Antonio Conselheiro – O Taumaturgo dos Sertões chegou aos cinemas por insistência, por paixão e graças a uma força coletiva que teve início 25 anos atrás, quando foram captadas as primeiras imagens dirigidas pelo baiano José Walter Lima. O resultado, para além da aparente precariedade da realização, exibe um vigor raro cinema nacional. O longa estreou na Capital sexta-feira e volta a cartaz amanhã, na Sala Norberto Lubisco, na Casa de Cultura Mario Quintana. Lima tem como foco a Guerra de Canudos (1896 a 1897) e o líder político e místico Antonio Conselheiro, que conduziu a rebelião no interior da Bahia, encerrada no banho de sangue de 25 mil mortos. A fiel reconstituição interessa menos ao diretor do que representar a espécie de transe coletivo que envolveu o episódio. A narrativa combina documentário, ficção e animação, que reproduzem as batalhas, imprimindo ao filme um tom alegórico, caótico e poético. O rigor histórico vem das páginas de Os Sertões, testamento literário de Canudos – um ator encarna o escritor Euclides da Cunha no papel de narrador e testemunha da epopeia. O diálogo com os postulados de Glauber Rocha é evidente – Carlos Petrovich, já falecido, que vive Conselheiro, atuou em A Idade da Terra. Lima começou a rodar o filme em 1987. Ia retomar o trabalho em 1990, mas sua verba sumiu no confisco do governo Collor. A imediata extinção da Embrafilme o fez arquivar o projeto. Depois veio um incêndio que destruiu 40% dos negativos e todo o som original. Lima retomou Antonio Conselheiro em 2009, filmando novas cenas e restaurando imagens antigas. Difícil imaginar como seria o resultado se o filme fosse concluído sem esses tombos. Mas é inegável que Lima soube juntar das cinzas uma obra apaixonada e que não tenta disfarçar suas pontuais irregularidades. Mostra tanto um relevante documento histórico quanto uma carta de intenções daqueles que acreditam num cinema sem manual de instruções, tocado pelo prazer de um sonho quixotesco.
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