O sotaque, a simpatia e a risada generosa não negam a origem de Renata Abranchs. Consultora e pesquisadora de moda carioquíssima, formada em Belas Artes e Estilismo, Renata é criadora do Bureau de Estilo e desde 2004 promove os Encontros de Moda, onde entrega o ouro para uma indústria de moda ávida pelo seu apurado olhar de coolhunting. Também fundadora e mentora do delicioso site Rioetc, ela carrega na bagagem consultorias e projetos especiais para empresas como Farm, C&A, GNT, Lacoste, Adidas e TV Globo. Incansável também se envolveu na fundação do movimento #feitonobrasil e desde 2015 leciona na pós-graduação do Instituto Europeo di Design – IED Rio. Na quarta (26), Renata traz pela primeira vez seu evento a Floripa, onde vai falar sobre o verão 2018. Com a coluna, ela bateu um papo sobre comportamento, futuro e consumo.

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Você já declarou que fazer roupa é pouco para o que o consumidor deseja. O que mais as marcas precisam fazer?

A primeira coisa é entender que, enquanto a moda muda com muita velocidade e cada vez mais rápido, a indústria e o sistema varejista são arcaicos e funcionam com paradigmas do século passado. A indústria está caducando. As marcas de grande expressão hoje estão apontando para o novo mundo. Vendendo mais do que vitrines e araras de roupas e se tornaram verdadeiras plataformas de comunicação, como Farm e Insecta Shoes, por exemplo. São comunidades com propósito, senso de comunidade. É preciso fazer de uma forma mais colaborativa e abrir a escuta para o consumidor se expressar. Tem um universo de símbolos para gerir, além de simplesmente fabricar e vender. O consumidor quer se ver representado ali nas questão de gêneros, classe, sociais e de cor. Tem um dever de casa que é novo. Mas os empresários antigos que estudaram em Harvard precisam ir mais pra rua. Tem um mundo além das planilhas.

Como consultora de marcas, qual é a maior dificuldade/desafio que você sente nessa indústria hoje?

Quebrar a casca, sair da caixa e olhar o mundo. Quando eles fazem isso imediatamente eles mudam. O mais difícil é tirá-los da zona de conforto. Tem gente que só olha para dentro. É preciso gostar de gente, abrir a escuta, trocar e não ter preconceito. A gente vive numa pais muito conservador, mas a juventude está mostrando que existe uma nova forma de pensar a vida. Uma das premissas para o sistema de moda é não ter preconceito. É preciso também inspirar e valorizar os times, trazendo todo mundo para essa conversa.

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Esse novo consumidor está menos voraz? Para que tipo de consumo nos encaminhamos?

Sim, a nova geração é menos voraz. Também tem a ver com a crise e com temas em pauta. Em 2025 a gente vai ter que ter dois planetas Terra para alimentar esse consumo. Há uma escassez de recurso e isso não vai mudar. Isso força mudanças, como trocar o verbo comprar por substituir, reparar, pedir emprestado. Repetir roupa de forma criativa virou um ato de resistência. A geração Z é criativa, autoral, faz muito com pouco. Não usa tanta maquiagem e não tem vergonha de mostrar a vida real, nua e crua. É essa geração que catapulta comportamentos. Novos modelos nascem pautados por mais qualidade e menos quantidade. Menos tendência, mais essência é meu lema. Mais movimentos e menos coleções efêmeras. Mais causas e menos temas de coleção. O buraco está mais em baixo.

Pode citar marcas brasileiras que são bons exemplos de criatividade e conexão com o consumidor?

Maria Tangerina, Brechó Replay, que faz uma curadoria de peças antigas, House of All, de São Paulo, que reúne House off Bubbles (guarda-roupa compartilhado) House of Food (cozinha compartilhada) e outras propostas. Catarina Mina, que une design e artesanato, Cacete Company, Bossa Social, Estúdio Benta, Surreal e muitos outros.

Sabemos que a brasileira gosta muito de consumir marcas internacionais. Em 2014 você participou da criação do movimento Feito no Brasil. De lá pra cá, a cultura de consumo mudou?

