A tímida pista de treinamento do Cefid/Udesc, em Coqueiros, Florianópolis, contrasta com os feitos e o sorriso largo da jovem Micaela Mello. Aos 17 anos, a esportista de São José já ostenta marcas significativas no atletismo, como o recorde brasileiro Sub-18 nos 100m com barreiras (13s73) e a medalha de ouro no Mundial Escolar de Atletismo Sub-17, na mesma prova, disputado na Turquia em 2016.
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E foi com a confiança em novos bons resultados que Micaela embarcou nesta semana para Nancy, na França, para competir em mais um Mundial Escolar de Atletismo, agora na categoria Sub-18. No começo de julho, parte para a disputa da mesma prova no Campeonato Mundial Sub-18 da IAAF (Associação Internacional das Federações de Atletismo), em Nairóbi, no Quênia.
— Essas disputas vão ser bem fortes, até porque as meninas são mais velhas que eu, têm mais experiência. Estou treinando bem, estou preparada física e psicologicamente, e a colocação vai ser consequência do meu trabalho. Acredito que se eu baixar o tempo para 13s50, brigo por medalha — afirmou a jovem na véspera do
Embarque para a França
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Acostumada a competir em categorias acima da sua idade, Micaela divide os treinos entre a pista do Cefid, da UFSC e a academia. A orientação vem do treinador Thiago Mendes Olivo, 38, que acredita ter em suas mãos uma joia do atletismo brasileiro.
— Nessa idade, um ano já faz uma diferença muito grande fisicamente, por isso a gente vê que ela é acima da média. Enfrentamos várias dificuldades pelo caminho, principalmente com relação a apoio e locais de treinamento, então a gente comemora muito conquistas como essas — disse Thiago.
Para Micaela, seu bom desempenho está atrelado às primeiras quatro das 10 barreiras que precisa saltar na prova, onde consegue abrir a vantagem necessária para administrar a liderança até o final. Para o treinador, isso é apenas a percepção de quem deixa as adversárias “comendo poeira”.
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— Toda a prova dela é boa, do início ao fim. Acontece que quando ela passa as primeiras barreiras e abre a vantagem no início, não enxerga mais ninguém do lado e acha que está correndo fraco no final — se divertiu Thiago.
Amigos, amigos, treinos à parte
Mais do que treinador, Micaela vê Thiago como um grande amigo e conselheiro. Como qualquer adolescente, a atleta estuda — está no 2º ano do Ensino Médio —, vai a casa de amigas e gosta de passear no shopping, além de frequentar a igreja. Conciliar tudo isso com a promissora carreira de atleta não é das tarefas mais simples, como explicou Olivo.
— A gente tem que ter paciência e usar um pouco de psicologia para lidar com isso. É importante focar nos estudos e na vida social, mas, para conquistar bons resultados e vitórias nas competições, tem que abrir mão de algumas coisas — comentou o treinador.
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Ao embarcar com Micaela para o Mundial Escolar de Atletismo na França, Thiago realiza o sonho de representar a seleção brasileira em uma competição internacional. Se depender da atleta, a viagem também vai render uma medalha no peito do treinador.
— Ele é um ótimo treinador, nos damos muito bem. Além disso, ele é meu amigo, me ajuda muito. Conversamos todos os dias e estamos trabalhando cada detalhe da competição, definindo nossa programação. Estamos bem afiados, espero que dê tudo certo — disse Micaela.
Apoio da família
O atletismo está no sangue da família Mello. Tão logo saiu das fraldas, Micaela foi introduzida ao mundo das corridas pela mãe, Elis Regina, ex-atleta dos 400m e dos 800m rasos. Aos seis anos, em 2006, disputou a Maratoninha da Caixa — uma corrida de 250 metros — e faturou o primeiro lugar. Repetiu o feito nos dois anos seguintes e decidiu se dedicar ao esporte.
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Hoje, suas conquistas são motivos de orgulho para a mãe e os irmãos Robson, 28, e Claudinei, 18. O pai, Claudir, faleceu no ano passado, aos 57 anos, mas está nos pensamentos de Micaela aonde quer que ela vá.
— Tenho certeza que ele estaria todo bobo com essa viagem. Ele costumava ir no Bar do Dedé, perto de casa, em Palhoça, e contava para todo mundo quando eu ia para uma competição. Para ele, só o fato de eu viajar para outro país era a maior felicidade — disse a atleta.
Projeto Tóquio 2020
Em agosto do ano passado, Micaela só tinha olhos para a disputa dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Fã do jamaicano Usain Bolt, assistiu pela televisão a quase todas as provas de atletismo, inclusive os 100m com barreiras feminino, a especialidade da atleta em que procura se inspirar: Alina Talay, da Bielorrússia.
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— Gosto muito das provas dela. Desde as competições de base ela sempre foi muito boa, então tento me espelhar nela. Onde ela chegou, quero chegar um dia — disse Micaela, em referência ao bronze conquistado pela bielorrussa no Mundial da China, em 2015, e à semifinal olímpica disputada em 2016.
De fato, está nos planos da atleta e do treinador a disputa dos Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2020. Daqui até lá, são três anos de muita preparação, foco e determinação para alcançar o índice de classificação.
— A gente já conversa sobre isso, temos um planejamento à longo prazo que inclui uma temporada fora do país, competindo internacionalmente para pegar experiência — afirmou Thiago Olivo.
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No ano passado, Micaela provou um pouco do sabor das competições internacionais de alto rendimento, quando disputou na Argentina o Sul-Americano de Atletismo Sub-18: levou o ouro nos 100m com barreiras e a prata nos 400m com barreiras. Este ano, no início de junho, disputou sua primeira competição “adulta”, a prova mais nobre do atletismo nacional, o Troféu Brasil.
— Consegui terminar a prova (100m com barreiras) na sexta colocação, disputando com atletas que foram para as Olimpíadas e para Mundiais. Consegui me sair bem e isso me animou muito para seguir com meu sonho. Espero que em 2020 o Bar do Dedé seja o ponto de encontro da turma para assistir as Olimpíadas — comentou.
Outro catarinense no Mundial Escolar
Não foi só a Micaela que arrumou as malas e partiu para Nancy, na França. Tiago do Nascimento, de 18 anos, também embarcou com para o Mundial Escolar de Atletismo para compor a delegação brasileira de 24 atletas e quatro treinadores. Esta será a primeira competição do esportista de São José em solo internacional, na prova dos 110m com barreiras.
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— Já participei de bastante competições nacionais, mas esta é a primeira vez fora do país. Estou com o tempo de 14s10, mas tenho que baixar bastante para pegar a final. Talvez, com 13s50 dê para classificar — disse Tiago.
Para garantir a vaga no Mundial, Micaela e Tiago tiveram que se classificar em outra modalidade (o mínimo exigido são duas). Enquanto Micaela se classificou no salto à distância, Tiago avançou no arremesso de peso. A participação nas provas não é obrigatória, e ambos devem ir para a disputa apenas se ela ocorrer depois da prova principal.