Quando a chuva começa a cair pesada, Otília Jamorsky Augusto esquece a noite de sono. Dormindo com um olho aberto e outro fechado, como ela mesma define, os dias de grande precipitação são encarados com preocupação. De sua casa, no meio da Rua Irregular 097 (RI-097), na localidade de Tifa da Mosca, ela vê a água descer como um rio sobre as lajotas que cobrem a rua íngreme. Há dez anos no local, ela lembra das semanas difíceis após os deslizamentos de 2008, porém, jamais deixou a sua residência.
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– Eu fico com medo, mas não tenho para onde ir. Sou aposentada, ganho um salário mínimo e não tem aluguel barato na cidade. E não temos como começar tudo de novo.
A fala de Otília exprime a de outros moradores e se repete na cidade. Apesar da particularidade de cada local, as semelhanças são muitas. Comprados a preços baixos, apenas com contratos de gaveta, os terrenos são uma possibilidade de concretização do sonho da casa própria. Estão, porém, em loteamentos irregulares – são 143 hoje na cidade. Se alguns necessitam apenas da regulamentação documental, trabalho que está sendo desenvolvido pela Prefeitura em alguns pontos, é possível que outros jamais sejam regularizados. Jaraguá do Sul conta hoje com 19 áreas de risco e 14 pontos de risco. Nesses locais, a regularização não será permitida, como é o caso da RI-097.
Toda a rua foi classificada pela Defesa Civil como área de exclusão: o risco ali é mais do que alto e não há obras de contenção que possam eliminar os perigos. Segundo o secretário Marcelo Prochnow, o ideal seria que todos os moradores deixassem o local, e as casas fossem demolidas. Ele mesmo admite, porém, que essa é uma possibilidade restrita. Enquanto alguns moradores apenas ignoram o risco, outros sequer admitem que viver no morro pode ser perigoso. E para quem investiu em um terreno e construiu com suor a própria casa, abandonar as moradias não é uma opção.
À espera de uma indenização para deixar os lares
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Há quatro anos, o casal Edmir Rossdeutcher e Gloria Camargo dos Santos decidiu sair do aluguel. Na procura por uma casa, deparou-se com a RI-097. Ali, a casa e o terreno custavam cerca de R$ 45 mil. Em outros locais, em regiões planas, o valor era sempre acima dos R$ 100 mil. Para eles, deixar o investimento de tantos anos não é uma opção.
Otília Jamorsky Augusto é de mesma opinião. Apoiando-se na força de Deus nas épocas de chuvas e temporais, ela ignora o medo e diz que só sairá se a casa for indenizada.
– Há alguns anos, disseram que teríamos que sair, abandonar tudo e assumir uma dívida com o Minha Casa, Minha Vida. Não dá para sairmos sem nada, precisamos ao menos de uma indenização .
Seu vizinho Luiz Carlos Maria vive há 24 anos no morro e sente o perigo. Nas chuvas deste ano, ele deixou a casa e passou quatro dias abrigado na residência de um parente. Já o vice presidente da associação de moradores do local, Carlos Henrique Nilsen, nunca deixou a casa e afirma não sentir medo. Ele é um dos que lutam para que a área seja regularizada: lá, moradores têm contratos informais e não a escritura que garante a posse do terreno.
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O desejo de Nilsen e de boa parte do moradores é simplesmente legalizar o local e não abandoná-lo. Sem concordância entre Prefeitura e moradores, sem possibilidade de regulamentar os terrenos ou criar obras que minimizem os riscos, a RI-097 deve ser mais uma das vias que continuarão com futuro incerto.