor que me cativaram desde o nosso primeiro encontro.
Com a imigrante Helga Szmuck foram semanas de conversas, nas quais ela contou desde a infância 2006 da família judia, na Alemanha, à perseguição de Hitler, e as várias fugas que empreendeu sozinha e com os filhos, ao longo de quase toda a vida. Passou fome, sede, medo, solidão, mas nunca esmoreceu. Falava muitas línguas, era uma astrônoma de mão cheia. Lembro- me da emoção que senti quando peguei na mão e fotografei seu antigo passaporte alemão, que tinha um Jota, de judeu, estampado na capa, que era justamente para impedir que eles saíssem escondidos do país, durante a Segunda Guerra. Quanta coisa aprendi com ela. Helga morreu há poucos anos, em seu apartamento na Praia dos Ingleses, sua última morada. Ficaram comigo vários escritos e depoimentos gravados, para um livro que, quem sabe, um dia ainda terei coragem de escrever.
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Foram muitas as histórias de mulheres fortes e exemplares que ouvi e passei adiante, nas páginas do jornal, por acreditar que elas precisavam ser conhecidas e admiradas. Entrevistei mães de jovens que perderam a vida em acidentes de trânsito e que fizeram deste momento trágico uma bandeira contra a violência nas estradas; mães de crianças internadas em hospitais, à espera de cirurgias salvadoras ou de um milagre; mães que passam meses e meses ao lado de seus pequenos, internados em UTIs pediátricas; mães em filas de hospitais, rezando por atendimento médico.
Como jornalista, vivenciei também o outro lado: médicas abnegadas que salvam vidas nos lugares mais inóspitos do planeta, cientistas incansáveis na busca de medicamentos e vacinas que garantirão melhor qualidade de vida às pessoas; voluntários que doam todo o seu tempo aos doentes nos hospitais, asilos e orfanatos.
Poderia passar horas e preencher várias páginas relembrando mulheres que mereceriam ser citadas e que, com suas histórias, enriqueceram minha vida, como mulher, como mãe, como filha, como jornalista e, principalmente, como cidadã.
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