* Por Marcel Hartmann
Na atual gestão do Ministério da Educação (MEC) do governo Jair Bolsonaro, as nove pessoas mais importantes na definição de políticas educacionais não têm, em sua maioria, experiência nem conhecimento na área de políticas públicas de educação. As informações são do portal GaúchaZH, que analisou os currículos do ministro Abraham Weintraub e de seus oito secretários, obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI).
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Os nomes analisados, além do ministro, são: Antonio Paulo Vogel de Medeiros (secretário executivo), Rodrigo Toledo Cabral Cota (secretário executivo adjunto), Carlos Nadalim (secretário de alfabetização), Jânio Macedo (secretário de Educação Básica), Ariosto Culau (secretário de Educação Profissional e Tecnológica), Ataide Alves (secretário de Regulação e Supervisão da Educação Superior), Arnaldo Barbosa Júnior (secretário de Educação Superior) e Bernardo Goytacazes de Araujo (secretário de Modalidades Especializadas de Educação).
A análise mostra, em números, que eles não têm experiência relacionada aos cargos que ocupam: sete a cada dez empregos são no setor econômico e apenas dois a cada dez são relacionados à educação — o que inclui desde trabalhar como professor de Economia em universidades até dar aulas de Filosofia em escolas.
Quase todas as graduações são em Economia, Direito e Administração. As pós-graduações têm foco em Finanças, Administração e Negócios Internacionais. Eles trabalharam em bancos, corretoras de seguros ou em secretarias e ministérios na área econômica.
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Ministro da Educação, Abraham Weintraub fez carreira em corretoras de seguros, bancos, como professor de Economia na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e, por último, na Casa Civil. Como professor universitário, nunca publicou nada sobre educação, segundo seu Currículo Lattes, plataforma de currículo acadêmico nacionalmente usada por pesquisadores. O último artigo, de 2016, é sobre inflação — pode ser acessado neste link.
Aluno de Olavo de Carvalho, Weintraub é um dos ministros da ala ideológica do governo de Bolsonaro, ao lado do ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
De todos os 108 empregos declarados em currículos pelo alto escalão do MEC, 23 estão relacionados à educação. No entanto, só cinco envolviam diretamente pensar em políticas públicas na área. Todos as cinco experiências profissionais estão no currículo de Ataides Alves, secretário de Regulação e Supervisão da Educação Superior, responsável por aprovar a criação de novas faculdades.
Alves é servidor de carreira no MEC: antes de atuar na gestão Bolsonaro, trabalhou no Conselho Nacional de Educação (CNE), no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) — responsável pelo Enem — e em duas secretarias do MEC na gestão de Fernando Haddad (PT) como ministro. O petista, ao ser eleito para a prefeitura de São Paulo, levou Alves para trabalhar na Secretaria Municipal de Educação de São Paulo.
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Outros cargos de educação são de professor em escolas ou instituições de Ensino Superior nas áreas de Economia e Filosofia.
Forte da educação do alto escalão é em Economia e Negócios
O jornal também analisou os cursos de graduação e pós-graduação do ministro da Educação e de seus secretários. Em primeiro lugar, estão estudos na área de Economia e Negócios, seguidos de Filosofia, Direito e, em quarto lugar, Educação.
Só dois cursos são relacionados à educação. O primeiro é de Ataides Alves, servidor de carreira no MEC que fez uma especialização em educação profissional. O outro curso é do advogado Carlos Nadalim, secretário de Alfabetização que estudou mestrado em Educação na Universidade Estadual de Londrina (UEL), onde pesquisou sobre o ensino de filosofia para jovens — sem relação com políticas educacionais ou alfabetização, sua área de trabalho no MEC.
Antes do cargo em Brasília, Nadalim deu aulas em colégios e pequenas faculdades e era coordenador pedagógico da Escola Mundo Balão Mágico, em Londrina (PR), focada na primeira infância — ele não tem especialização em Pedagogia. Hoje, ele pretende mudar a política nacional de alfabetização no Brasil: a ideia é focar no método fônico e deixar de lado o método global.
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Nomear um ministro com pouca experiência na educação não é exclusividade do governo Jair Bolsonaro. Essa é, inclusive, a tradição no Brasil. No entanto, gestões passadas se cercaram de secretários especialistas em políticas educacionais, afirma Juca Gil, professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
— No Brasil, ministro da Educação é, via de regra, um líder político com capacidade de articulação. Foi o caso de Fernando Haddad (gestão Dilma), Paulo Renato Souza (gestão Fernando Henrique Cardoso) e Mendonça Filho (gestão Temer), A diferença é que eles e outros ministros traziam para o MEC pessoas com experiência em políticas educacionais, sem disputar com escolas e universidades, como esta gestão está fazendo. O MEC atual é anti-academia, o próprio Weintraub não publica nenhum artigo acadêmico há anos — afirma.
O que faziam os ministros da Educação antes de assumir o cargo — dados desde 2005
Pesquisadora na área de políticas públicas educacionais, a professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Márcia Aparecida Jacomini salienta que "é importante ter claro que cada governo forma suas equipes para conduzir as políticas dos ministérios, de acordo com o alinhamento político". Ao escolher nomes alinhados ao Executivo, o presidente pode nomear pessoas não técnicas para um cargo. Feita a ressalva, ela critica a prática:
— A composição de uma equipe sem formação e experiência na área educacional compromete a realização de políticas. De certa forma, a educação tem sido uma área de intensa disputa ideológica, o que tem prejudicado a continuidade de políticas de Estado – afirma.
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