De um lado, a mina. Do outro, uma parte dos moradores. Vizinhos antigos, a comunidade do bairro Rio Tavares, no sul da Ilha, e a Pedrita Planejamento e Construção, que desde 1973 convivem e crescem na mesma região de Florianópolis, enfrentam novos dias de discórdia. Enquanto a empresa deseja ampliar a área de lavra da pedreira, para explorar granito e saibro pelas próximas duas décadas até esgotar a vida útil da mina, pessoas que moram nas redondezas são contra o crescimento do empreendimento e reclamam de rachaduras nas casas, incidência de problemas respiratórios, danos ao meio ambiente, além da poeira, vibração no solo e estrondos provocados pelas explosões na lavra.
Continua depois da publicidade
Para marcar posição, os moradores promoveram um protesto, na manhã desta sexta-feira, contra a intenção da Pedrita, única pedreira dentro da Ilha de Santa Catarina, em expandir a atuação na região numa área de 8,3 hectares onde está o polígono de ampliação da lavra e é considerado como Área Diretamente Afetada. Cerca de 150 pessoas, com cartazes e faixas, protestaram a partir das 10h pedindo que a ampliação da mina não seja feita e que a empresa deixe o local onde está há décadas.
— Nós temos uma alta incidência de problemas respiratórios em pessoas que moram na região, sem falar das explosões, a cada 15 dias, que tremem o solo e provocam rachaduras nas casas. Além disso, na frente da Pedrita, estão construindo uma creche. Eles já estão há mais de 40 anos fazendo isso, e ainda querem ficar mais 20 — reclama o professor João Bourbonnais, 58 anos, do grupo SOS Rio Tavares.
Com licenças ambientais renovadas para exploração da mina até 2021, a Pedrita contratou uma empresa que produziu um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) para pleitear a concessão de licenças à ampliação. O documento, com 471 páginas, está em análise no Instituto do Meio Ambiente (INA), antiga Fundação do Meio Ambiente (Fatma), que informou a reportagem não haver data definida para conclusão da avaliação sobre a viabilidade do pedido, pois trata-se de projeto “complexo”.
Continua depois da publicidade
Empreendimento divide opiniões
Apesar do protesto, parcela expressiva dos moradores, em especial nativos do Rio Tavares, considera a Pedrita essencial na história e desenvolvimento do bairro. Fazendo exercícios ao lado dos manifestantes, a aposentada Laurete Olindina Assunção, 61 anos, afirmava “que se não fosse a Pedrita o Rio Tavares não seria o que é” e perguntava “por que essas pessoas não fazem protesto quando prendem traficantes aqui”.
— Eu sou nativa, nasci aqui, trabalhei 22 anos na Pedrita, meu pai se aposentou na Pedrita. A Pedrita tem que seguir aqui, como sempre foi. Quem não gosta, que vá embora — disse Laurete, que não sabia dos planos da empresa em ampliar a área de lavra.
Morador do Pico da Cruz, Adriano Mello, 50 anos, que passeava com os filhos perto do protesto, fez uma observação sobre o assunto:
Continua depois da publicidade
— As casas aqui do bairro estão cheias de britas e materiais para obras nos quintais. Enquanto as pessoas seguirem construindo tanto, fica difícil a empresa sair daqui, porque estão fortalecendo o negócio deles — aponta.
No Estudo de Impacto Ambiental (EIA) feito pela Pedrita foram ouvidas 43 pessoas que moram na região. Após os questionários aplicados, o estudo conclui três pontos: “1) Grande parcela da população não se posiciona em relação à atividade mineira, mostrando indiferença. Este grupo inclui moradores natos, de origem açoriana e, também, parcela significativa de migrantes; 2) Os moradores mais antigos e tradicionais guardam lembranças positivas da pedreira, pela geração de empregos, apoio no desenvolvimento do bairro, ou pelo vínculo da imagem da pedreira ao local; 3) Uma parcela considerável da população, coincidente em sua ampla maioria com os migrantes, considera a pedreira inadequada para o Rio Tavares, porque ela não condiz com as perspectivas de um turista”.
Geração de emprego e logística como justificativas
Entre as justificativas da empresa para a expansão, além da geração de empregos, está uma questão mercadológica, já que a pedreira entende que a desativação no Rio Tavares encareceria os insumos da construção civil, entre eles a brita, cujas despesas com transporte eventualmente feito de fora da Ilha onerariam em 60% o preço unitário.
Continua depois da publicidade
“Caso a empresa venha a paralisar suas operações na localidade de Rio Tavares por exaustão das reservas atualmente licenciadas, todo o material pétreo usado como agregado na construção civil terá que cruzar a Ponte Governador Pedro Ivo Campos, única travessia no sentido continente-ilha, dificultando o trânsito que já é caótico na cidade. Considerando a produção calculada para a mina o transporte dos agregados provenientes do continente que teriam que entrar na ilha representaria uma fila adicional de 40 a 50 km/mês, considerando a utilização de caminhões com capacidade média de 20 toneladas”, diz um trecho do EIA apresentado no órgão ambiental.
Esse argumento, no entanto, é questionado pelo escritor e ecologista Gert Schinke. Segundo ele, muitas outras empresas que atuavam na Ilha foram para o Continente e “nem por isso os preços subiram”.
— Por que eles não colocaram no estudo ambiental o custo que nós, contribuintes, pagamos para remendar o asfalto da SC-406 destruído pelas jamantas carregadas de brita? —questiona, para dizer que o valor das indenizações ambientais para moradores afetados, de R$ 1,5 mil, “é muito baixo”.
Continua depois da publicidade
A reportagem entrou em contato com a direção da Pedrita na quinta-feira, e seguiu a orientação de enviar as perguntas por e-mail, que só serão respondidas na segunda-feira. O EIA apresenta as principais justificativas técnicas para o empreendimento:
“De acordo com os estudos e análises de mercado realizado pela Pedrita para seus títulos minerários, verificou-se que existem reservas minerais suficientes e um grande potencial de mercado que justificam a continuidade da exploração desta pedreira na Ilha de Santa Catarina, devido à crescente demanda por produção de agregados para a construção civil da região. A Pedrita já possui a infraestrutura e o desenvolvimento da lavra implantado na área deste Estudo, os equipamentos existentes são devidamente mantidos e continuamente modernizados, a equipe é treinada e tem garantido resultados econômicos e sociais satisfatórios. Todos estes fatores são importantes mitigadores de impactos ambientais ao se comparar a expansão da pedreira existente com a abertura de um novo empreendimento voltado a produção de agregados. Por outro lado, a continuidade das atividades produtivas do empreendimento possibilita o estabelecimento de concorrência saudável na comercialização de agregados, trazendo benefícios ao mercado consumidor, bem como a manutenção e geração de empregos na a região metropolitana de Florianópolis, principalmente no que diz respeito à localidade de Rio Tavares e arredores, no município de Florianópolis, aumento da arrecadação de impostos para a União, para o Estado e Município, e apreciável contribuição para o desenvolvimento regional”.
Caso seja aprovada a ampliação da mina, em uma reserva lavrável calculada em 9.858.077 toneladas de granito, considerando a produção mensal de 35 mil toneladas e o incremento anual de 2,0%, a vida útil da mina estaria estabelecida em 19,4 anos. O demonstrativo destes cálculos, com as produções de minério ano a ano está apresentado no EIA apresentado na IMA. Considerando a reserva mineral de saibro de 586.500 metros cúbicos ou 938.400 toneladas, com a produção média de 5 mil toneladas/mês, a vida útil dessa substância será de 15,6 anos.
Continua depois da publicidade