Relaxado no sofá, Marquinhos cruza as pernas. O joelho direito fica sobre o esquerdo e revela as marcas das seis cirurgias ao longo dos 20 anos dentro de campo. A canela fica quase paralela ao chão. O joelho impôs restrições, como não conseguir dobrá-lo totalmente ou fazer com que ultrapassasse a marca de 400 partidas até o fim deste ano com a camisa do time que ama. Mas o agora ex-jogador não tira o sorriso do rosto ao mirá-lo. Foi com ele, com as pernas e com garra que realizou o sonho de menino: jogar futebol de campo pelo Avaí.
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O ídolo descansa depois de alcançar a última meta da trajetória no esporte profissional, o quarto acesso à elite nacional pelo Leão. Os primeiros dias de aposentado dos gramados tiveram mais compromissos do que quando encorpava o elenco azurra. Marquinhos atendeu aos pedidos de entrevistas para falar do término da carreira, da conquista e do futebol até fazer o que faz todos os anos após a temporada da bola: desligou o telefone e foi para a praia.
Ele vai sentir o que é ser um ex-jogador em 2 de janeiro, quando está programada a apresentação dos atletas para o começo da pré-temporada do Avaí. Até lá, avalia se faz dois jogos pelo Catarinense, na Ressacada (contra Metropolitano e Hercílio Luz), para atingir a marca redonda e receber as homenagens que não ocorreram pela festa do acesso em 24 de novembro, quando a torcida tomou o gramado. Marquinhos também pensa com o que trabalhar. Mas tem claro que será no futebol e no Avaí, como não poderia deixar de ser.

– Ser auxiliar ou treinador não tenho em mente, embora não queira dizer que eu não vou. Não quero ser diretor ou gerente de futebol. Queria ser um cara ao lado do (presidente Francisco) Battistotti, para ser um elo entre vestiário e diretoria. Ele está sozinho, muito exposto, até pelo jeito dele de comandar. Tem coisa que ele não deveria se preocupar, como corte da grama, que está acabando o isotônico ou que um jogador saiu bicudo. Tem que ter alguém para tratar disso em vez dele. Não para ordenar, mas para trocar ideia, que é o que precisa no futebol. Penso em fazer esse intermédio, apaziguar algumas coisas, até para ele não se indispor, não se desgastar – reflete.
Nem poderia ser em outro clube. Não apenas por conhecer as profundezas da Ressacada. Marquinhos é todo Avaí. Um sentimento despertado em 1988. O estádio era quase inacessível de tão longínquo para um menino de sete anos filho de dono bar em Biguaçu. Mas o pai, Luiz, levou o pequeno Marcos na costeirinha, setor existente antigamente embaixo das arquibancadas, colocou o garoto sobre os ombros e com ele vibrou a conquista do Catarinense sobre o Blumenau. O amor cresceu quando já tinha bagagem no futebol.
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Então presidente do Leão, João Nilson Zunino fez valer a vontade do atleta em seguir no clube. Quando já era cobiçado pelo Santos, comprou parte dos diretos econômicos dele em 2008 e garantiu a permanência na Ressacada. Ganhou de vez um torcedor azurra e um amigo. Foi do dirigente que morreu no final de 2014 que pegou o vírus que pintou suas células de azul para sempre.
– Eu fiquei mais apaixonado depois que virei jogador profissional do que antes. Principalmente, a partir de 2008, quando conheci o Zunino. Fui mais torcedor que antes, algo que ultrapassa. Meu pai chegava a pegar no meu pé, dizendo que eu amolecia muito para o Avaí. Eu sento lá e aceito o que oferecem. Nunca peguei luva do Avaí. A única coisa que pedia era um camarote para colocar minha família, nada mais – conta.

Grande momento fora do Avaí
Marquinhos é o rosto que simboliza as conquistas recentes do Avaí – e a torcida tem até máscara com seu rosto. No entanto, por mais que a camisa azurra pareça ter sido confeccionada para ele, M10 vestiu outras. Do Bayer Leverkusen, em 2000, até a do Grêmio, em 2012, foram 10 vestes diferentes da azul e branca. Com elas viveu de tudo, das lesões às glórias. Teve um privilégio raro, reservado a pouquíssimos jogadores.
Em 2010, ele defendia o Santos que tinha Robinho, de volta ao futebol brasileiro, e com o trio Neymar, Ganso e André, então crias do clube, despontando. Porém, a lesão grave do meio-campista que passou pelo São Paulo e Sevilla-ESP, fez com que Marquinhos recebesse a camisa 10 do Peixe e calhou de estar com ela em uma ocasião especial.
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– Joguei na Vila Belmiro com a camisa 10 e braçadeira de capitão. Tem a história do futebol, não minha. Fiquei contente de ter usado a 10 do Santos no dia do aniversário de 70 anos do Pelé. Acredito que de 10 ou 20 anos para cá foi o melhor time do Brasil, de todo mundo gostar de assistir – relembra.

Alegria dentro e fora de campo
Era também um time alegre como Marquinhos. Característica que vai além da vida profissional de jogador, está presente no dia a dia. Para ele, atributo indispensável no esporte. No futebol desde criança, jogando em times de futsal e até por um breve período – pequeno – no clube arquirrival, o futebol continua depois da aposentadoria dos gramados. Não falta convite para mostrar a irreverência e a técnica que fez a camisa 10 do Avaí ser dele.
– Eu tenho que jogar pelada. Meu pai tem um time, o Benfica. O Mesquita (ex-técnico da base do Avaí e grande amigo) tem o Time das Estrelas. Nestes já estou com pré-contrato. E o Cacau (Menezes, colunista da NSC) disse que tenho vaga no time dele de forma vitalícia, mas ele não fez proposta ainda (risos) – brinca o Galego.
A bola para de rolar para Marquinhos, mas a resenha não.
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