Mais um número negativo sobre a economia brasileira divulgado na terça-feira – uma nova redução de 0,3% no nível de emprego na indústria – acentua a preocupação com o ritmo da atividade num ano do qual se esperava recuperação. Mesmo com um motor potente, capaz de girar a mais de 7% ao ano, como em 2010, o Brasil roda hoje a baixa velocidade, com engrenagens pesadas que demoram a reagir a aditivos e estímulos.

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Mas por que o bólido verde-amarelo não deslancha? O governo federal adotou medidas de incentivo: baixou o juro, facilitou o crédito, ampliou o prazo de financiamento da casa própria e diminuiu os encargos na folha de pagamento da indústria. Estuda outras providências, como baratear as contas de telefone, de energia elétrica e desburocratizar impostos. Mas especialistas avaliam que são providências insuficientes.

Consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Júlio Sérgio Gomes de Almeida entende que o governo agiu de acordo com o receituário em época de crise ao baixar o juro e socorrer as indústrias. No entanto, pondera que é necessário esperar pelos efeitos da iniciativa.

– É preciso dar um tempo para que se efetivem – recomenda, lembrando que o PIB não reage há três trimestres.

Ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Almeida destaca que foram aplicadas medidas com expectativa de resultado rápido, como incentivo ao consumo. No entanto, entende que faltam ações complementares, como a concessão de incentivos temporários para empresas, na forma de vantagens fiscais, em troca do aumento da produção. O economista sugere que se multipliquem concessões e parcerias com a iniciativa privada, para tocar a ampliação de setores vitais ao desenvolvimento, como portos, pontes e aeroportos. Outra dica é que se mostre mais ousado no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

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– Não falta dinheiro. Falta é gestão – diagnostica Almeida.

O coordenador de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV), Armando Castelar, alerta que o ritmo lento do PIB deve ser um motivador de reformas. Diz que o governo, neste momento, deveria montar uma agenda de desenvolvimento, melhorar o clima de negócios no país e contratar investimentos de infraestrutura.

– A renovação de concessões no setor elétrico está há muito tempo na mesa – exemplifica.

Castelar considera inadiável melhorar a logística do país, expandir aeroportos, portos e rodovias – apontados como precários e estranguladores do crescimento. Seriam medidas a longo prazo. Porém, o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Pedro Silveira Bandeira observa que espalhar canteiros de obras geraria empregos de imediato.

– É hora de investir em infraestrutura. Movimenta a economia e aumenta a competitividade – ressalta Bandeira.

Competitividade também é uma das preocupações do presidente da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), Heitor José Müller. Como os impostos encarecem as mercadorias brasileiras, há disputa em desvantagem com os produtos estrangeiros. A desigualdade se acentuou com a crise nos Estados Unidos e na Europa, que restringiram as importações. Consequência: os exportadores se redirecionaram para o Brasil.

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– Estão jogando no nosso mercado os produtos que não conseguem colocar lá – reclama Müller, defensor de redução nos tributos e mudanças no câmbio.

NÚMEROS DA ESTAGNAÇÃO

Indicadores que apontam a necessidade de novas medidas:

Emprego na indústria: -0,3% foi o resultado de abril na comparação com março, o segundo negativo seguido na comparação mensal, conforme o IBGE

Produção industrial: -0,2% foi o desempenho de abril em relação a março, mês em que já havia ocorrido recuo de 0,5%, segundo o IBGE

Projeção do PIB anual: -0,17 ponto percentual é a diferença entre o crescimento do ano passado (2,7%) e o projetado para este ano (2,53%) por cerca de uma centena de instituições financeiras ouvidas pelo Banco Central

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PIB trimestral: 0,2% foi a variação da economia no primeiro trimestre do ano

EM COMPASSO DE ESPERA

Medidas econômicas foram adotadas, ganhando apoios ou sofrendo críticas, sendo consideradas insuficientes para alavancar o desenvolvimento do país:

O que foi feito

Redução do juro: na reunião de 30 de maio, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) baixou a taxa básica de juros, a Selic, para 8,5% ao ano.

Financiamento à casa própria: a Caixa Econômica Federal ampliou de 30 anos para 35 anos o prazo, com recursos da poupança. Também reduziu os juros de financiamentos de 9% para 8,85% ao ano, podendo chegar a 7,8% (dependendo do cliente). O Santander fez o mesmo quanto ao prazo.

Redução pontual de impostos: para alguns setores da indústria houve alívio da cobrança de tributos sobre a folha de pagamento. Foi reduzida a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o que diminui o custo do crédito para o consumidor, e cortado por tempo determinado o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de eletrodomésticos, móveis e carros.

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O que está em discussão

Diminuir os encargos da folha de pagamento: em 3 de abril, foi anunciada a medida para beneficiar 15 setores (têxtil, confecções, couro e calçados, móveis, plásticos, materiais elétricos, autopeças, ônibus, naval, máquinas e equipamentos, mecânica, hotéis, tecnologia da informação, call center e design de casa). Falta ampliar a chamada desoneração da folha para outras áreas.

Reduzir as tarifas de energia elétrica e gás natural: os estudos para diminuir os encargos foram comunicados no início de maio. Não foi fixado prazo para a divulgação de providências.

Baratear as contas de telefone: o plano é reduzir os custos das telecomunicações. Só o ICMS pode chegar a 25% da tarifa de telefone, dependendo da alíquota de cada Estado.

Unificar o PIS e o Cofins: anunciada no final de maio, é a operação mais difícil de ser executada porque forçará o governo a revisar todos os regimes tributários especiais que abrangem esses impostos. Não há garantias de que todas as empresas terão redução.

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O que falta fazer

Incentivar as empresas: provisoriamente, por um ou dois anos, conceder vantagens fiscais para empresas, em troca de investimentos na produção, algo semelhante ao que foi dado à indústria automobilística no passado.

Parcerias com o setor privado: incrementar as parcerias público-privadas (PPP) para investir em aeroportos, portos, construção de penitenciárias e outras obras.

Acelerar os investimentos: ampliar a atuação no Plano Brasil Maior (voltado às indústrias) e no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) com melhor gestão. Não faltariam recursos, mas agilidade e ousadia gerencial.

Aliviar a carga tributária: a do Brasil é considerada uma das mais altas do mundo, tanto para empresas quanto para pessoas. Gira em torno de 35% do PIB. Especialistas apontam que há excesso de tributos no país. Seria imprescindível eliminar ou unificar alguns, para diminuir os custos e a burocracia.

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Reduzir o risco jurídico do país: a proposta é de regras mais claras e imutáveis, que atraiam investidores e melhorem o clima para negócios.

Aperfeiçoar a infraestrutura e a logística: são medidas de médio e longo prazos, mas inadiáveis, para melhorar aeroportos, portos e rodovias, que se transformaram em gargalos para a expansão da economia. Serviços de geração de energia, fornecimento de água, comunicações e de aduanas também precisam ser modernizados.