*Artigo por Mário Sant’Ana
Terceiro texto da série “A evolução da democracia”. Leia aqui o primeiro artigo e aqui o segundo.
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Terminei o artigo anterior desta série comentando como os estados modernos adotam o modelo de três poderes (executivo, legislativo e judiciário) com mecanismos de freios e contrapesos, para que cada poder se salvaguarde dos demais e, juntos, evitem seus próprios excessos.
A ideia é boa… até certo ponto
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E o ponto é quando a nação, em vez de combinar seus esforços em favor de um projeto nobre, é fraturada pela disputa entre núcleos de poder.
A rivalidade partidária típica das repúblicas saudáveis é bem-vinda. Em vários países, as oposições instituem o que chamam de gabinete paralelo que, chefiado pelo líder da oposição, reúne políticos e especialistas para oferecer críticas (preferencialmente construtivas) ao governo e propor políticas alternativas. Coexistem, por exemplo, o Ministério da Saúde (oficial) e o “Ministério da Saúde Paralelo”. É uma forma de a oposição dizer para a população: “Isso é o que faríamos se estivéssemos no governo.”
Estamos longe disso.
No Brasil, nas relações interpartidárias, inimizades viscerais podem facilmente dar lugar a alianças espúrias alimentadas por um pragmatismo fisiológico assombroso. A julgar pelo calibre moral que permite e fomenta tais conchavos, devemos estar muito atentos à qualidade da legislação aprovada e das decisões dos executivos.
Nos últimos anos, a maior visibilidade das interações entre os integrantes dos Poderes da República tem abalado a confiança de muitos nas instituições. Esquemas como o mensalão, a repartição dos cargos em órgãos públicos e em empresas estatais para atender a interesses nada legítimos, e a forma como são negociadas as emendas parlamentares neutralizam a capacidade de vigilância mútua entre poderes, prejudicam o País e decepcionam o cidadão.
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Nos últimos meses, membros do Congresso e do STF afirmaram repetidas vezes que o Presidente da República era responsável por genocídio. Ora não se fala aqui de pedalada fiscal nem de um Fiat Elba mal havido, mas de um dos mais covardes e hediondos crimes contra a humanidade.
Se de fato houve genocídio, os acusados deveriam ser presos preventivamente ou pelo menos depostos de seus cargos, para serem formalmente investigados e processados. Se o crime não existiu, então os que fizeram as acusações falsas deveriam responder por isso, ou minimamente se retratarem publicamente.
Nada disso aconteceu. Os mecanismos de freios e contrapesos não foram capazes de lidar com a gravíssima acusação de um genocídio em território nacional, mesmo quando a denúncia foi feita sob a unção da toga de um tribunal superior. Acusados e acusadores seguem a vida, como se nada tivesse acontecido.
Em muitos países, cresce o número de pessoas que manifestam sua insatisfação com práticas desse tipo e as redes sociais têm dado voz a multidões, despertado o interesse por causas da sociedade e desempenhado um papel importante em movimentos sociais.
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Um deles, conhecido como Primavera Árabe, espalhou protestos populares pelo Oriente Médio e Norte da África, causando mudanças importantes em vários países, chegando a pôr fim a governos e a derrubar regimes instalados havia décadas.
No Brasil, a série de mobilizações populares que ficaram conhecidas como as Jornadas de Junho de 2013 é considerada o primeiro levante popular de proporções realmente nacionais no País, tendo acontecido em todas as regiões, em mais de 500 cidades e conquistado até 89% de apoio da população brasileira.
Desde então, a Internet tem conectado indivíduos com dores e ideologias afins, popularizado o debate político, disseminado informações em volumes sem precedentes e deixado Suas Excelências mais próximas dos cidadãos comuns.
A ideia é boa… até certo ponto
(Continua)

*Mário Sant’Ana é tradudor e intérprete, cofundador do Projeto Resgate, organização com ações para reduzir contrastes sociais, e co-idealizador do programa Think Tank Projeto Resgate, para o desenvolvimento de habilidades de inovação intersetorial, soft skills e liderança não hierárquica. Escreve artigos para o A Notícia às terças-feiras. Contato: mario@projetoresgate.org.br
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