Uma conversa desencontrada. Um áudio que serviu para acalmar o coração angustiado da irmã por algumas horas e a promessa de que o diálogo prosseguiria mais tarde. Mas não continuou. Mais de duas semanas se passaram desde que três pessoas da mesma família foram mortas no interior de Alfredo Wagner, pequeno município da Grande Florianópolis.

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Após a reconstituição do triplo homicídio, na quinta-feira (22), a filha do casal, Ana Paula Matthes Tuneu de 31 anos, chegou ao sítio onde a família morava. Ela, que morava no Rio de Janeiro, está instalada na casa secundária da propriedade, junto com o marido e o filho de três anos.

E, embora esteja na mesma propriedade onde dois, dos três familiares assassinados morreram, não quis acompanhar a reconstituição do crime que vitimou o pai Carlos Alberto Tuneu, 67 anos, a mãe Loraci Matthes, 50, e o irmão caçula Mateo Tuneu, 8. Também não quer falar sobre o crime, por uma decisão tomada junto com os outros três irmãos, mas revive a angústia dos sonhos com o irmão, nos dias que antecederam o triplo homicídio:

– Fiquei assustada e comecei a mandar mensagens para minha mãe a todo momento: 'Como está Mateo? Ele não está doente? Ele está aí com você?' Eu perguntava.

As marcas do crime

Foi Ana Paula quem buscou os corpos dos familiares em Lages, na Serra catarinense, para o enterro realizado em Marechal Cândido Rondon, no Paraná. Ela lembra do que viu na casa quando passou para buscar algumas roupas de frio, que havia deixado no sítio onde fazia visitas anuais ao irmão, Mateo, à mãe biológica, Loraci, e a Carlos, pai que a reconheceu como filha.

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E, embora chocante, não foi a cena encontrada na casa, ainda com as marcas deixadas pelo crime, que lateja na memória da Ana Paula. A lembrança mais forte é da conversa que teve com o irmão, nas horas que antecederam a morte do menino: "Agora eu vou fazer a tarefa e mais tarde a gente conversa", disse o caçula, que se preparava para ir à escola, em áudio encaminhado pelo WhatsApp na manhã da sexta-feira (9), mesmo dia do crime.

Ana Paula perdeu os pais e o irmão caçula
Ana Paula perdeu os pais e o irmão caçula (Foto: Arquivo Pessoal)

Emocionada, Ana Paula conta que havia sonhado com a morte do irmão Mateo na quarta-feira (7), dois dias antes do triplo homicídio:

Fiquei assustada e comecei a mandar mensagens para minha mãe a todo momento: 'Como está Mateo? Ele não está doente? Ele está aí com você?' Eu perguntava.

Na tarde de quinta-feira (8), quando Ana Paula deitou para descansar da jornada de trabalho noturna, outro sonho a preocupou: dessa vez, indicava que alguém próximo havia morrido, mas não deixava claro quem era.

— Eu chamei minha mãe e contei dos sonhos. De manhã (na sexta) ela pediu pro Mateo mandar um áudio: "mana, eu estou bem. Como você está?" Eu não respondi na hora, então, ele se despediu dizendo "te amo", como sempre fazia e falou que depois a gente conversava. Mas não teve depois – lamenta Ana Paula.

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Ana Paula, o filho de três anos e o irmão, Mateo
Ana Paula, o filho de três anos e o irmão, Mateo (Foto: Arquivo Pessoal)

A escolha do sítio

A família se mudou para a propriedade de Alfredo Wagner há seis anos, aproximadamente, quando o filho caçula ainda era criança de colo. O casal morava em Buenos Aires na época e procurava por uma propriedade mais tranquila, conta a filha Ana Paula:

— O pai (de criação) tinha descoberto o Mercado Livre (site de vendas) e achou esse sítio para venda. Ele ficou encantado e foi procurar onde ficava Alfredo Wagner. Viu que era perto de Florianópolis, gostou e decidiram comprar.

Eles aumentaram a casa principal ao longo dos anos, sem pressa. E ainda adaptavam os detalhes, para deixar a gosto do casal. De acordo com a filha, o quarto onde os pais se instalariam definitivamente não ficou pronto a tempo de usar, porque o cômodo deveria ser "como eles queriam".

— A mãe adorava se entreter com as vacas. Até não queria dar elas no negócio que fizeram – conta rapidamente, ao se referir sobre os supostos acordos entre os pais e o suspeito pelo triplo homicídio.

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A família vivia principalmente do que cultivava. Ovelhas, vacas, galinhas e plantações, mas também vendia madeira. E foi para cuidar do patrimônio e manter o sítio – cheio de animais – em dia, que Ana Paulo deixou o Rio de Janeiro.

— Mas eu vou ficar nessa casa aqui [aponta]. Na outra [onde foram mortos os familiares], eu não tenho coragem de morar – completa.