– Eu estou em paz. Minha família e meus amigos estão em paz. A nossa escola está em paz. Minha cidade está em paz, a Terra está em paz.

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Os versos, repetidos pela professora Rosângela Martins dos Santos entre longas respirações, são entoados pelo menos cinco vezes por 20 crianças sentadas em roda na Escola Desdobrada Lupércio Belarmino da Silva, no Ribeirão da Ilha, em Florianópolis. Todas têm seis ou sete anos, e algumas delas parecem se esforçar mais que as outras para fecharem os olhos e se concentrarem – mas conseguem, mesmo que apenas por trinta segundos.

– São justamente essas se distraem facilmente que mais precisam da meditação. Se é difícil para adultos pararem e relaxarem alguns minutos, é ainda pior para uma criança – relata a professora de educação física e praticante da ioga.

A escola é a pioneira catarinense na meditação com crianças, graças principalmente ao interesse pessoal de Rosângela. Ela relata que começou a meditar durante as aulas na Lupércio há cerca de dois anos, mas o projeto cresceu e acabou se oficializando no programa da escola no ano passado.

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Conheça cinco benefícios da meditação na infância

Agora, com resultados positivos sendo observados em todas as turmas (incluindo as de estudantes mais velhos), a unidade passou a orientar todos os professores a pararem alguns minutos por dia e relaxarem com seus estudantes.

Além de ser um poderoso exercício físico e para alongamento, a meditação auxilia o indivíduo a se desestressar e se concentrar melhor quando necessário. Com as crianças, uma vantagem extra: salas de aula tumultuadas tornam-se mais tranquilas, enquanto os meninos e meninas aprendem a lidar com a sua própria paciência.

– No momento em que a criança está mais calma, ela também percebe o ambiente ao seu redor mais calmo. Isso a ajuda a se aproximar do grande objetivo da meditação, que é o autoconhecimento – explica a psicopedagoga e facilitadora de ioga para crianças, Taísa Canabarro.

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Embora a prática trazida para o Brasil entre os anos 1990 e 2000 ainda pareça novidade, meditar com os alunos é incentivado em escolas europeias desde o fim da década de 1970.

A vinda da prática com crianças para o Ocidente remonta à experiência da professora de inglês em Paris, Micheline Flak. Embora o trabalho da francesa não seja diretamente com a meditação, ela é considerada uma das pioneiras na introdução de exercícios de relaxamento na área da educação.

Na época, relata Micheline no livro “Yoga na Educação”, ela percebeu que as crianças chegavam à sala totalmente dispersas e sem capacidade de concentração, e a novidade surgiu como uma forma de trazer a atenção deles para a aula.

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O que começou como uma chance para os alunos relaxarem antes das aulas logo se transformou num hábito e ganhou ares de atividade escolar fixa. A empreitada de Micheline resultou na criação da Recherche sur le ioga dans l’éducation (Pesquisa de ioga na Educação) – a instituição RYE, fundada com apoio de pais e educadores em 1978.

Hoje, a organização está em 11 países e realiza diversos cursos para profissionais do mundo inteiro.

Meditação laica possibilita ensino em escolas públicas

Ao contrário do que prega o imaginário popular, a meditação e a ioga não são necessariamente ligadas a ensinamentos religiosos, explica a professora Rosângela dos Santos.

A ioga escolar é uma prática milenar disseminada em diversos países e mantém um caráter laico, evitando assim interferir no ensino religioso das crianças. E é justamente isso que permite a inclusão dela em qualquer instituição pública.

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– Até alguns anos, eu tinha aquela visão do ioga que todo mundo tem, como algo exclusivo de certas religiões. Só quando descobri a existência de uma corrente laica sendo difundida há tanto tempo que me dei conta que isso poderia ser feito aqui também – conta.

A ONG Mahatma Meditação Paz nas Escolas, sediada em Porto Alegre (RS), por exemplo, criou uma técnica própria para incentivar a meditação entre os pequenos e contabiliza cerca de 41 mil crianças adeptas em diversos países, incluindo 300 escolas no Brasil. Dez delas ficam em Santa Catarina, nas cidades de Florianópolis, Caçador, Capivari de Baixo, São Bento do Sul, Brusque, Balneário Camboriú, São José, Araranguá, Criciúma e Chapecó.

Foi da ONG que surgiu a técnica da “Meditação pela paz” e o mantra usado pela professora Rosângela, da escola .

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Presidente da Mahatma, a psiquiatra indiana Anmol Arora explica que não existe uma idade correta para se começar a meditar, mas recomenda exercícios básicos de relaxamento e concentração a partir dos seis anos.

– Ensinar a criança costuma ser mais fácil. Ela tem mais agitação, mas menos ruído mental e menos ansiedade. Além disso, questiona menos a prática, ou seja, tem menos resistência, enquanto os adultos tentam entender mais para depois praticar ou o fazem apenas quando estão mal – comenta Anmol.

:: Como é a meditação escolar

As instruções abaixo foram elaboradas pela ONG Mahatma Meditação Paz nas Escolas e baseia-se no Exercício pela Paz, criado pelo Doutor em Física Quântica, Harbans Lal Arora. Recomenda-se a prática diária para alcançar os resultados esperados.

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1) Sentado, deitado ou de pé, posicione o corpo de forma confortável. Observe a sua respiração no ritmo natural, relaxe.

2) Mentalize ou repita em voz alta as seguintes frases: “eu estou em paz; minha família e meus amigos estão em paz; minha escola está em paz; meu bairro está em paz; minha cidade está em paz”. São opcionais as frases “meu país está em paz, a Terra está em paz e o universo está em paz”. Isso estimula um sentimento de pertencimento, monstrando à criança que ela faz parte de um todo.

3) Cada uma das frases pode ser repetida de cinco a dez vezes. A atividade dura entre cinco a 15 minutos.

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4) Na escola, o exercício pode ser feito na sala de aula, no pátio, no ginásio ou em qualquer ambiente disponível, de preferência no início do turno ou após o recreio.