Combatente da Segunda Guerra Mundial e manezinho de coração, Arnoldo Vequi terminou a última batalha na manhã desta quinta-feira. Ele morreu aos 97 anos por complicações no pulmão. O pracinha que foi enviado para a Itália ao lado dos Aliados em 1944, faleceu em casa, no Bairro Estreito, em Florianópolis.

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Familiares e amigos lembram-se de um marido e pai dedicado e pulso firme, que suportou muitas perdas e nunca fugiu à luta. Como militar, se destacou pela boa mira para atirar. Vequi ainda estava na Guerra naquele dia 14 de março de 1945, quando ficou sabendo por um telegrama codificado que o filho tinha nascido.

No front, o pai emocionado não podia deixar o posto de instrutor de granada e bazuca. Em um ano de combates, esteve em cenários que preferiu nunca contar.

– Ele me disse que a vida dele daria um livro que ele não queria escrever – expõe Salete Formigheri, que cuidou do militar reformado por sete anos.

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O diário daqueles meses, encontrado pelo neto Marcello Vequi, daria uma pista das dificuldades. Nas páginas, o combatente, natural de Itajaí, no Litoral Norte, mencionava a vontade de voltar para perto da mulher, Maria, que ele carinhosamente apelidou de “Bizuca”, e relatava os bombardeios contra inimigos.

Para o Estado, mandava cartões-postais de cachorrinhos para o filho recém-nascido Arnoldo Vequi Filho, enquanto a mulher retornava com as fotos das caixas de leite consumidas pela criança. Arnoldo voltou ao Brasil sem ferimentos e atirar virou um hobby.

– Ele atirava com espingarda de pressão no terreno atrás da casa, depois de reformado – conta o neto, emocionado.

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As piores dores viriam bem depois da Guerra, com a morte do único filho, em 2001, em função de um acidente vascular cerebral. Dois anos depois, ele perderia a companheira, por problemas de saúde. Seguiu em frente, mas nunca aceitou ficar longe de onde vivera com a família, no Bairro Estreito.

– Chamamos ele para morar com a gente, tentaram comprar o terreno, mas ele dizia que iria morrer na casa que tinha construído com a minha avó – conta Marcello.

E assim foi. Dois dias depois da última internação no hospital, o militar reformado que enfrentou o barulho de bazucas e granadas, morreu no silêncio do próprio quarto.

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:::: Adriana Krauss, apresentadora da RBS TV, conheceu Arnoldo Vequi em 2008, durante a produção de um documentário. Ela conta como foi a convivência com o pracinha:

Seu Arnoldo estava muito doente na primeira vez que o visitei, no início da pesquisa, mas teve uma melhora significativa alguns dias depois e pôde gravar o documentário. Foi uma novidade maravilhosa.

Aos 93 anos e extremamente lúcido, porém com muitas dificuldades de caminhar, Seu Arnoldo me atendeu em casa, na Rua Santos Saraiva, no bairro Estreito. Morava sozinho, ou melhor, com uma cuidadora que esteve com ele até a morte no dia de hoje.

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No primeiro encontro, Seu Arnolvo mostrou os cartões postais e as fotos que enviava para a mulher com dizeres sobre a saúde e recados para o filho recém-nascido. Lembro que insisti para procurarmos as cartas, mas com dores, ele disse que trataria de encontrá-las com calma. Respeitei o pedido e três dias depois recebi um telefonema, dele mesmo, informando que estava com os telegramas esperando por mim.

Imagine a minha euforia. No dia seguinte, eu e o cinegrafista já estávamos de volta à casa de seu Arnoldo para gravar tudo. O material dele contribuiu muito, principalmente para mostrar os códigos usados nos telegramas. Entre tantos documentos, ele ainda apresentou um exemplar original da cartilha do Ministério da Guerra com as orientações sobre conteúdo e formato das correspondências.

Pela sua grandeza e destruição, a Segunda Guerra sempre prendeu minha atenção. Desde a infância eu me perguntava, como tudo isso aconteceu, por quais motivos? Eu não me conformava e ainda hoje leio muito a respeito. Por isso, fazer esse documentário foi uma experiência fantástica.

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As horas e horas que conversei com seu Arnoldo jamais serão esquecidas. E apesar da fama de durão, também não vou esquecer sua simpatia. Um dia ele perguntou do meu aniversário. Semanas depois fui visitá-lo para falar do andamento do vídeo e lá estava ele com uma mesa de café – toda especial – com bolo e até presente. Fiquei sem palavras…