Seis meses após a segunda onda de atentados a ônibus e unidades policiais em Santa Catarina, a demora no julgamento dos criminosos que ordenaram a violência pode aumentar as chances de liberdade e até de impunidade aos presos.
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Essa situação existe caso o Estado não consiga realizar audiências judiciais complexas de líderes do Primeiro Grupo Catarinense (PGC), a que associa os integrantes a uma quadrilha e ao tráfico de drogas.
São 98 réus alvos da operação Salve Geral da Diretoria Estadual de Investigações Criminais (Deic) no começo deste ano. Fariam parte de organização criminosa que age de dentro dos presídios e ordena crimes nas ruas.
Os líderes da facção respondem também à acusação de assassinato da agente penitenciária Deise Alves, em São José, na Grande Florianópolis. Nos dois processos, a Justiça e o Ministério Público dependem do sistema de videoconferência para realizar as audiências e julgá-los.
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Isso porque os chamados cabeças da quadrilha, que são os mais perigosos, estão desde fevereiro a 3,4 mil quilômetros de distância de Santa Catarina, na Penitenciária Federal de Mossoró, no Rio Grande do Norte (RN).
Lá, cumprem o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), isolamento dado pela Justiça para assegurar que mesmo presos não voltem a se comunicar com bandidos livres e a comandar delitos – foi considerada medida impactante para os ataques cessarem.
A eventual falha do sistema e a dificuldade da distância para ouvi-los presencialmente – o que dependeria de novas e delicadas operações de transferências – são razões apontadas para temer o chamado excesso de prazo no julgamento.
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Essa condição seria prato cheio para advogados reivindicarem violação dos direitos dos presos e embasarem pedidos de liberdade deles.
Em Blumenau, a juíza da 3ª Vara Criminal Jussara Schittler dos Santos Wandscheer havia determinado a presença no Fórum local dos 98 réus para as audiências, previstas para setembro, o que implicaria na transferência dos líderes de Mossoró.
No começo da semana passada, o promotor de Justiça que atua no processo, Flávio Duarte de Souza, mostrava-se preocupado com o risco de os presos não serem transferidos e com isso as audiências seriam remarcadas e mais tempo se perderia.
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Na quinta-feira, após contato com o juiz federal corregedor de Mossoró em exercício, Orlan Donato Rocha, a magistrada reviu a decisão e optou em realizar a videoconferência com Mossoró e audiência presencial com os 53 detentos que estão em Santa Catarina – o lugar deverá ser unidade prisional por segurança e em sigilo.
Na sexta-feira, ouvido de novo pelo DC, o promotor mostrava-se mais seguro que o excesso de prazo não se configurará.
Em São José, onde os criminosos do PGC serão julgados pelo assassinato da agente Deise, o promotor Geovani Tramontin está otimista com a videoconferência. Admite impasse apenas se o sistema não voltar a funcionar.
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O promotor Onofre Agostini, coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal do Ministério Público, afirmou que o Estado está cuidando da logística para que as audiências sejam realizadas e não ocorra demora nos dois julgamentos.
Audiências na segunda-feira em São José
Na segunda-feira, em São José, a Justiça fará a segunda tentativa de audiência online com a prisão de Mossoró. Na primeira, no dia 11 de julho, a conexão não funcionou e a sessão foi suspensa pelo juiz Otávio Minatto.
O magistrado pediu a remoção dos líderes que estão em Mossoró para fazer a audiência presencial, mas o juiz corregedor da prisão no Rio Grande do Norte negou alegando que as transferências trariam custos elevados.
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– É uma preocupação nossa evitar o excesso de prazo. Vamos tentar de novo a videoconferência. Havendo falhas novamente aí sim fortalecerá a reiteração do pedido da presença deles (líderes) aqui para que os prazos dos processos estejam dentro do princípio de razoabilidade. Queremos resolver isso o quanto antes – assegura o juiz corregedor do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Alexandre Takaschima.
Facção aluga casas em Mossoró
Enquanto é lento o julgamento, o crime organizado se articula e segue tentando se articular mais uma vez. As recentes informações de monitoramentos de policiais e promotores indicam que a facção alugou casas em Mossoró para familiares dos líderes. Assim, o contato pessoal garantiria também a comunicação sobre a continuidade da atividade criminosa.
A capacidade financeira, movida a tráfico de drogas e assaltos, também tem como objetivo pagar advogados em Santa Catarina e no Rio Grande do Norte. Nos setores de inteligência, o assunto permanece como constante tema de preocupação.
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Afinal, não ousam a afirmar que Santa Catarina está livre de nova onda de crimes nas ruas. O grupo pensa que manter os líderes longe e isolados é a principal medida para que isso não se repita.
NOS TRIBUNAIS
Os julgamentos que envolvem líderes do PGC correm em Blumenau e em São José.
ATENTADOS
O processo relativo à segunda onde de ataques tramita em Blumenau porque o celular que originou a investigação tinha prefixo 47. A polícia suspeita que o presídio local também viraria quartel-general da facção.
Acusação
São 98 réus denunciados por associação ao tráfico de drogas e formação de quadrilha. Os crimes de incêndios foram desmembrados para as comarcas em que ocorreram os delitos.
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Réus
Continuam com prisão preventiva cerca de 60 pessoas, sendo 22 na Penitenciária Federal de Mossoró (RN). O restante responde em liberdade.
Audiências
Marcadas para 9 a 18 de setembro, em Blumenau (o local pode ser alterado), quando serão ouvidos testemunhas e réus. Haverá videoconferência com os presos de Mossoró.
ASSASSINATO DE DEISE ALVES
Tramita em São José, onde ocorreu a morte, em 26 de outubro de 2012. O homicídio está relacionado ao estopim da violência em duas ondas de atentados em Santa Catarina, entre novembro e fevereiro. Deise era mulher do então diretor da Penitenciária de São Pedro de Alcântara, Carlos Alves, onde ficavam os líderes do PGC.
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Acusação
Nove pessoas são acusadas de assassinato e formação de quadrilha. Entre elas líderes do 1º ministério do PGC.
Réus
Oito estão presos, quatro em Mossoró e quatro em Santa Catarina – um acusado segue foragido.
Audiências
Começaram em julho apenas com os réus presos no Estado. A videoconferência para os de Mossoró não funcionou. No dia 9 de agosto foram ouvidas testemunhas protegidas. Agora, novas sessões foram marcadas para começar na segunda-feira (26 de agosto) e podem ir até o dia 2 de setembro – de novo a Justiça fará tentativa de videoconferência com Mossoró.
ONDAS DE VIOLÊNCIA – 31 de outubro a 18 de novembro de 2012 e de 30 de janeiro a 3 de março de 2013
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Depois da morte da agente, no final de outubro, começa onda de atentados criminosos no Estado. Os crimes se intensificam em novembro de 2012.
A polícia e a cúpula da segurança afirmam que os ataques partem de presídios, ordenados pelo PGC. Um dos motivos seria a tortura contra detentos na Penitenciária de São Pedro de Alcântara.
Em fevereiro de 2013, Santa Catarina voltou a enfrentar uma forte onda de atentados. Nas duas, foram mais de 170 ataques criminosos, entre ônibus queimados e tiros contra prédios públicos e automóveis.
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Quarenta líderes da facção foram transferidos para presídios federais. Na principal investigação feita até agora, pela Deic. Cerca de 100 pessoas foram presas e denunciadas pelo Ministério Público.
A VIDEOCONFERÊNCIA
No sistema, online, os presos ouvem o que se passa na sala em que é realizada a audiência, são vistos pela tela e também podem se manifestar quando indagados pelo juiz.