Se todo líder tem uma missão, a da cacique da aldeia Itaty, Eunice Antunes, 33 anos, era garantir a terra para cerca de 200 pessoas de sua comunidade, no Morro dos Cavalos, em Palhoça. Eleita em fevereiro do ano passado, desbancando três homens, candidatos ao posto mais representativo da tribo, ela está próxima de conseguir o prometido.

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Educação como primeira bandeira

Kerexy Yxapy (seu nome guarani) formou-se professora em 2003, é mãe de três filhos e está casada com Marcos Moreira, orientador pedagógico da escola da aldeia. Descobriu-se líder logo após o magistério, quando iniciou sua primeira luta em prol da aldeia.

– Na época, a coordenação pedagógica era resistente ao ensino do guarani na escola. Foi uma briga para poder ensinar a língua mãe dentro da sala de aula. Ali, eu descobri que podia fazer mais pela minha comunidade – lembrou ela.

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Como cacique, Eunice Antunes representa a ordem entre as 37 famílias, mas, principalmente, o diálogo com o mundo fora dos limites da aldeia.

– É uma função política, mesmo. A principal diferença entre homem ou mulher é que nós somos mais observadoras – disse, orgulhosa.

No dia a dia, ela orienta os mais jovens, mantém as tradições e até castiga, quando for necessário.

– Um índio foi para um encontro sem a esposa e ela se queixou para mim. Ele teve que capinar mato por dois dias.

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Vaidade de cacique

Eunice é vaidosa, mas nem tanto, como ela mesmo diz. É mulher de batom, colar e pulseiras apenas. Hoje, é comemorado o Dia Internacional da Mulher.

– Há mulheres mais vaidosas na aldeia, que se maquiam bastante, pintam o cabelo e cortam de várias maneiras. A índia é vaidosa.

E muito mais. Eunice conta que a mulher tem um papel de liderança desde os primórdios dos guaranis, há cerca de 5 mil anos.

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– Um índio não toma uma decisão sem ouvir a mulher. Enquanto o homem é a ação, a mulher é o olho da aldeia. Elas estão por dentro de tudo que acontece ali e são sempre consideradas – afirmou.

Liderança e respeito

Vista com desconfiança no início, Eunice hoje é respeitada entre lideranças indígenas e representantes do poder público e sociedade civil.

– Até pelos inimigos – acrescenta ela, entre risos.

Serena, orgulhosa e líder, Eunice vai seguir sua missão com os guaranis do Morro dos Cavalos, na valorização da cultura, mantendo os rituais e a religião forte entre os seus.

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Cacique mulher é fenômeno recente, diz pesquisadora

Mesmo assim, a ascensão das mulheres ao posto de cacique é recente no país, segundo a antropóloga, pesquisadora da cultura Guarani, Nádia Heusi Silveira.

– Algo que tem acontecido de duas décadas para cá. Acredito que tem muito a ver com as políticas públicas voltadas para as mulheres. Na aldeia, tanto os homens quanto as mulheres têm peso nas decisões políticas – analisou a pesquisadora.

::: Entrevista em vídeo com Eunice Antunes: