A possibilidade de ter dois catarinenses na final do MasterChef Brasil me seduziu. Eu estava torcendo para que Michele Crispim, a morena de Palhoça, e Valter Herzmann, o ogro de Floripa, se enfrentassem na próxima semana, na decisão. Mas não rolou. A “final de Santa Catarina” aconteceu na semifinal — e mostrou, mais uma vez, o quanto a desatenção pode ser fatal nesse programa.
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Valter era favorito: vinha de sete idas ao mezanino nos três meses de competição — a maior quantidade de vitórias individuais desta temporada, uma a mais que a terceira competidora na semifinal, a carioca Deborah Werneck. Seguro, com “pose de cozinheiro”, como a chef Paola Carosella já havia dito em episódios anteriores, o manezinho da Ilha já parecia ter o passaporte carimbado para a final. Só que a primeira prova da decisão de ontem era o terreno perfeito para Michele: reprodução de prato. Ela tinha se destacado em outros momentos fazendo isso e, embora não tenha sido a melhor (Deborah foi quem venceu a primeira etapa e se classificou), foi menos pior do que Valter, que, disperso, deixou o polvo cozinhar demais e errou ao preparar uma emulsão de hortelã.
Na segunda prova — essa sim, a decisão sobre quem ocuparia a vaga restante na finalíssima —, mais uma reprodução: os dois catarinenses deveriam preparar uma terrine, tradicional prato francês que envolve um complexo modo de execução, apesar de parecer apenas um bolo de carne envolto em massa. Valter, na tentativa de fazer um terrine “querido” (como ele explicou com o sotaque manezinho), escolheu carnes vermelhas — desaprovadas pelos chefs por conta da quantidade de sangue. Michele foi com a carne suína, cuja gordura pode deixar (e deixou) um gosto desagradável, segundo a avaliação da chef Paola. Com os erros, a decisão mesmo ficaria por conta do segundo prato da segunda prova: autoral, que casasse com a terrine, que pudesse ser servido junto com ela.
Michele teve problemas com pratos autorais desde o começo da temporada. Em três ou quatro episódios seguidos, no início da temporada, a moça demonstrou um apego inexplicável à mandioquinha: rolou purê, rolou uma tal de “mandioquinha em três texturas” e até sorvete com o tal ingrediente ela fez. Cada vez que precisava tirar uma receita da cabeça, a moça se atrapalhava. Valter, por sua vez, inventou de tudo — e se deu bem. Embora seu terreno seguro fossem as carnes, até aí ele criou moda. Afinal, molho de romã pra assado de tira não é uma coisa comum. Ao que tudo indicava, se a decisão dependia de um prato autoral, algo saído da cabeça dos competidores e com assinatura própria, a maré ia mais para o lado do manezinho.

Só que o MasterChef, amigo, é uma caixinha de surpresas. Enquanto Michele saiu totalmente da zona de conforto, Valter preferiu ficar no seguro filé ao molho mostarda com batatas rústicas que lhe deu uma vitória no início da competição. Os chefs não gostaram do medo de arriscar, mas gostaram menos ainda do molho, que consideraram estar na textura errada. E a morena apareceu com um ragú de pato envolto em folha de repolho roxo com brunoise de legumes e palha de batata. Ahn? Como assim? Do nada — DO NADA —, Michele surpreendeu nos preparos, deu conta de uma quantidade incomum de processos e conquistou o paladar dos jurados e o direito de subir ao mezanino e se juntar a Débora na decisão.
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No adeus ao programa, Valter admitiu estar disperso. Alegou problemas pessoais — disse que teve a casa roubada e um acidente de carro naquela semana e que a distância de Florianópolis prejudicou sua concentração. É mais uma prova de que o Masterchef é para quem mantém o foco naquela cozinha e consegue se adaptar à pressão: atenta, concentrada e aplicada, Michele cresceu ao longo da competição e mostrou que pode surpreender na hora em que isso era o que contava. De que adiantaria ter sido a melhor em todos os programas anteriores se não conseguisse apresentar o melhor prato nessa etapa?
Assisto o programa desde a primeira temporada. Esta é, portanto, minha quarta vez acompanhando os “maiores cozinheiros amadores do Brasil”. Mas eu também acompanhei os profissionais e as crianças, sem contar os episódios aleatórios de MasterChef Espanha, Austrália, Estados Unidos e outros lugares espalhados pelo mundo. Na maioria das vezes, é fácil perceber quem vai se dar bem e quem vai ficar pelo caminho. A essa altura do campeonato, já deveria dar para dizer com tranquilidade quem vai sair com o troféu debaixo do braço na terça-feira. Dessa vez, a coisa não é bem assim. Se Deborah domina mais processos na cozinha, Michele é mais compenetrada. Se Michele é a “rainha da mandioquinha”, Deborah é a “rainha da farofa”. As duas reeditam a final feminina da primeira temporada e, embora, pela técnica, eu aposte mais na vitória da carioca, com o coração acredito que Michele pode surpreender. É o grande clichê que se aplica: agora, tudo pode acontecer.
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