Moradores e comerciantes de Canasvieiras, no Norte da Ilha, se reuniram no fim da tarde desta terça-feira para manifestar sua indignação e preocupação com alguns moradores de rua que estariam fazendo pequenos furtos, mendigando e aumentando a insegurança.
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Um problema que pode aumentar no Verão, já que prejudica a principal atividade econômica do bairro: o turismo. A organizadora da manifestação, Luciana Silva, explica que a “gota d’água” para fazer a passeata foi o feriado de 15 de novembro, onde vários carros foram roubados e algumas lojas registraram furtos.
– Está circulando no Youtube um vídeo de moradores de rua fazendo sexo no meio da rua. Duas semanas atrás, um deles matou o outro. Será que estão esperando um turista morrer para fazer algo? – questiona Luciana.
O dormitório dos mendigos era a Escola do Mar, que fica em frente à praia, mas o local foi reativado pela prefeitura. Agora, segundo o presidente do Conselho de Segurança (Conseg) do bairro, Carlos Maria Hennrichs, eles dormem perto de um supermercado normalmente durante a manhã e no restante do tempo, perambulam no entorno da Avenida das Nações.
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– Há três anos, não tinha ninguém para cuidar do seu carro, agora vêm logo três pedir dinheiro. Eles ameaçam, fazem pressão – conta Carlos.
Não bastasse ter flanelinhas, quem passa por lá têm de enfrentar a mendigagem nos restaurantes à beira-mar. No estabelecimento da dona Aldanir Rosa um garçom teve que usar de violência para retirar um morador de rua que importunava os clientes, pedindo comida.
Ela conta que sempre tiveram sem teto, mas este ano está pior. Agora a senhora dorme no restaurante para chamar a polícia sempre que aparece alguém tentando se abrigar na varanda.
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– A gente dá uma marmita para eles e pede para que não fiquem na frente do comércio. É ruim para os turistas, por causa do mau-cheiro que eles têm – conta Aldanir.
Na delegacia do bairro, um agente da Polícia Civil que prefere não se identificar, diz que não existem Boletins de Ocorrência contra moradores de rua.
– Houve apenas um caso de um rapaz que perturbava demais e que conseguimos internar no Instituto de Psiquiatria, em São José – conta.
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O agente afirma que os moradores de rua costumam “beber e ficar no canto deles” e que apenas poucos furtos devem ser cometidos por esta população. Segundo o policial civil, a maior parte de roubos acontecem por “profissionais do crime” que vêm de comunidades próximas.
– O que incomoda a comunidade é o fato dos moradores de rua existirem.
Segundo o agente, a polícia fica “imobilizada” para agir contra estas pessoas, já que não há Boletins de Ocorrência. Carlos afirma que os comerciantes foram orientados pelo delegado local a registrarem os crimes, mas ninguém faz isso:
– Todo mundo teria que fechar a loja diariamente para fazer um boletim – conta Carlos.
Remoção é desejo dos comerciantes
O presidente do Conseg de Canasvieiras, Carlos Maria Hennrichs, afirma que a população deseja a redução de mendigos nas ruas de Canasvieiras. Isto só pode ser feito através da abordagem de um assistente social, com as opções de aceitarem ir para abrigos ou voltarem às suas cidades de origem.
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O secretário municipal de Assistência Social, Alessandro Abreu, explica que a concordância dos andarilhos é a maior dificuldade.
– O pessoal que vem de fora não quer fazer parte da nossa rede de assistência à moradores de rua. Eles vêm somente para o verão, onde as possibilidades de renda são maiores, depois saem – explica o secretário.
Alessandro explica que as abordagens estão sendo feitas de forma mais constante. Outra ação é a identificação de imóveis que estejam servindo de abrigo para moradores de rua. Os proprietários destes locais recebem uma notificação da prefeitura pedindo a reforma ou a demolição do imóvel.
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Carlos discorda das explicações do secretário de Assistência Social, afirmando que, mesmo no inverno, a situação está fora do comum.
O que acontece em Canasvieiras?
Segundo o secretário de assistência social, Alessandro Abreu, o balneário mais movimentado de Florianópolis é “disparado” a praia com mais moradores de rua.
– Todo verão Florianópolis recebe cerca de 200 andarilhos, sendo que a maioria vai para Canasvieiras. A grande quantidade de imóveis fechados e abandonados seria um dos motivos para a preferência dos andarilhos àquela praia, afirma a coordenadora interina do Centro Pop – que recolhe moradores de rua – Marcela Soares Pereira.
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Para Carlos Maria Hennrichs, o principal motivo de ter tanto andarilho é que tem muita gente que os ajudam.
– Tem pessoal que dá roupa pra eles, outros dão comida, até por pena, mas temos que conscientizar que não dá para fazer isso. Aqui eles têm casa, comida e roupa lavada, por isso retornam.
Características dos andarilho de Canasvieiras
A coordenadora interina do Centro Pop, Marcela Soares Pereira, explica que o perfil do andarilho que vai até Canasvieiras é de estrangeiros que têm como renda a mendicância, com hábitos noturnos – normalmente se recolhendo pela manhã.
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Ela conta que existem casos de violência entre a população de rua, mas que, contra a comunidade, acontecem apenas ameaças, sem agressões físicas. A maioria vêm dos estados vizinhos, São Paulo e interior de Santa Catarina apenas para trabalhar na temporada.
– Quando eles percebem que não é tão fácil de conseguir emprego, ficam na rua – conta Marcela.
Ponto de “descarte” de andarilhos
Entre todos os entrevistados para essa reportagem, uma história foi recorrente: uma van da prefeitura de Balneário Camboriú teria deixado 15 mendigos em Canasvieiras. O secretário de assistência social, Alessandro Abreu, afirma que conhece a história e diz que vai investigar a denúncia.
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Já a coordenadora do Centro Pop, Marcela Soares Pereira, afirma que nenhum dos moradores de rua abordados confirmou a história.
– Pode ser um acordo entre eles, ou a história realmente não aconteceu.
Entrevista com um morador de rua
O mineiro Oesley Cordeiro Leão, de 35 anos, é conhecido nas ruas por “Careca”. Vive há 20 anos como andarilho e se descreve como um “turista esforçado”. Para viver, recolhe material reciclável que coloca em sua bicicleta e vende junto com seus amigos.
Hora: Onde você mora?
Oesley: Na rua. Mas se quer saber onde durmo, é na frente de uma lojinha perto do mercado. Depois de dormir a gente ajeita e deixa tudo limpo.
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Hora: Por que veio para Canasvieiras?
Oesley: Eu vim da Bahia para trabalhar na colheita da maçã, na Serra. Passei aqui e fiquei maravilhado. O lugar é lindo e o pessoal é gente boa. Vim procurar trabalho, mas perdi os documentos – já fiz B.O. – agora estou aqui catando latinha.
Hora: Como você foi parar nas ruas?
Oesley: Uma vez fumei duas motos em drogas, tive vários problemas, pensei até em me suicidar e resolvi ir a pé de Poços de Caldas até Brasília. Desde então não larguei a rua. Na rua é igual qualquer lugar, tem gente boa e gente ruim. O pessoal não acredita, mas tem andarilho que é bom.
Hora: Não pensa em sair?
Oesley: Meu irmão quer que eu saia, mas eu fico parado dois ou três meses e enjoo. Claro que se eu tivesse casa, seria bom. Eu não paro em lugar nenhum, e acho que não vou conseguir sair daqui.
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Hora: O que você mais deseja aqui?
Oesley: No momento queria que fizessem um banheiro para a gente se lavar.