O Ministério Público de Santa Catarina (MP/SC) pediu a condenação do ex-presidente da Câmara de Vereadores de Florianópolis, César Faria, e de dois guardas municipais da ativa na Capital, Júlio Pereira Machado e Adriano João de Melo, por supostos crimes de corrupção passiva, organização criminosa, peculato, fraude em licitação e as agravantes de corrupção passiva enquanto funcionários públicos. Os pedidos foram apresentados nas alegações finais do MP no processo que investiga supostas denúncias de ilegalidades na contratação e manutenção de radares e semáforos em Florianópolis, uma das ações penais da Operação Ave de Rapina, deflagrada pela Polícia Federal em novembro de 2014. Além dos três servidores públicos, o MP também pede a condenação de oito empresários do setor semafórico e de radares, e dois ex-servidores da Prefeitura da Capital.
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As alegações finais, que entraram no sistema do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ/SC) em 1º de junho, foram assinadas pelos promotores do MP Tiago Carriço de Oliveira e Analú Librelato Longo, ambos da 39ª Promotoria criminal da Capital. Agora, as defesas preparam suas alegações finais e, depois, a Justiça estará apta a executar a sentença em primeira instância do processo que tramita desde o final de 2014. Para tanto, a juíza Érica Lourenço de Lima Ferreira poderá seguir ou não os pedidos do MP.
As provas apresentadas pelos promotores vieram de interceptações telefônicas, quebra de sigilos bancários e fiscais, além de depoimentos, nomeações públicas e análise de licitações e contratos municipais. No despacho, os promotores, no entanto, não apontam quanto exatamente em dinheiro teria sido desviado dos cofres públicos.
O MP também pede a condenação dos 13 denunciados ao pagamento de multa ao Município de Florianópolis não inferior a R$ 400 mil, “na medida dos prejuízos causados ao erário pelos crimes cometidos”. Solicita, ainda, a perda do cargo e função pública do ex-vereador César Faria, que é servidor de carreira da Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc), e de Júlio Pereira Machado e Adriano João de Melo, ambos guardas municipais da ativa na Capital. O primeiro, na época dos fatos, era secretário adjunto de Segurança Pública e o segundo atuava como diretor de Operações do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (Ipuf). O MP pleiteia que os três fiquem impedidos de exercer cargo ou função pública pelos próximos oito anos. Agora, a Justiça terá que se manifestar também sobre esses pedidos.
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Funcionários públicos seriam líderes do suposto esquema, diz MP
Segundo o MP/SC, em data imprecisa, mas pelo menos a partir de 2011, os funcionários públicos César Luiz Belloni Faria, Júlio Pereira Machado, Adriano João de Melo e Theo Mattos dos Santos – na época servidor da prefeitura – teriam implantado um esquema de corrupção no âmbito do Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (Ipuf), cujo objetivo era o recebimento de propina vinculada ao superfaturamento de contratos administrativos firmados com a municipalidade.
Para tal, de acordo com o MP, cooptaram os representantes de duas empresas cujo objeto social era a prestação de serviços de segurança no trânsito, a Focalle Engenharia Viária Ltda, dos sócios José Norberto D’Agostini e José D’Agostini Neto, e a Eliseu Kopp & Cia Ltda, representada pelo executivo Décio Stangherlin. Outras empresas, como a Artmil e a HLI Astech, eram utilizadas para “esquentar” o dinheiro da propina, diz o MP.
“Pelas provas colhidas, tem-se que César ‘deu o pontapé inicial’ para o esquema criminoso, quando indicou seus apadrinhados para cargo de chefia no IPUF, o que tornou possível as negociatas que ocasionaram os pagamentos das vantagens indevidas. Como visto, a prova demonstrou, ainda, o domínio da cadeia delitiva pelo vereador César, que além de ser um dos destinatários dos valores desviados da administração municipal, teria participou ativamente dos acontecimentos pós-apreensão da PRF, seja patrocinando a defesa dos comparsas, seja marcando encontros para uniformizar o discurso do grupo criminoso e impedir que o esquema fosse descortinado com a investigação criminal”, narra trecho da denúncia.
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Contraponto
O advogado Alessandro Marcelo de Souza, que representa o guarda municipal Adriano João de Melo, explica que ainda não apresentou alegações finais, pois entende ser muito curto o prazo dado para a defesa, já que “o MP levou um ano e nove dias para apresentar suas alegações finais”. Souza afirma que as acusações do MP são “inconsistentes” porque não há nos autos “preocupação em indicar provas”.
— As acusações são genéricas, não provam nada, e vamos mostrar isso nos autos — diz o advogado Souza.
O advogado Kissao Alvaro Thais, que defende o ex-vereador Cesar Faria, afirma que somente nesta segunda-feira foi aberto o prazo para que a defesa apresente suas alegações finais. Kissao diz que o MP pede a condenação de seu cliente “sem nenhuma prova”, “nenhum indício”, “nenhuma conversa com empresários”, “não tem nada”. Kissao afirma que as acusações da PF, em um primeiro momento, e do MP, em seguida, foram uma “enorme injustiça” contra seu cliente.
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— Não tem nada, não tem um elemento, uma prova. Não consigo entender o parecer do MP, porque não há sequer um indício, porque até requerimentos do próprio MP corroboraram a nossa tese, a de que o Cesar não fez parte de esquema algum. Eles não acharam nada e querem condenar o Cesar mesmo assim, mas vamos expor isso nas alegações, como o fizemos no curso do processo — explica Kissao.
A reportagem entrou em contato com o advogado Hélio Rubens Brasil, que defende Júlio Pereira Machado e Theo Mattos dos Santos, mas não o localizou até as 17h30min desta segunda-feira.
O advogado José Ernesto Flesch Chaves, que no sistema processual do TJ/SC aparece como advogado de Décio Stangherlin, denunciado por organização criminosa e corrupção ativa, disse à reportagem que não representa o Executivo. A reportagem não localizou outro advogado do denunciado.
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A reportagem conversou com um dos advogados que representa os donos da Focalle Engenharia Viária Ltda, José Norberto D’Agostini e José D’Agostini Neto, denunciados por peculato, corrupção ativa e organização criminosa, mas ele informou que outro advogado era o responsável pelo processo. A reportagem não localizou esse outro defensor.
Operação Ave de Rapina
Duas denúncias criminais na Justiça, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara de Florianópolis, um inquérito ainda em andamento no Ministério Público Estadual e uma investigação em curso no Ministério Público Eleitoral. Esse é o saldo da operação Ave de Rapina, que parou Florianópolis no dia 12 de novembro de 2014 por agentes da Polícia Federal (PF) e membros do Grupo de Atuação Especial em Combate ao Crime Organizado (Gaeco).
Ainda no primeiro dia, foram 15 prisões, 41 citados e a estimativa de que as investigações envolviam R$ 30 milhões em irregularidades, segundo o delegado da PF Allan Dias, que comandou inicialmente a operação, mas atualmente trabalha no Rio Grande do Norte. A operação foi tocada em três frentes: uma para analisar contratos com empresas de radares e semáforos do Ipuf, com denúncia aceita pela Justiça; sobre irregularidades no projeto de lei Cidade Limpa, de denúncia aguardando análise do juiz; e outra sobre fraudes em licitação na FCFFC (Fundação Cultural de Florianópolis Franklin Cascaes).
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