Duas mulheres com crianças no colo a caminho da creche descem um barranco apoiando-se para não escorregar e atravessam a pé o ribeirão que corta o bairro Velha Grande. Elas equilibram-se entre as pedras do leito, ignorando os riscos de acidente ou de possível contaminação por doenças que circulam pela água. Na volta para casa depois da aula, um grupo de estudantes retira os tênis, dobra as calças e segue pelo mesmo trajeto. Os menores não conseguem evitar que a água molhe parte do uniforme. Além da travessia, eles ainda têm de passar por um caminho aberto no meio do matagal.

Continua depois da publicidade

As cenas se repetem desde o início de fevereiro, quando a prefeitura retirou a ponte pênsil sobre o ribeirão com o argumento de que os cabos de aço estavam corroídos e poderiam oferecer riscos aos moradores, que precisam chegar à Rua Franz Mueller para ir à escola, posto de saúde e ao ponto de ônibus. Aqueles que se arriscam na travessia do ribeirão alegam que sem a passarela o trajeto aumenta em cerca de um quilômetro.

Uma das filhas do servente de pedreiro Reinaldo Lopes caiu quando tentava descer a encosta para chegar ao ribeirão. Com seis filhos na Escola Básica Conselheiro Mafra e no Caic Dr. Arão Rebelo, Lopes cavou alguns degraus no barranco para facilitar a descida. O servente sabe dos perigos que ele e os filhos, com idades entre dois e 11 anos, enfrentam ao fazer a travessia, mas acha que o problema é menor se comparado aos riscos de transitar à beira da estrada:

– É perigoso, mas corro menos risco do que se for pela calçada. Na rua também quase não tem calçada. Então quem tem carro pode dar a volta. Digo para os meus filhos só passarem pelo rio quando estiver baixo. Às vezes molha o tênis, a roupa, e a professora reclama.

Crianças chegavam à creche molhadas

Continua depois da publicidade

No Caic Dr. Arão Rebelo, a diretora Carla Dioriane Benvenutti diz que alunos chegavam com os uniformes molhados assim que a ponte foi retirada, no início de fevereiro. Mas depois de uma conversa com os pais e as crianças o problema foi resolvido, ainda que muitos deles reclamem da distância maior que têm de percorrer até chegar à escola. A direção levou as queixas à Secretaria de Educação e a resposta, segundo Carla, foi de que a reconstrução seria agilizada. A direção da escola Conselheiro Mafra, ao lado do Caic, disse desconhecer a informação de que crianças passam pelo ribeirão para ir às aulas.

Estudantes faltam aula porque trajeto até o ônibus ficou maior

O filho de Narcisia da Rosa Mandel ficou cerca de um mês sem ir para as aulas na Apae. Anton Tiago Mandel, 22 anos, vive em uma cadeira de rodas e o seu deslocamento até a parada de ônibus na Rua Franz Mueller ficou mais complicado com a retirada da ponte. Na semana passada Anton voltou às aulas, mas precisa ser levado na cadeira de rodas pela mãe por um trajeto de quase um quilômetro da casa até o ônibus. Menos quando chove, porque nesse caso Narcisia liga para a Apae e avisa que o filho não poderá ir.

– Com a ponte já era difícil. Agora está bem complicado. Perto do meio-dia, quando o meu filho vai para a escola, tem bastante movimento – conta.

Claudia Júlio sofre com a mesma situação. Quase vizinha ao local onde antes havia a ponte, na Rua Germano Kruger, ela também tem um filho que estuda na Apae e sempre o acompanha até a parada de ônibus. Se antes bastava atravessar a passarela, agora os dois têm de caminhar cerca de 15 minutos a mais. Por causa disso, em dias de chuva o rapaz de 27 anos fica sem condições de ir à aula.

Continua depois da publicidade

Nova ponte está prevista para ficar pronta em maio

O secretário de Serviços Urbanos, Rafael Jansen, responsável pela construção da nova ponte, espera que a obra esteja concluída até o final de maio. O investimento ficará entre R$ 70 mil e R$ 100 mil. Na semana passada foi concluído o termo de referência, documento que reúne as especificações da estrutura a ser erguida e é usado como base para a licitação, cuja empresa ganhadora deve ser conhecida em 30 dias. Em seguida ela tem cerca de 30 dias para a execução.

De acordo com Jansen, durante vistorias os técnicos verificaram que os cabos de aço estavam sofrendo corrosão e, por segurança, decidiram retirar a ponte. A ideia inicial era construir uma passarela igual à anterior, mas após discussões entendeu-se que uma ponte em metal sairia mais em conta pelo baixo custo de manutenção. A nova estrutura terá 25 metros de comprimento.

Enquanto a obra não é concluída, Jansen afirma não ver motivos para os moradores atravessarem o ribeirão, apesar de a retirada da estrutura ter prolongado o trajeto. O diretor de Vigilância em Saúde, Eduardo Weise, diz que apenas com exame laboratorial é possível saber se o ribeirão está poluído e, desta forma, capaz de transmitir doenças como hepatite A e leptospirose. Em todo caso, por prevenção ele aconselha que os moradores evitem circular pela água. Weise compara a situação à dos pedestres no trânsito: se há uma faixa de segurança 100 metros adiante, não há razão para se arriscar.

– Não há motivo para brincar com a saúde por acreditar que é mais rápido passar pelo ribeirão. É temerário. O risco é fácil de ser evitado – defende.

Continua depois da publicidade