A mulher com deficiência auditiva que, supostamente, era mantida em condições análogas à escravidão pelo desembargador catarinense Jorge Luiz de Borba foi encaminhada a um abrigo e, agora, terá aulas da Língua Brasileira de Sinais (Libras) para relatar a própria versão dos fatos, conforme divulgou o Ministério Público do Trabalho (MPT) nesta segunda-feira (12). Já a família do desembargador comunicou que entrará na Justiça para reconhecer a filiação afetiva da trabalhadora resgatada.
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O caso chegou às autoridades a partir de uma denúncia anônima em novembro do ano passado. De acordo com o MPT, a mulher foi retirada de um abrigo de crianças de São Paulo pela sogra do desembargador aos nove anos. Na adolescência, ela foi entregue ao casal e passou a conviver com a família, na mesma época em que a primeira filha dos investigados nasceu.
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A Promotoria afirma, ainda, que a mulher apenas se comunicava por meio de gestos simples, que apenas era compreendido por quem convivia com ela. Além disso, ela somente passou a ter CPF, plano de saúde, RG e título de eleitor em 2021, também conforme explica o MPT.
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O desembargador foi alvo de mandados de busca e apreensão que trataram do caso na última terça-feira (6), em sua residência, em operação que contou com a participação de Auditores-Fiscais do Trabalho, vinculados ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), do Ministério Público do Trabalho (MPT), do Ministério Público Federal (MPF), da Defensoria Pública da União (DPU) e da Polícia Federal (PF).
Já o resgate da trabalhadora, a ação que retirou ela da casa do desembargador, se deu na sexta (9).
Agora, o MPT e a DPU poderão propor um termo de ajuste de conduta (TAC), além de cobrar o pagamento de dívidas trabalhistas em conjunto com os Auditores-Fiscais do MTE e ajuizar ação civil pública em caso de recusa de assinatura de TAC.
A ideia é de que o MTE emita os autos de infração e libere as guias para que a mulher receba três parcelas de seguro-desemprego. Ela também poderá inserir o desembargador no cadastro de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à escravidão, conhecida como “lista suja”. Os documentos serão encaminhados ao MPF, que seguirá com as investigações.
Entenda o caso e o que diz o desembargador
A mulher foi resgatada três dias após uma operação na casa do desembargador, em Florianópolis, ocorrida no último dia 6 de junho, mobilizada por uma denúncia.
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A trabalhadora tem deficiência auditiva e era mantida pelo desembargador e a esposa, segundo a investigação, sob “trabalho forçado, jornadas exaustivas e condições degradantes”, sem remuneração, conforme divulgou o MPF após a operação vir a público.
Ainda na ocasião, o MPF divulgou que a mulher também seria vítima de maus-tratos por conta das condições materiais em que vivia e “em virtude da negativa dos investigados em prestar-lhe assistência à saúde”. A Promotoria afirmou que a mulher nunca teve instrução formal e não possui convívio social.
No mesmo dia, o desembargador negou que tenha cometido crimes e manifestou inconformismo em comunicado à imprensa. Ele disse ainda ter acolhido ela como uma familiar há mais de 30 anos, tratando o caso suspeito de trabalho análogo à escravidão como, na verdade, “um ato de amor”.
Neste domingo (11), o desembargador divulgou novo comunicado, desta vez assinado em conjunto com toda a família, em que dizia que irá entrar com um pedido judicial para o reconhecimento da filiação afetiva dela, com concessão de todos os direitos hereditários.
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O Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) não se posicionou sobre o caso.
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