Com a participação de médicos pediatras e endocrinologistas, chefs de cozinha, mães e das próprias crianças, o documentário Muito Além do Peso, dirigido por Estela Renner e Marcos Nisti, reúne histórias que revelam um cenário preocupante para a saúde pública brasileira: 33% das crianças brasileiras estão obesas.
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O filme mostra, em 84 minutos, como a educação alimentar das crianças é influenciada pela TV, revela a conivência dos pais com a ingestão de salgadinhos e refrigerantes desde muito cedo e mostra a falta de familiaridade das crianças com legumes, frutas e vegetais. Revela, ainda, como a obesidade acaba virando porta de entrada para outras doenças, como o diabetes tipo 2, pressão alta e depressão.
Na entrevista a seguir, concedida por telefone ao Meu Filho, Estela diz que a intenção, agora, é distribuir o filme em todas as escolas do Brasil. Confira:
Meu Filho – A partir da realização do documentário, como você percebe a influência da mídia na alimentação das crianças?
Estela Renner – São muitos os fatores que pude observar. Excesso de propaganda e canais de TV, é um universo muito sedutor. A gente sabe, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), que as crianças passam, em média, cinco horas na frente da TV. Aí me pergunto: quem está educando nossas crianças? O pai e a mãe acham que é seguro deixar os filhos na frente da TV, mas não é exatamente um ambiente seguro. O excesso de TV contribui para fomentar um tipo de consumo não saudável. Acho que hoje, os pais não estão exercendo seu papel.
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MF – Como a questão da obesidade afeta o lado psicológico e o comportamento dessas crianças? No filme, fica visível como elas sofrem com a vergonha e com o bullying.
Estela – Pelo que conversei com os especialistas, assim que começa a perceber o próprio corpo, isso vira uma questão importante para a criança. Se ela é ridicularizada, isso é tão sofrido que, mesmo que ela seja um adulto magro, leva o trauma para a vida inteira. É um peso muito grande para a criança se sentir xingada. Aos poucos, ela vai se sentindo invisível na sala de aula e na sua autoestima também. Mas não acho que seja um problema isolado ligado apenas à comida: é uma questão de falta de afeto.
MF – Chama atenção os fatores que fazem as crianças ficarem mais sedentárias: a falta de segurança das ruas, a atração pelos jogos eletrônicos, TV. Como driblar esses desafios?
Estela – Dizem que a criança pode brincar criativamente em qualquer lugar, desde que alguém diga para ela desligar o eletrônico. Tem de ter coragem de desligar, que ela certamente vai arrumar uma forma de brincar. O problema é dar o sonho mastigado para ela. A criança precisa olhar para fora da janela e sonhar sozinha. Outro ponto é que antes tínhamos a rua para brincar. A questão da segurança, bala perdida e ruas esburacadas são fatores que levam muitos pais a não deixarem seus filhos brincarem nas ruas.
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MF – Outro aspecto curioso no filme são as crianças que não sabem distinguir um abacate de um pimentão. O que isso representa?
Estela – Simboliza um sintoma do desinteresse e da falta de conexão com a família, com a terra e com o que vem da terra. Tem muitas crianças que vão do leite materno direto para o refrigerante. E os pais não fazem ideia de que estão fazendo mal. Eles são permissivos, mas não dariam se soubesse quanto mal fazem com isso. É um filme que fala sobre excessos, mas, na verdade, mostra que a obesidade é um problema da falta: de ética, de valores, de atitude.
MF – Há várias cenas gravadas em Porto Alegre. Por que a Capital foi escolhida e que situação mais chamou atenção?
Estela- Escolhi crianças das cinco regiões a partir de pesquisa do IBGE. Escolhemos especialistas do Brasil e do mundo para relacionar com as situações do país. O cenário se repete em todo o mundo. A situação está muito parecida em todos os Estados, mas no Sul e no Sudeste está muito grande.
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