Um médico com registro suspenso no Conselho Regional de Medicina de Santa Catarina (CRM-SC) é suspeito de continuar trabalhando na Secretaria de Saúde de Gaspar. O anestesista José Alberto Dantas é o atual médico-regulador do município e teve o registro de atividade profissional suspenso por 30 dias, entre 16 de abril e 15 de maio. A sanção do CRM-SC foi publicada no Diário Oficial e no site do conselho no último dia 16.

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Nesse período, Dantas não poderia exercer qualquer atividade profissional relacionada à medicina, segundo o CRM-SC. No entanto, funcionários da policlínica em que ele trabalha autorizando a realização de exames e consultas confirmaram à reportagem, por telefone, na quinta-feira que ele estava dando expediente nos últimos dias. A reportagem esteve na policlínica na quinta-feira. No local, funcionários confirmaram que o profissional trabalha como regulador da policlínica e que esteve em uma reunião no período da manhã do mesmo dia.

– Ele faz poucas horas aqui, acho que 20 horas por semana. Ele é médico regulador nosso, vê qual é a gravidade, que cria a fila. É bem imprevisível o horário dele – afirmou uma das funcionárias da policlínica.

A folha de pagamento de Dantas no município está disponível no Portal da Transparência da prefeitura de Gaspar e informa que o profissional segue em atividade. No documento consta a situação “Trabalhando”. O documento compreende o período de 1º até 30 de abril – a suspensão do CRM-SC começou a valer no dia 16 desse mesmo mês. Na tarde de sexta-feira, a Secretaria de Saúde de Gaspar confirmou à reportagem que ele vinha atuando normalmente.

Médico também atua como diretor técnico de hospital

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José Alberto Dantas trabalha desde 29 de novembro de 2017 como médico-regulador do município de Gaspar. Desde março ele também passou a atuar como diretor técnico do Hospital Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. A reportagem também esteve no hospital e funcionários confirmaram que o médico exerce a função na instituição, além de trabalhos como médico anestesista em procedimentos cirúrgicos. A assessoria do CRM-SC confirmou à reportagem que a suspensão envolve todos os serviços da área médica, incluindo regulação.

A reportagem procurou presencialmente o médico na quinta e na sexta-feira no hospital. No primeiro dia, não o encontrou, mas na manhã desta sexta localizou o médico na unidade hospitalar. Ele afirmou que não estava trabalhando no momento, que retornaria suas atividades somente na próxima terça-feira, dia 15 de maio, último dia da suspensão expedida pelo CRM-SC.

– Eu estou de folga até terça-feira, estou aqui por acaso, mas sempre passo aqui no hospital. Estou de folga, licença até terça-feira, que é o dia que eu volto – afirmou.

À tarde, a reportagem voltou ao local e encontrou novamente Dantas no hospital. Uma recepcionista confirmou que ele estava no centro cirúrgico e que estava “o dia inteiro em cirurgia”.

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– Se vocês puderem aguardar, ele vai anestesiar um paciente e já vem – disse a recepcionista.

Diretoria do CRM-SC diz que vai apurar o caso

No Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (CNES), o médico ainda consta com vínculos ativos em instituições de saúde de Mafra e Rio Negrinho. A suspensão de um mês aplicada pelo CRM-SC ocorreu após o Conselho Federal de Medicina negar um recurso de Dantas e de outro médico. O processo ético-profissional que resultou na punição foi aberto pelo CRM-SC em 2012.

Na publicação, que consta no site da instituição, o conselho informa que a pena ao anestesista ocorre por infração aos artigos 29 e 57 do Código de Ética Médica, que preveem sanções por “Praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência” e por “Deixar de utilizar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento a seu alcance em favor do paciente”. Segundo a assessoria do CRM-SC, os demais dados do processo que resultou na punição são sigilosos. Nesta sexta, à reportagem, o médico afirmou que o processo se refere a um paciente que morreu vítima de uma embolia pulmonar após uma cirurgia feita 12 anos atrás, em um hospital de Balneário Camboriú. Ele também disse que a denúncia seria fruto de uma briga política com um vereador gasparense.

Conforme o presidente do CRM-SC, caso se confirme que o médico estava atuando durante o período de suspensão do registro profissional, ele pode responder a um novo processo administrativo no órgão, com possível notícia do fato ao Ministério Público Federal. Em nota enviada pela assessoria, o presidente do órgão, Nelson Grisard, afirmou que o caso está sendo tratado pela Diretoria e Consultoria Jurídica do CRM-SC. Este ano, três médicos tiveram esse tipo de suspensão emitida pelo órgão.

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CONTRAPONTO

José Alberto Dantas

Questionado pela reportagem, o médico negou que estivesse fazendo atendimentos, apresentou um documento que transfere o cargo de diretor técnico durante o período da suspensão e disse que estava no hospital apenas fazendo “serviços burocráticos”. Indagado sobre que atividades exercia, já que pela suspensão não poderia atender pacientes e nem atuar como diretor, de acordo com o CRM-SC, o médico disse que participa apenas de reuniões no hospital.

Dantas também negou estar comparecendo à policlínica nos últimos dias, disse que a mesa dele estaria vazia, mas admitiu ter feito a liberação de alguns procedimentos na regulação durante o período de suspensão.

– Não tenho feito avaliações, mas posso assinar encaminhamentos para cirurgias, se não para tudo, lá não tem substituto. Bato meu cartão porque não estou impedido do meu emprego. É um trabalho burocrático, não atendo pacientes – alegou.

Secretaria de Saúde de Gaspar

A reportagem também questionou o secretário de Saúde de Gaspar, Carlos Roberto Pereira, sobre o fato de o médico estar supostamente atuando durante o período da suspensão. O secretário confirmou que ele vinha trabalhando e registrando ponto nos últimos dias, mas alegou que o município não teria sido informado da suspensão.

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– Ele estava prestando o serviço dele aqui porque a gente não tinha conhecimento dessas informações. De forma alguma a gente foi comunicado (da suspensão), nem formal nem informalmente. A gente só pode tomar providências depois de ter conhecimento. Acho que pode ser uma falha do CRM (não comunicar o município) ou também do próprio profissional, porque se ele tinha ciência, ele deveria ter nos falado. Vou informar ele disso e afastá-lo das funções até o término da suspensão – afirmou Pereira, em entrevista.

No fim da tarde a prefeitura emitiu uma nota em que comunicou que o secretário de Saúde encaminhou ao prefeito o pedido da exoneração de Dantas do cargo de médico-regulador. Ainda conforme o texto, “o profissional será notificado para prestar os devidos esclarecimentos”.