A dona de casa Angela Maria Silveira, de 37 anos, esteve na semana passada no postinho de saúde de Canasvieiras, no norte da Ilha, com a filha mais nova, de cinco anos. Acostumada a procurar o espaço de saúde frequentemente, naquele dia não encontrou um medicamento bastante comum e recomendado por médicos para tratar a bronquite da menina: o Sorine.

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— Não tinha — disse ela à reportagem da Hora ao sair da unidade de saúde.

E não é só isso. Seu filho mais velho, de nove anos, é autista. Há seis meses ela não consegue retirar os medicamentos recomendados pelos médicos à criança, porque eles não estão sendo mais encontrados nos postinhos.

— Há quase dois meses, eles falaram que em 30 dias iam finalmente resolver, que fariam uma licitação, mas até agora nada. Somente com um dos medicamentos, a Sertralina, estou gastando R$ 300 por mês. Sem contar todo o resto. Não é só medicamento, também não conseguimos mais consultas com psicólogos e outros médicos, e assim vai aumentando nosso gasto — contou a mãe.

A Sertralina é um ansiolítico muito usado por pessoas com autismo. É um antidepressivo, também usado em tratamentos para controlar a ansiedade. A Risperidona, que Angela também procura, usado para transtornos psicóticos e bipolares, também está em falta.

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A dona de casa do norte da Ilha não foi a única que sentiu falta de medicamentos nos postos de saúde de Florianópolis. A Hora recebeu ligações de leitores que preferiram não se identificar — por medo de não receberem o remédio depois — reclamando da falta do medicamento Omeprazol, usado para problemas gástricos.

— Minha filha precisa tomar o Omeprazol e sempre que procura, dizem que não tem. E que não tem previsão de chegar — lamenta uma senhora que procurou na semana passada o posto de saúde da Vargem Grande.

No posto da Trindade, há um cartaz do lado do balcão da farmácia com uma lista de medicamentos que estão em falta. Eram 11 na última semana, entre eles Anlodipino, para tratar pressão e problemas do coração; sulfato ferroso, para anemias; e Loratadina, para alergias, como rinite; e até medicamentos usados para tratar Parkinson.

Lista encontrada no posto da Trindade
Lista encontrada no posto da Trindade (Foto: Caroline Stinghen / Hora de Santa Catarina)

Investimento longe do ideal

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O vice-presidente do Conselho Municipal de Saúde de Florianópolis, Marcos Pinar, explicou que a entidade tem conhecimento da falta de medicamentos em unidades de saúde municipais. Os investimentos na área de saúde em geral, segundo ele, estão deixando muito a desejar.

— Há cinco anos, a prefeitura destinava 21% do orçamento para Saúde. Em 2016, foram investidos apenas 16,64%. Com estes cortes, começaram a surgir mais filas de espera em consultas, exames, e falta de medicamentos — explicou Marcos.

Para 2017, informou o vice-presidente, a garantia — confirmada em lei — é de um investimento de 19% do total do orçamento. Nos primeiros quatro meses, informou Marcos, a prefeitura de Florianópolis investiu apenas 11,74% do orçamento em saúde.

— Se aplicar até dezembro um total de 19% no ano, não estará ilegal. Mas o nosso desejo é que a meta seja aplicada em todos os meses, ou seja, 19% do orçamento em todos os meses, e não em um mês menos e outro mais —comentou Marcos.

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O real desejo do Conselho, para que a máquina da Saúde consiga andar, é de uma aplicação de 23% de investimentos ao ano.

— Nós acreditamos que com este número, a cidade consiga manter todas as suas estruturas e demandas. Não investindo, apenas mantendo o que já tem. Claro que o ideal mesmo, seria até 25% — avalia Marcos.

Ainda na semana passada, a prefeitura de Florianópolis anunciou um mutirão para diminuir filas para exames. Serão investidos R$ 5 milhões.

O que diz a Secretaria de Saúde

A prefeitura de Florianópolis confirmou à Hora que há uma lista de medicamentos que não estão sendo distribuídos no momento porque estão faltando no estoque. No total, são 14. O restante está com estoque normal no almoxarifado, “logo, se eventualmente uma ou outra unidade possui outras faltas (além destas da tabela), as mesmas são pontuais e devem ser brevemente resolvidas com a chegada dos pedidos”, informou a Secretaria de Saúde, em nota.

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Sobre os medicamentos usados por pessoas autistas, a Secretaria de Saúde afirmou que já normalizou o estoque de Sertralina 50mg (antidepressivo) na Central de Abastecimento Farmacêutico, e este item não está mais em falta. Quanto à Risperidona, o município nunca comprou este item e ele não é distribuído gratuitamente na rede municipal. Ele deve ser solicitado na Farmácia Escola, de responsabilidade da Secretaria de Estado da Saúde.

Situação de cada medicamento em falta

Anlodipino 10 mg: A empresa que fornece foi notificada duas vezes, não respondeu defesa, e o caso foi encaminhado para assessoria jurídica da prefeitura. Sem previsão para retorno de entrega.

Cálcio 500 mg: Segunda licitação está em fase de finalização. Na primeira não houve fornecedores.

Dimenidrinato: Segunda licitação está em fase de finalização. Na primeira não houve fornecedores.

Espironolactona: Empresa foi notificada duas vezes, não respondeu defesa, e o caso também foi encaminhado para assessoria jurídica. Sem previsão de retorno.

Estrogênio conjugado: Segunda licitação está em fase de finalização. Na primeira não houve fornecedores.

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Furosemida: Empresa foi notificada duas vezes, não respondeu defesa, encaminhado para assessoria jurídica. Sem previsão.

Hidróxido de alumínio: Empresa entregou com especificação errada, e solicitou desclassificação do item.

Levodopa+Carbidopa: Segunda licitação está em fase de finalização. Na primeira não houve fornecedores.

Loratadina: Aguardando entrega por parte da empresa.

Medroxiprog. 10 Mg: Segunda licitação está em fase de finalização. Na primeira não houve fornecedores.

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Omeprazol: Empresa entregou somente 300 mil cápsulas, que estão sendo distribuídas na rede. Irá entregar aos poucos devido à baixa produção pela Indústria Hipolabor. Sem previsão de normalização.

Permetrina: Aguardando liberação de novo empenho.

Sulfato ferroso 40 mg: Empresa foi notificada duas vezes, não respondeu defesa, encaminhado para assessoria jurídica. Sem previsão.

Varfarina: Empresa foi notificada duas vezes, não respondeu defesa, encaminhado para assessoria jurídica. Sem previsão.

O que fazer

Ao dar de cara com um “não” numa farmácia de algum postinho, você pode fazer uma reclamação para a ouvidoria da prefeitura, para deixar registrado, pelo número (48) 3251-6043 ou pelo site www.pmf.sc.gov.br/ouvidoria. Pode ainda procurar um Conselho de Saúde do seu bairro para avisar sobre o problema. No site do Conselho Municipal, você encontra os telefones e endereços: clic.sc/conselhomunicipaldesaude.

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