A turma jovem entende localismo e tem senso de comunidade. As gerações mais velhas, como Y e Z, ainda são muito pautadas pelas revistas de moda, que por sua vez são pautadas pelas marcas gringas. Mas mesmo essas gerações, por conta da alta do dólar, se viram obrigadas a consumir marcas brasileiras. Não como propósito, mas por necessidade e isso acabou criando conexão. É uma oportunidade e tanto para o amadurecimento das marcas locais. Mas ainda não mudamos a cultura e talvez nem estejamos mais aqui para ver mudança integral como é na França e na Itália. Vai demorar para o brasileiro pensar primeiro em Inhotim e depois na Disney.

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Ronaldo Fraga declarou recentemente que a moda está fora de moda porque as pessoas estão em busca de experiências, como gastronomia e viagens. Como a moda pode fazer frente a esse desejo tão atual por experiências transformadoras?

A experiência tá em tudo: quando você lê um post que toca a tua alma, quando você se vê representado em uma imagem, quando você vai em uma festa para consumir um produto. Tudo é experiência de marca. É um caminho sem volta. A pasteurização não tem mais chance no novo mundo. Sempre falo que as marcas tem que funcionar como verdadeiras amigas dos consumidores, como fazem Reserva, Maria Filó, Osklen e Animale. É quase uma seita de tanta fidelidade e identificação.

O Rioetc é um grande sucesso. Surgido como blog de street style se tornou uma plataforma de negócio. Como se deu essa transformação?

Eu sempre viajava e tirava fotos nas ruas. Passava adiante os convites para as primeiras filas dos desfiles pois preferia ficar do lado de fora, fotografando e entrevistando as pessoas. Até que o Tiago Petrik, meu ex-marido, disse: vamos estruturar esse conteúdo utilizando nosso quintal, o Rio de Janeiro. Então, surgiu como um blog de street style mesmo, valorizando o Rio de Janeiro numa época obscura da cidade, onde o só o submundo era divulgado. Um ano depois o Rio foi escolhido para ser sede olímpica e virou vitrine. Desde a criação já fotografamos mais 15 mil pessoas, lançamos seis livros e fizemos projetos para mais de 100 marcas do Brasil e do mundo, como Farm, Grendene, GNT, Lacoste, Burberry e Rock in Rio. Oferecemos curadoria de pessoas, lugares e conceitos para projeto especiais. Nossa redação é pequena, temos setes pessoas. Não queremos ser grandes.

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Para você, o que é ter estilo?

Ter uma assinatura pessoal, intransferível e irreproduzível. É gostar de si, do que você vê no espelho, sem querer ser outra pessoa. Se aceitar e potencializar o que tem de melhor.

Para o verão 2017, quais são inspirações favoritas?

Esse é o verão da calça pantacourt com maiô ou com body, justo em cima e solto embaixo. Tem um retorno de vestidos e túnicas sobre calças, um look meio indiano e uma tendência athleisure, que une esporte e lazer.

Que paralelo faz entre o estilo da carioca com o jeito de vestir da catarinense?

Tem muitas semelhanças, mas uma diferença crucial: a catarinense sofre menos o impacto do encontro casual. O Rio é uma praça. É circular e todo mundo se encontra, se esbarra, se mistura. Aquela coisa de sair da praia, ir pro bar, terminar no samba e lá pelas 22h ainda estar com o pé cheio de areia. Também temos uma veia criativa absurda e uma cena cultura rica. Em Florianópolis, sabemos que o investimento é menor, então o esforço para criar é maior. A dificuldade de locomoção e as distancias fazem as mulheres de Floripa se produzirem mais, se prepararem melhor para esses encontros. E o fato de o calor ser apenas durante o verão também conta. No Rio temos intimidade grande o corpo. Meu mês preferido de praia, por exemplo, é julho.

Serviço

QUANDO: 26 de outubro, às 18h

LOCAL: Centro de Inovação ACATE (PASSEIO PRIMAVERA) – Rod. José Carlos Daux, 4150 – Saco Grande, Florianópolis/SC

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VALOR: R$ 350 (SUBSÍDIO DE 50%: Apoio Sebrae – Empreendedor Individual (MEI), Micro e Pequena Empresa (MPE) e Empresa de Pequeno Porte (EPP) da cadeia da Moda.

MAIS INFORMAÇÕES: (48) 3307-8427 ou contato@idit.org.br