Roupa de cama esticada, chave na mão, sorriso no rosto. Assim o empresário Artur Bernardo Miguel, 51 anos, espera mais três hóspedes que ficarão em um dos dois apartamentos que ele aluga por meio do Airbnb, plataforma virtual de hospedagens. No mural ao lado da porta há uma relação de bebidas como água, cerveja e refrigerante deixados na geladeira e o valor cobrado por elas, como em um serviço de frigobar de hotel. O imóvel, todo mobiliado, ficou fechado por três anos até que, na Oktoberfest passada, um amigo sugeriu que ele o locasse para visitantes. Foi sucesso, o apê ficou ocupado todos os 19 dias e o valor obtido foi equivalente ao aluguel que ele receberia em um ano inteiro.
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Artur gostou da ideia. Continuou disponibilizando o imóvel ao longo do ano e aproveitou uma oportunidade de negócio para comprar o apartamento ao lado, em um prédio da Vila Nova, que agora também é alugado pelo site. Até um tio resolveu oferecer a casa para ele gerir o aluguel de quartos no período da festa. Com isso, este ano cerca de 100 pessoas devem ter uma mãozinha de Artur para conseguir um bom lugar para descansar.
Os hóspedes da vez são Paulo Henrique Corrêa, 39 anos, Fabio Silva, 40, e Osmar Tozi, 44, três amigos de Itapeva e Jundiaí, no interior paulista. Eles chegaram à cidade terça-feira, com a intenção de permanecer pelo menos até sexta – se a festa render, pretendem esticar a permanência por aqui antes de continuarem as férias em Florianópolis. O estilo europeu da Oktober e da cidade, a cultura e, admitamos, o qualificado público feminino são alguns atrativos para o trio. Ainda de tênis e com as malas fazendo escala no chão da cozinha, eles relembram outras vindas à festa, em que ficaram em hotéis, e destacam o valor mais atrativo e a facilidade para fechar a estadia pelo aplicativo.
– A possibilidade de avaliação mútua, de dar uma nota para o anfitrião, assim como ele vai me avaliar como hóspede, é algo que passa segurança – conta Paulo, que fez a reserva para os três, prontos para curtir a festa pela primeira vez juntos.
O que para Paulo, Fabio e Osmar é comodidade – o apartamento fica a um quilômetro da Vila Germânica –, torna Artur mais uma das pessoas que conseguem boa renda extra em outubro, com um imóvel que antes só trazia despesas. Mais do que isso, permite que Artur faça amizades com pessoas de diferentes lugares. Por aqui o contato dele com os hóspedes acaba ocorrendo apenas no check-in, quando entrega as chaves e dá as boas-vindas. Mas a satisfação dele com essas novas relações surgidas pela hospedagem é tanta que, quando viaja, hospeda-se em imóveis alugados pelo Airbnb e dá preferência para locais em que os anfitriões morem. Justamente para usufruir mais da convivência.
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– Já recebi gente da França, dos Estados Unidos, da Alemanha, Chile, Argentina, Austrália. Por ser uma plataforma mundial, essa possibilidade fica sempre aberta. E a Oktober foi determinante para isso. Além de ser o período de maior movimento, eu não teria entrado no negócio se não fosse a demanda alta por hospedagem na época da festa – conta o anfitrião.
Tempo para receber a família
Não é apenas o desejo de renda extra e de conhecer pessoas que motiva anfitriões blumenauenses a compartilharem as moradias com visitantes de outras cidades. No caso do economista Luciano de Souza Barbosa, 57 anos, é a proximidade com os parentes que moram em Ituverava (SP) e Santa Rita de Cassia (MG) e que viajam até Blumenau para deixar a casa cheia.
A tradição começou há 15 anos, quando Luciano e a esposa mudaram para Blumenau. Três meses depois tinha Oktoberfest e os amigos de filhos e parentes vieram para cá. Desde então, o casal organiza as datas de outubro para receber grupos de quatro até 10 pessoas – todos primos, irmãos, cunhados e parentes que em outubro viram de primeiríssimo grau. Os colchões são espalhados pelo apartamento e a rotina vira de ponta-cabeça. Hoje chegam sete pessoas e na última semana da festa mais três casais devem aportar na morada dos Barbosa.
– Recebemos todos com muita satisfação. É uma oportunidade de convivermos e revermos amigos e parentes, aproveitar a presença deles, saber notícias da nossa região, matar a saudade, e, claro, aproveitar com muita música e uma cervejinha básica – brinca.
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Na rede hoteleira, a situação também é de casa cheia. Praticamente 95% dos 4.750 leitos de Blumenau e região estão ocupados, restando poucas vagas.
A intimidade que só há em um hostel
Vinte anos atrás Fátima Siquela Trevisani estava grávida e largava a carreira de duas décadas como bancária para buscar algo que lhe faria feliz. Comprou uma casa no bairro Itoupava Seca e, sem muita pretensão, começou a hospedar uma sobrinha e amigos que vinham estudar em Blumenau. A moradia logo virou república e, ainda nos primeiros anos, ajudou a acomodar visitantes da Oktoberfest que não encontravam vagas na rede hoteleira convencional.
Hoje Fátima é apenas Tia Fá. Tem 60 anos e vigor de menina. É tratada como amiga pelos hóspedes. A casa se transformou em um hostel que deve receber 90 pessoas nos fins de semana e feriado deste ano. No ano passado a média era de 120 pessoas. Durante toda a festa cerca de 400 pessoas devem passar por lá. Um público que já começa a fazer amizade antes de desembarcar na cidade, em grupos do Whatsapp, e leva a união para além da Vila Germânica. Neste feriado prolongado e também no último fim de semana a ocupação máxima dos cerca de 20 quartos está garantida.
Sem a Oktoberfest, Tia Fá admite, seria impossível manter as instalações da mesma forma, com mobília e utensílios de cozinha em todos os apartamentos – o que faz ela entender o estabelecimento mais como pousada do que como hostel, embora este último garanta um bom apelo sobretudo entre estrangeiros. Para este ano, em um mês ela montou uma espécie de pub. Fica ao lado da piscina, onde nos fins de semana rolam festas com os visitantes que esquentam o clima para a noite de Ein Prosit! Com pôsteres de Beatles, Janis Joplin, Nirvana e Guns ‘n’ Roses, o espaço cool, este mês todo decorado com as cores da germânia, ajuda a aumentar a interação e a proximidade entre os visitantes, um dos grandes diferenciais para quem procura um hostel.
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– A facilidade, o preço e o contato mais familiar é o que mais conta. Em um hotel é tudo muito mecânico – opina Cristiane Guarim, que veio de Guarulhos com amigos.
Tia Fá concorda. Ao lado do filho Rafael Siquela Trevisani, 21, que comanda o bar recém-montado, ela não tem dúvidas de que fez a escolha certa 20 anos atrás.