Uma apuração inicial do Ministério Público de Santa Catarina identificou 115 candidaturas de servidores públicos com suspeitas de irregularidades nas últimas eleições. Em todos os casos, os candidatos receberam menos de dez votos. O levantamento, realizado a partir de informações solicitadas ao Tribunal Regional Eleitoral do Estado (TRE/SC), é o ponto de partida para que o MP confirme quais candidatos eventualmente concorreram apenas para tirar proveito da licença remunerada.
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Isto porque, conforme previsto por lei, servidores públicos que pretendem concorrer a cargos eletivos têm direito a receber remuneração integral durante o período de licença para campanha, que pode chegar a até seis meses. Mas, caso fique comprovado que o candidato tirou a licença sem se envolver efetivamente na própria campanha ou trabalhou em favor de outras campanhas, o servidor pode responder pelo crime de improbidade administrativa.
—A caracterização da improbidade depende da demonstração do dolo desse servidor. É preciso investigar se havia a intenção de burlar a lei propositalmente para receber sem trabalhar — aponta o promotor de justiça Samuel Dal-Farra Naspolini, coordenador do Centro de Apoio Operacional da Moralidade Administrativa (CMA).
Segundo Naspolini, informações sobre os 115 servidores foram enviadas aos promotores de justiça de pelo menos 80 municípios catarinenses, onde as candidaturas suspeitas foram identificadas. Caberá aos promotores de cada cidade apurar se houve irregularidade.
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Havendo condenação, os responsáveis podem ter de devolver o dinheiro recebido no período, pagar multa proporcional ao valor recebido, além de perder o cargo exercido e os direitos políticos.
Entrevista com Samuel Dal-Farra Naspolini, promotor de justiça
Votação inferior a dez votos foi o principal critério para identificar as candidaturas suspeitas?
—Foi o principal critério, mas infelizmente esta foi uma prática comum também em outras eleições. Havia dificuldade no enfrentamento porque, ao final de contas, a licença é legal e torna-se difícil aferir se o servidor foi apenas mal votado ou a licença foi indevidamente tirada. Agora se conseguiu reunir um consenso entre os órgãos de controle que permitiu ação mais efetiva.
Investimento em campanha serve de comprovação de que o servidor, de fato, se envolveu na eleição?
—É muito relativo. Um servidor que teve movimentação financeira nula ou irrisória e votação baixa acaba reforçando as suspeitas. Mas, ao mesmo tempo, o servidor pode ter feito movimentação considerável e revertido os valores em benefício de outra campanha.
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Caso a improbidade administrativa fique comprovada, qual será a punição?
—Nosso foco é a proteção do patrimônio público, o servidor que eventualmente se valeu de um benefício legal e o desvirtuou. Os responsáveis podem ser condenados a ressarcir ao erário os valores recebidos, pagar multa civil proporcional, além de perder o cargo e direitos políticos. O simples fatos de o MP demonstrar estar atento a essa prática já desestimula eventuais interessados em repeti-la nas próximas eleições.
Os casos suspeitos não revelam a fragilidade da lei que permite a licença remunerada?
—O que fundamenta a lei é impedir que ele se utilize do cargo e dos poderes do cargo para conseguir votos. Então, é uma garantia da sociedade. Mas, na medida em que ele monta uma candidatura “laranja” e sai como cabo eleitoral de outro candidato ou de férias, ele viola a lei.