Depois de 11 anos com Rodrigo Marchetti à frente dos trabalhos da Polícia Civil no Vale do Itajaí, a Delegacia Regional de Blumenau passou por uma troca de comando. Egídio Maciel Ferrari, 36 anos, assumiu nesta quarta-feira o comando da instituição. Ele é natural de Blumenau, formado em Direito pela Furb e está desde 2011 na Polícia Civil. Atuou por um ano e dois meses como delegado de Curitibanos e chegou a recusar o convite para a delegacia regional de lá para assumir uma unidade em Gaspar, onde atuou por quatro anos e meio. Em dezembro de 2016, foi convidado a assumir a Diretoria de Investigação Criminal (DIC) de Blumenau.
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No período em Gaspar e Blumenau, ganhou notoriedade por operações, investigações e prisões que envolviam organizações criminosas, tráfico de drogas, roubos a residências e de carros de luxo na região. No primeiro dia de trabalho, Egídio teve uma reunião para definir detalhes da segurança da Oktoberfest, que começa em 3 de outubro. Em entrevista ao Santa, o delegado falou dos primeiros desafios e deu ênfase especial ao fortalecimento das investigações, das delegacias e da luta para diminuir os indicadores da violência contra a mulher.
O que você considera ser o principal desafio como delegado regional?
O primeiro desafio é entender tudo. Conhecer todas as pessoas. A regional pega Ilhota, que é da Comarca de Gaspar, depois Pomerode, Indaial, Timbó e Ascurra. Dentro dessas comarcas tem ainda os municípios de Rodeio, Apiúna, Doutor Pedrinho e Rio dos Cedros. Vou atuar supervisionando e coordenando todos os trabalhos da Polícia Civil em toda a região. Não conheço todos os municípios, preciso entender a estrutura, mas a minha primeira bandeira é investigação. Sou um delegado de investigação. Fiz isso em Curitibanos, em Gaspar e também em Blumenau. O trabalho da Polícia Civil é investigar, então quando a gente fala em fortalecer é trazer mais efetividade e qualidade para a investigação de todos os tipos de crimes. Algumas coisas a gente já conhece. A primeira prioridade é terminar as obras e entregar a Delegacia de Gaspar. A população e os policiais merecem uma unidade nova lá. Depois, não consigo concordar com as estruturas de Blumenau. Principalmente 1ª e 2ª DP (Delegacia de Polícia). Não tem acessibilidade na 1ª DP. Mas é o que digo: preciso me inteirar por quê. Depende da gente? Não? Queremos melhorar a estrutura das nossas unidades para o atendimento ser cada vez melhor. Por fim, tenho muita vontade de investir tempo e dedicação à Delegacia de Proteção à Mulher. É uma causa nobre, grande, que infelizmente vem crescendo. Apesar de os esforços serem tremendos, a gente vê que acabam crescendo os crimes contra a mulher. Eu, especificamente, peguei aquele homicídio da Bianca (Wachholz)… É um negócio que choca a gente. Será que a polícia poderia ter feito algo? Não sei. Mas ela não procurou. Quem sabe com programas de conscientização, de fazer as pessoas conhecerem melhor a estrutura, quem sabe ela tivesse mais ferramentas… Criei o Whatsapp da DIC. Prendemos na semana passada um procurado, líder e integrante de organização criminosa. Eu tinha pedido a prisão por um homicídio na Rua Pedro Krauss, de um rapaz que esquartejaram. Ele estava foragido. Recebi uma mensagem no celular da DIC. Simplesmente alguém me chamou, disse que não queria se manifestar, mas que se fôssemos agora no lugar o rapaz estaria lá. Mandei uma equipe e acabou, prendemos. Então, são essas ferramentas de tecnologia que quero trazer cada vez mais para aproximar a população e para que a Polícia Civil fique mais simples e mais acessível a todo mundo. Na questão da violência contra a mulher, a intenção é trabalhar em conjunto, com os delegados, os policiais civis lotados na DPCAMI (Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idosos) porque tenho muita vontade realmente de melhorar nossos índices e diminuir a violência contra a mulher.
Como se faz esse fortalecimento da investigação? O que é mais urgente?
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Sempre estruturas melhores. Já vem melhorando muito. Quando cheguei (a Blumenau), a gente reativou. O próprio doutor Rodrigo (Marchetti) deu condições para a gente trabalhar lá. Quero manter essas condições. Às vezes, se diminui o efetivo do plantão, tem que tirar da investigação para botar no plantão. Porque às vezes registrar um boletim de ocorrência é mais importante do que efetivamente descobrir a autoria de um crime. Está invertido. O boletim de ocorrência a gente registra na internet, a gente recebe depois esse boletim. O policial tem que estar na linha de frente, realmente na investigação. É dar sempre maiores condições para que eu consiga cobrar depois e dizer: olha, agora não tem desculpa para não demonstrar os resultados.
