O carro é o cigarro do futuro – definiu recentemente Jaime Lerner, arquiteto e urbanista, ex-prefeito de Curitiba e pai do BRT (ônibus de trânsito rápido) no mundo, em um fórum sobre mobilidade em São Paulo.

Continua depois da publicidade

A frase do especialista é uma das que melhor resume os desafios da mobilidade urbana, atualmente, em qualquer canto do planeta. O carro é como o cigarro porque nasce como um bem associado à liberdade, ao status social, à riqueza. Quando popularizado, porém, vira a principal dor-de-cabeça do trânsito, a razão dos congestionamentos, sem contar as consequências à saúde, da poluição aos acidentes.

E as formas de enfrentar o problema mundo afora são parecidas com as do combate ao tabaco: campanhas sistemáticas para incutir a noção de que o cigarro (o carro) faz mal à saúde (à cidade), depois, medidas de restrição ou proibição, como não poder fumar (não trafegar) em todos os lugares.

É claro que o carro tem trazido muito mais benefícios que o cigarro à sociedade. Ele é um aliado na expansão da prestação de serviços no País, nas relações comerciais, na interação social, no lazer. Não à toa, é tão impopular entre parte da sociedade – e com elevado custo político aos governos – implantar medidas como pedágio urbano, rodízio de placas, implantação de corredores de ônibus e ciclovias.

Neste sentido, discutir mobilidade urbana em Joinville, como em qualquer outra cidade, passa mais pela necessidade de uma espécie de pacto social, um acordo para se saber o que a cidade quer para o futuro, do que as tradicionais discussões pontuais, de dizer que a cidade não funciona porque tal via não é duplicada, porque não há elevados, porque só se faz binários e não “grandes obras”, discurso que São Paulo mostrou estar superado com a demolição de viadutos, por exemplo.

Continua depois da publicidade

Conscientização é uma das saídas

O que dá resultado, como garantem estudiosos e como demonstram alguns exemplos no mundo, não é uma promessa isolada de milagre, mas avanços graduais, planejados e sustentados, em diversas frentes. Uma delas é esta conscientização, por meio de campanhas, publicidade etc., sobre o uso do carro ser o fator para os congestionamentos. As demais são bastante conhecidas. Investimentos em ônibus, seja por meio da implantação de corredores exclusivos, de veículos mais confortáveis, custo da passagem e, principalmente, integração e capilarização do sistema. Implantação de uma rede de ciclovias, bicicletários e incentivo ao uso da bicicleta.

A reorganização da vida social também conta, como flexibilidade de horários de entrada e saída de funcionários em empresas – que causam não só picos de engarrafamentos, mas também sobrecarga em serviços como supermercados.

Por fim – embora isto talvez seja o início de tudo – um planejamento urbano que evite grandes deslocamentos de massa de uma região a outra da cidade e permita as pessoas viverem, trabalharem, usarem comércios e serviços mais perto de casa.

Ciclovias avançaram em Joinville

Joinville não conta com um sistema de tráfego informatizado como o de São Paulo, capaz de monitorar recordes de congestionamentos por dia, por exemplo. Mas tem alguns indicadores e iniciativas que ajudam a entender um pouco da questão viária e de mobilidade na cidade. Pesquisa de origem-destino em 2011, por exemplo, constatou que em torno de 65% da população usa deslocamento motorizado, a maioria carros e motos, e 35% são pedestres e ciclistas, com uma boa parcela de gente que anda a pé mesmo. As ciclovias também avançaram de meros 10 km há dez anos para mais de 100 km atualmente, com perspectiva de avanço. A maior reclamação ainda é pelo fato de não estarem integradas e de várias serem ciclofaixas sem segurança ao ciclista. Bicicletários também estão em fase de implantação.

Continua depois da publicidade

O sistema de ônibus, por sua vez, tem perdido usuários nas últimas décadas para o carro e a moto, o que impacta na tarifa. Mas vem ganhando corredores exclusivos, desde 2008, que hoje tem diminuído a demora nestes deslocamentos.

Teste feito por “A Notícia” neste ano, por outro lado, mostrou que ficou 52% mais lento andar em horário de pico, entre o terminal Norte e o Terminal Sul de Joinville (trajeto que corta algumas das principais vias da cidade), em um período de quatro anos. Se em 2009 o trajeto foi feito em 19 minutos e 25 segundos, neste ano levou 30 minutos, considerando-se deslocamentos de carro, moto, ônibus e bicicleta. Detalhe que todos demoraram mais.

Outra conta negativa é que quase metade das ruas da cidade ainda é de chão batido. Obras viárias de maior porte, que prometem ao menos disciplinar melhor o trânsito, como a duplicação da avenida Santos Dumont ou o binário do Vila Nova, também têm enfrentado todo tipo de burocracia e demora e algumas, impedidas pelo alto custo de desapropriações ou falta de dinheiro mesmo, permanecem sem previsão.