O brilho no olhar e o sorriso largo não escondem a felicidade de Luana Schwanke Bauer por poder trabalhar, hoje, com aquilo que realmente ama. Aos 35 anos ela é uma das motoristas do transporte coletivo de Blumenau e carrega a grande missão de fazer com que outras pessoas cheguem aos seus destinos com segurança.
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O que poucos sabem é que, atrás do volante, além de uma profissional experiente, há também uma mulher sonhadora. Antes de chegar à atual posição de condutora de ônibus, Luana era a pessoa responsável por cobrar os passageiros. Foi ali que surgiu o interesse por veículos maiores, conforme conta.
De longe, ela passou a observar outras mulheres à frente do transporte coletivo, admirando-as mais a cada viagem que ia sendo concluída. Como o marido também trabalhava com caminhões, a vontade de manusear carros maiores foi só crescendo. E com o passar dos dias Luana entendeu que poderia seguir por aquele caminho, caso fosse o que ela realmente quisesse para si.
— Ali eu vi que não era coisa só para homem — diz.
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Há cinco anos Luana adquiriu habilitação para dirigir veículos grandes e, há dois, atua como motorista da Blumob, empresa responsável por operar o transporte coletivo de Blumenau. No dia a dia, conta que costuma levar uma rotina normal, como qualquer outro trabalhador. Raramente se depara com comentários machistas ou situações desconfortáveis por ser mulher, mas tem consciência de que nem todas têm a mesma “sorte” — por mais inaceitável que isso seja em pleno ano de 2024.

— Sei que ainda é um tabu. Vejo que muitas pessoas ficam espantadas ao verem uma mulher dirigindo um ônibus grande. Mas acho que essa discriminação já é um pouco menor. Quando as mulheres começaram [nessa profissão], tinha muito mais. Agora não é tão frequente. Mas a gente ainda percebe uns olhares — revela.
Na mesma empresa e função também trabalha Sabrina Fagundes de Farias, de Blumenau. Da mesma forma que Luana, a funcionária começou no local como cobradora, onde permaneceu por 12 anos até receber a oportunidade de se tornar motorista de ônibus.
Desde abril de 2024 Sabrina é responsável, oficialmente, pela condução do veículo da Blumob. Com 1,55 metro de altura, ela assume o volante do transporte coletivo e mostra a grandeza que uma mulher pode ter, independentemente do lugar em que ela estiver.
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Mesmo assim, não há como ignorar os julgamentos que recebe no dia a dia, especialmente do sexo oposto. Ainda que Sabrina se mostre realizada com a profissão que escolheu, essa nunca parece ter sido a decisão certa, na opinião dos outros. Mas ela sabe, que aos poucos, a sociedade está evoluindo e, hoje, a motorista de apenas 34 anos se sente privilegiada por ver que, cada vez mais, mulheres estão assumindo uma função antes vista exclusivamente como masculina.
— Como em todo o lugar onde há muitos homens, sempre tem preconceito. Alguns duvidam da gente e aí precisamos provar que o serviço é bem feito para ele ser validado. Mas essas pessoas não influenciam porque ao mesmo tempo tem pessoas muito boas também, que nos incentivam. Com a força feminina a gente pode chegar onde quisermos. Podemos conquistar o mundo — ressalta.
“Me orientam a trabalhar em outra profissão”
Há alguns quilômetros de distância, também descobrindo sua força atrás de um volante, está Maria Gilserli da Silva Oliveira. Natural de Cruzeiro do Sul, no Acre, a mulher de 43 anos é motorista de um caminhão de coleta seletiva, em Itapema.
Apesar da pouca idade, Maria esbanja experiência ao contar, com orgulho, de todos os cargos que já assumiu enquanto condutora de veículos maiores, desde 2005. Ao concluir o Ensino Médio, chegou a atuar em escritórios já que se formou, na época, como técnica contábil.
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A experiência, porém, não durou muito. Maria sabia que queria mais e que as paredes daquela sala em que trabalhava não combinavam com o espírito livre que tinha dentro de si. Pelo lado de fora, era como se o vento a chamasse para que ela pudesse senti-lo — e a janela de um caminhão parecia o lugar perfeito para isso.
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Desde então, a mulher já trabalhou como motorista de ônibus especial, escolar, como caminhoneira e condutora de veículos durante serviços de terraplanagem e limpeza de ruas, por exemplo.
Ainda assim, parece não ser o suficiente.
— As pessoas chegam a me orientar a trabalhar em outra profissão. Mas aí eu digo que estou feliz e realizada. Mesmo assim me olham e falam que é um serviço masculino. Eu rebato e digo que “foi”, no passado. Com a igualdade, as mulheres também estão tendo a oportunidade de mostrar o seu trabalho e, muitas vezes, desenvolvendo ele melhor do que os homens — diz.
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A insistência é tanta que os homens se sentem até no direito de dizer com o que Maria deveria trabalhar, conforme conta. As opções vão de diarista a funcionária de escritório, consideradas, por eles, cargos femininos.
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A mulher, porém, não abaixa a cabeça. Assim como Luana e Sabrina, a acriana também realiza, hoje, um sonho. Tudo começou quando ela era apenas uma menina e assistia a um programa de TV com Sula Miranda, que passou a ser conhecida como a “Rainha dos Caminhoneiros”.
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Diante daquela tela, Maria decidiu que, um dia, ainda conduziria um caminhão e que ninguém poderia impedi-la de alcançar aquele objetivo. Anos depois, ela permanece com o mesmo pensamento: não há qualquer possibilidade de Maria permitir que alguém diga onde ela deve ou não estar.
— Eu corri atrás e amo muito o que eu faço. É um caminho longo, difícil, você não pode desistir. Mas é maravilhoso uma mulher poder chegar em um lugar onde, antigamente, só homens trabalhavam. A gente descobre que também é capaz — também enfatiza a motorista de ônibus da Blumob, Luana.

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