O senhor pretende mexer em alguma coisa na estrutura da Delegacia Regional?Não, por enquanto não tenho nenhuma ideia, até porque é muito cedo para falar sobre qualquer mudança maior.
Como fica a Divisão de Roubos e Furtos e a própria DIC?
Temos dois delegados. Com a minha saída ficaram o Bruno (Effori) e o Rodrigo Raitz. Provavelmente vai voltar ao que era antes. Antes eu e o Bruno, agora o Raitz e o Bruno. Ao menos por enquanto. Digo isso porque em 2016 os roubos, principalmente em residências, estavam lá em cima. A gente veio trabalhando. Hoje, lá em baixo. Não vou dizer que a gente não tem serviço, mas a diferença está muito grande. Está muito melhor. Teve um antes de ontem, em que um dos suspeitos foi preso com o carro pela Polícia Militar, e realmente não lembro do anterior. É algo que não está mais em evidência. Agora, com a melhora desses índices, a gente não vai tirar equipe nenhuma, mas as duas equipes (especializada em roubos e em tráfico) permanecem, mas juntas, trabalhando com um delegado só em vez de dois. Não se perde nada, o número de policiais fica o mesmo.
Neste período eleitoral, alguns candidatos têm mencionado uma dificuldade de capacidade de investigação de crimes no país. Qual a análise local desta situação? O que pode melhorar na capacidade de investigação de crimes?
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Quando a gente vê a realidade nacional, Santa Catarina tem destaque positivo. E quando analisamos Santa Catarina, a região de Blumenau é destaque dentro do Estado. Nossos índices são muito bons se comparados às cidades maiores ou do mesmo porte. Mas ainda há muito que fazer. A ideia é sempre manter essas equipes. O que tem acontecido? Quando cheguei em Gaspar, não tinha policial. Aí, teve uma nova academia. Cheguei, com equipe. Ah, agora o delegado Egídio… Não é o delegado Egídio. Agora tinha cinco policiais para trabalhar comigo, sozinho não iria fazer nada. E aí a gente fez muita coisa. Quando saí de Gaspar, esses cinco já tinham saído também. Nós perdemos muita gente. Quatro aposentadorias, e não repunha esse efetivo. Com minha saída de Gaspar, logo depois veio novo concurso. Melhorou Gaspar em número de policiais e pude montar minha equipe em Blumenau. Pelo menos nesses dois anos não tivemos nenhuma baixa. Tivemos uma troca grande. Era sempre oscilando: está bom, está ruim, está bom, está ruim. Agora, o que vejo de perspectiva é que a polícia está muito renovada. Estou aqui para comprovar, sentado na cadeira de delegado regional com menos de oito anos de polícia. Quando o doutor Marchetti era delegado regional eu nem era policial ainda. Não tenho nem oito anos ainda de polícia. É essa renovação. Os concursos foram acontecendo, estão acontecendo, então a gente tem que manter isso. Daqui a pouco consegue estabilizar novamente para ir trabalhando. Não lembro de Blumenau estar tão bem servida de número de delegados. Precisava de mais agentes? Sempre precisa, porque é óbvio que a gente não consegue investigar tudo. A gente vai investigando o que é mais grave. Porque a gente tem 10 investigadores. Se tiver 20, 30, 50, daqui a pouco a gente está investigando tudo. Hoje a gente está conseguindo trabalhar dentro do que existe. A preocupação é não perder. Tem policiais que são de fora e já até haviam pedido liberação para ir para outras cidades. São pessoas de lá, é natural isso. Hoje o que a gente está um pouco mais defasado, não é nada absurdo, mas precisa um pouco mais é de escrivães.
Na Polícia Civil também há um sentimento de “enxugar gelo”, como é relatado muitas vezes pela Polícia Militar? O que o delegado regional pode fazer para reduzir a sensação de impunidade existente em parte da sociedade?
Nosso trabalho é diferente do da Polícia Militar, a gente trabalha depois da ocorrência do crime, praticamente. Claro que a gente previne o crime porque prendemos o cara que fez uma vez, sabemos que ele vai fazer uma segunda ou terceira. Se a gente conseguir prendê-lo, acaba prevenindo muita coisa. Mas a gente tem que agir aplicando as leis. A expressão “enxugar gelo”, entre outras, é porque a gente vê que nossa legislação não dá conta. Precisamos fazer alguma coisa. A gente prende, prende… A Polícia Militar mais porque está na rua. Às vezes eles prendem, que é o levar para a delegacia. Leva o adolescente 10, 15 vezes. A lei diz que tem que soltar. Aí, estou lá no plantão como delegado, vou liberar o cara, não tem o que fazer. Acho que eles têm mais essa sensação, de estar acontecendo isso. A gente talvez não tanto, mas óbvio que precisamos de melhora substancial na legislação. A gente prende, consegue a condenação, o cara é condenado a 20 anos e em cinco, seis anos está na rua. O cara matou, fez um monte de coisa e depois está rodando, livre, sem dever nada para a Justiça. A Lei de Execução Penal é horrível no Brasil.